Ednaldo Rodrigues enfrenta um momento de incerteza à frente da presidência da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), agendou para 28 de maio a retomada do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7580, na qual a Corte avalia a legitimidade do Ministério Público para firmar Termos de Ajuste de Conduta (TACs) com entidades esportivas.
Em uma decisão liminar no processo, o ministro Gilmar Mendes suspendeu decisões judiciais segundo as quais o MP não poderia intervir em questões relacionadas a entidades desportivas. Na mesma decisão, de janeiro de 2024, o relator determinou a recondução de Ednaldo Rodrigues ao cargo máximo da CBF. Agora, o STF decidirá se referenda ou não essa liminar.
Após diversos adiamentos, a ADI 7580 começou a ser analisada em outubro do ano passado, mas o ministro Flávio Dino pediu vista — mais tempo para analisar o processo. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes propôs que a análise do referendo seja convertida em julgamento de mérito e reiterou seu entendimento exposto na liminar.
Para o relator, não cabe ao Estado interferir em questões internas das entidades esportivas, com exceção dos casos em que normas e práticas internas violarem a Constituição e a legislação, por exemplo.
Em relação ao afastamento de Ednaldo Rodrigues da CBF, o ministro ressaltou que a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) de designar um interventor não decorreu da atuação do MP-RJ, que apenas buscou resolver a questão por meio de negociação construída em conjunto com a própria entidade.
Para o decano, a suposta ilegitimidade do MP invocada pela Justiça do RJ, a pretexto de preservar a autonomia da entidade desportiva, “se prestou a legitimar intervenção externa ainda mais gravosa e intensa na atividade da CBF”.
Acordo homologado pelo STF é colocado em xeque
Em fevereiro deste ano, o ministro Gilmar Mendes homologou o acordo firmado entre a CBF, cinco dirigentes da entidade – Rogério Caboclo, e pelos vices da entidade Antônio Carlos Nunes, Fernando Sarney, Gustavo Feijó e Castellar Guimarães Neto – e a Federação Mineira de Futebol (FMF).
Segundo os termos do acordo, as partes reconhecem a legalidade da Assembleia Geral Extraordinária e da Assembleia Geral Eleitoral da CBF que elegeram Ednaldo Rodrigues para a presidência da confederação em março de 2022. As partes também se comprometem a encerrar disputas judiciais sobre as assembleias.
A homologação feita pelo ministro Gilmar Mendes seguiu manifestações favoráveis da Procuradoria-Geral da República (PGR), da Advocacia-Geral da União (AGU), e do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), autor da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7580, de relatoria do decano, além do consentimento expresso do MP-RJ.
Contudo, o acordo homologado está passando por questionamentos. De acordo com o ‘Estadão’, uma perícia indicou que uma das assinaturas contidas no documento seria falsa.
A análise da perícia é sobre a assinatura de Antônio Carlos Nunes de Lima, conhecido como coronel Nunes, ex-vice-presidente da CBF e que foi presidente interino da entidade em duas ocasiões. A inspeção foi feita pela perita documentoscopia Jacqueline Tirotti, a pedido do vereador do Rio de Janeiro Marcos Dias (Podemos).
“(…) as assinaturas questionadas divergem do punho periciado de Antônio Carlos Nunes de Lima em características personalíssimas e imperceptíveis. Portanto, conclui pela impossibilidade de veiculação do punho referente a Antônio Carlos Nunes de Lima em relação às assinaturas que lhe competem contidas nos objetos desta perícia. Bem como, concluindo pela fragilidade do documento questionado, em razão da ausência de rubricas e fixação de folhas, facilitando a troca de folhas com a alteração do seu conteúdo”, diz o laudo da perita.
Após a conclusão da perícia, o vereador acionou o Ministério Público do Rio de Janeiro. “Os fatos que agora são trazidos ao conhecimento deste MPRJ configuram elementos graves que justificam a pronta atuação deste ‘Parquet’ para que adote as medidas necessárias para apurar a regularidade da referida assinatura e, consequentemente, do acordo firmado”, solicitou Marcos Dias.
Nesta terça-feira (5), uma petição assinada pela deputada federal Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ) e juntada na ADI 7580, que analisava o caso no STF, solicitou que fosse “determinado o afastamento imediato do Sr. Ednaldo Rodrigues do cargo de Presidente da CBF, tendo em vista as evidências suficientes que apontam a ocorrência de simulação no âmbito do referido acordo e as graves denúncias de gestão temerária no âmbito da mais alta entidade do desporto nacional”.
A deputada federal fez o requerimento baseada naquilo que chamou de “fatos graves pertinentes ao acordo homologado nestes autos”.
Importante deixar claro que a homologação do acordo não prejudica a continuidade do julgamento de mérito da ADI 7580, interrompido pelo pedido de vista do ministro Flávio Dino. A ação questiona a constitucionalidade de dispositivos da Lei Pelé (Lei 9.615/1998) e da Lei Geral do Esporte (Lei 14.597/2023).
Diante dos novos fatos, o Lei em Campo conversou com os advogados Carlos Henrique Ramos e Ana Mizutori, especialistas em direito desportivo, para tentar esclarecer o cenário e o que pode acontecer futuramente.
