Um dos pilares mais sensíveis da democracia e do Estado de Direito é a autenticidade dos atos jurídicos. Quando um documento público ou particular é contestado por suspeita de falsificação, toda a estrutura de validade que dele se origina começa a ruir. Foi exatamente isso que ocorreu com o acordo que garantiu a permanência de Ednaldo Rodrigues à frente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
A assinatura em questão pertence ao ex-presidente Coronel Nunes. Ou melhor, supostamente pertence. Laudo pericial recente afirma, com base técnica, que ela não condiz com o punho do signatário. Mais do que isso: resgata-se um laudo médico de 2023, assinado por um dos próprios diretores da CBF, que atestava a incapacidade cognitiva de Nunes para consentir validamente qualquer negócio jurídico.
É nesse cenário que o conceito de simulação, previsto no artigo 167 do Código Civil, ganha protagonismo. Um negócio jurídico simulado — ou seja, que apenas aparenta ter sido celebrado com vontade real — é nulo. Não por vontade das partes, mas por uma lógica maior: a proteção da confiança pública e da verdade formal. E é aí que reside o coração do problema.
Se o documento que fundamenta a decisão do Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer a validade da eleição de Ednaldo, estiver viciado por falsidade material ou incapacidade do signatário, a sua nulidade absoluta poderá ser declarada até mesmo de ofício. É o que diz o parágrafo único do artigo 168 do Código Civil. O Judiciário não pode ser refém de atos montados artificialmente para induzi-lo ao erro.
Alguns dirão que se trata de mera disputa de poder. Mas não se trata disso. Trata-se de preservar a integridade das instituições esportivas e a própria ideia de Justiça.
Quando se aponta, com respaldo técnico e jurídico, que um dirigente se valeu de uma assinatura possivelmente falsificada ou obtida sem consentimento válido, a consequência não pode ser o silêncio. A revisão judicial do acordo é medida que se impõe. O afastamento cautelar do presidente pode ser necessário não apenas para apurar os fatos, mas para proteger a credibilidade da entidade.
A CBF não é uma república autônoma. Embora privada, sua atuação tem efeitos públicos imensos. Representa o Brasil no futebol mundial, gere bilhões de reais e influencia gerações. Não pode, sob qualquer pretexto, relativizar a legalidade ou a verdade dos atos que pratica.
Se for verdadeira a acusação de simulação, a sociedade brasileira terá o direito de exigir não apenas o afastamento de Ednaldo Rodrigues, mas também uma profunda reforma institucional na governança do futebol nacional.
Porque, no fim das contas, o que está em jogo não é apenas uma assinatura. É a confiança de um país inteiro em quem diz representá-lo.
Crédito imagem: CBF/Divulgação
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