Ednaldo Rodrigues pode ser retirado do cargo no julgamento do dia 28? Caso isso aconteça, como fica o comando da CBF?
“Sim! Ednaldo Rodrigues pode ser destituído do cargo em caso de derrubada da liminar, o que dependeria do teor da decisão de mérito a ser proferida pelo Pleno do STF. Não podemos esquecer que pedidos de vista podem gerar adiamentos. Em caso de afastamento, a tendência seria nomear um interventor até novas eleições, sempre com o risco de a FIFA punir a CBF por conta de interferência estatal e ferimento à autonomia”, afirma Carlos Henrique Ramos.
“Sim. Caso o STF reconheça que houve vício de legalidade ou inconstitucionalidade no acordo que resultou na posse de Ednaldo Rodrigues, é juridicamente possível que sua permanência no cargo seja invalidada. A decisão poderá declarar nulo o termo de compromisso celebrado entre a CBF, o MP e a Justiça do Rio de Janeiro, restabelecendo os efeitos da decisão que anteriormente afastou a antiga gestão e nomeou interventores”, diz Ana Mizutori.
Julgamento da ADI 7580 pode mudar o futuro do futebol brasileiro?
“Em tese poderia, mas não devemos ter novidades. A tendência é que os ministros do STF reafirmem a autonomia das entidades desportivas e ratifiquem a legitimidade do MP para celebrar TACs com as referidas entidades, já que o ambiente esportivo é privado, mas envolve interesse público”, entende Carlos Henrique Ramos.
“Pode porque a ADI 7580 discute diretamente os limites da autonomia das entidades esportivas frente à interferência de agentes estatais, como o Ministério Público. A depender do posicionamento do STF, pode-se criar um precedente que afete a estabilidade institucional da CBF e de outras entidades, abrindo margem para novas judicializações e questionamentos sobre a legitimidade de seus dirigentes. Além disso, a decisão poderá sinalizar à FIFA se há ou não violação ao princípio da não interferência estatal, com potenciais reflexos internacionais”, explica Ana Mizutori.
Se STF homologou acordo, caso pode ser analisado pelo Pleno?
“Me parece que sim, pois o acordo extinguiu as ações pendentes questionando o TAC celebrado entre o MP e a CBF, e não a ADI em si”, explica Carlos Henrique Ramos.
“Sim. A homologação de um acordo pelo Judiciário não impede que o Plenário do STF reexamine seus efeitos se houver elementos que indiquem ofensa à Constituição ou vícios formais no procedimento. No caso da ADI 7580, o que se discute é justamente se houve desvio de finalidade ou vício de consentimento no acordo que encerrou a intervenção na CBF e permitiu nova eleição. Isso confere legitimidade à análise de mérito pelo Pleno”, afirma Ana Mizutori.
A petição alegando incapacidade do Coronel Nunes e falsidade da assinatura pode ser usada pra anular o termo que garantiu posse de Ednaldo Rodrigues?
“Em tese sim, pois com a alegação de vício de consentimento de um daqueles que subscreveram o acordo, isto poderia levar à invalidação do mesmo. Mas tudo dependerá da comprovação efetiva da referida fraude”, pondera Carlos Henrique Ramos.
“Se for comprovado que a assinatura do então vice-presidente Cel Nunes foi falsificada, ou que ele não detinha poderes para firmar o acordo em nome da CBF, o vício de consentimento compromete a validade do Termo como negócio jurídico. Nesses casos, a anulação pode ser reconhecida judicialmente, com efeitos retroativos, o que colocaria em xeque toda a cadeia de legitimidade que levou Ednaldo à presidência. Então, se comprovadas a falsidade da assinatura ou a incapacidade jurídica de representação, há fundamento para anular o Termo de Acordo, pois estaria eivado de vício insanável de consentimento”, avalia Ana Mizutori.
CBF se manifesta
“A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) reitera seu compromisso com a transparência, a legalidade e a boa-fé em todas as suas ações e decisões institucionais.
Diante das recentes notícias veiculadas na imprensa sobre suposto vício de vontade em assinatura constante do acordo homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que reconheceu a legitimidade da eleição do presidente Ednaldo Rodrigues, a CBF esclarece que ainda não teve acesso formal ao referido laudo pericial, supostamente assinado por perito particular, que está sendo utilizado de forma midiática e precipitada, em verdadeira espetacularização que atende a interesses nada republicanos e aparentemente questionado por terceiros absolutamente estranhos ao processo.
A CBF enfatiza que todos os atos relacionados ao acordo mencionado foram conduzidos dentro da legalidade e com a participação de representantes devidamente legitimados. O processo foi legítimo e teve acordo homologado.
É absolutamente inverdade que esse processo tenha sido reaberto a pedido de uma parlamentar.
A CBF confia plenamente na Justiça brasileira e permanece à disposição das autoridades competentes para esclarecer quaisquer dúvidas que eventualmente surjam. A entidade segue focada em sua missão de promover o futebol brasileiro com seriedade, profissionalismo e respeito às instituições e com absoluta tranquilidade de que todos os princípios de boa gestão e de probidade são diuturnamente respeitados”
Crédito imagem: Lucas Figueiredo/CBF
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