No próximo dia 28, o Supremo Tribunal Federal (STF) dará continuidade ao julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7580, em que avalia a legitimidade do Ministério Público para firmar Termos de Ajuste de Conduta (TACs) com entidades esportivas.
Em uma decisão liminar no processo, o ministro relator Gilmar Mendes suspendeu decisões judiciais segundo as quais o MP não poderia intervir em questões relacionadas a entidades desportivas. Na mesma decisão, de janeiro de 2024, o decano determinou a recondução de Ednaldo Rodrigues ao cargo máximo da CBF. Agora, a Corte decidirá se referenda ou não essa liminar.
Um eventual afastamento de Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF poderia trazer consequências diretas para o futebol brasileiro, como por exemplo, a exclusão da Copa do Mundo de 2026 e outras competições organizadas pela FIFA. Isso porque a entidade proíbe expressamente qualquer interferência da Justiça Comum na administração das confederações.
“Existe a possibilidade sim (de punição), caso o STF determine o afastamento do atual presidente (Ednaldo Rodrigues). A FIFA governa um sistema associativo privado e insere em seus regulamentos a ameaça de desfiliação das federações vinculadas em caso de interferência da justiça estatal em questões internas, o que comprometeria sua autonomia. Com a CBF desfiliada, o Brasil ficaria impedido de participar de competições da FIFA. Aliás, foi exatamente esse risco que motivou a concessão, por parte da Corte, da liminar mantendo o dirigente no cargo”, afirma o advogado especialista em direito desportivo Carlos Henrique Ramos.
“O afastamento de Ednaldo Rodrigues por decisão judicial levanta, sim, uma bandeira amarela. A FIFA repudia qualquer interferência da Justiça Comum sobre as entidades do futebol — o que já gerou suspensões em países como Nigéria, Paquistão e até em federações sul-americanas. Mas para que o Brasil seja de fato suspenso ou sofra alguma sanção, seria necessário que essa interferência impedisse o funcionamento regular da CBF ou fosse vista como uma violação da sua autonomia estatutária. Por enquanto, isso ainda não se configurou de forma direta. Mas o risco cresce se houver nomeações externas ou intervenção sobre o colégio eleitoral da entidade”, avalia o advogado desportivo Gustavo Lopes.
Segundo o advogado, a situação é delicada e expõe um paradoxo: como exigir lisura na governança do futebol sem recorrer ao Judiciário, quando a própria entidade não garante mecanismos internos eficazes de controle?
“A FIFA condena interferências estatais, mas também se fecha para debates democráticos. Afastar Ednaldo Rodrigues por questões legítimas — se assim for provado — não é ingerência, é Justiça. O problema não é o Brasil respeitar a lei; o problema é se a CBF e a FIFA acharem que estão acima dela. Só haverá risco real de punição se o Judiciário cruzar a linha e tentar administrar o futebol, o que ainda não ocorreu. Mas é um fio muito tênue”, analisa Gustavo Lopes.
O que diz a FIFA em seu estatuto
A FIFA proíbe expressamente qualquer interferência governamental nas federações nacionais de futebol, conforme os artigos 14 e 19 de seu Estatuto. Essas normas exigem que as federações administrem seus assuntos com independência, protegendo suas eleições e estatutos de influências externas. Quando isso é violado, a FIFA pode aplicar sanções como a suspensão imediata da federação, impedindo a participação em torneios internacionais e o acesso a financiamentos.
A FIFA também pode nomear um Comitê de Normalização para gerir provisoriamente a entidade, revisar estatutos e organizar novas eleições, ou aplicar sanções parciais como exclusão de competições. Tais punições têm respaldo legal e visam preservar a integridade do sistema associativo global.
Segundo o estatuto da FIFA, a Corte Arbitral do Esporte (CAS) é a única entidade reconhecida para a resolução de conflitos envolvendo clubes e associações esportivas. A Justiça Comum só pode ser acionada após esgotadas todas as instâncias esportivas, e ainda assim em casos específicos.
Essa não é a primeira vez que o futebol brasileiro se encontra ‘ameaçado’ por uma punição da FIFA. No fim de 2023, a entidade máxima do futebol enviou um comunicado à CBF alertando sobre artigos do seu estatuto, entre eles, o que proíbe suas federações membros de sofrerem interferência de terceiros na resolução de conflitos internos.
O ofício da FIFA foi enviado às vésperas do julgamento da Justiça do Rio de Janeiro de uma ação liderada pelos ex-presidentes Marco Polo Del Nero e Ricardo Teixeira que questionavam a legalidade do TAC celebrado entre a entidade e o MP-RJ que alterou as regras eleitorais da confederação. Após essa alteração, houve a eleição em que Ednaldo Rodrigues foi escolhido presidente.
Relembre casos recentes de punições da FIFA em confederações nacionais
Federação do Chade (África)
Em 2021, os chadianos foram suspensos após interferência governamental na federação de futebol. O governo do país retirou os poderes da associação de futebol local e criou um comitê nacional para comandar a pasta, o que contraria o regulamento da FIFA. Na época, o governo de Chade alegou falhas na comunicação e preocupação sobre a forma com que a entidade é comandada.
Em março do mesmo ano, a Confederação Africana de Futebol excluiu Chade da Copa Africana de Nações por conta da interferência.
Federação do Paquistão (Ásia)
No caso do Paquistão o problema foi ainda mais grave. A federação do país vivia uma disputa de dois grupos políticos. Em setembro de 2019, a FIFA havia criado um comitê de normalização para controlar a situação e coordenar eleições na entidade.
Porém, em março de 2021, o grupo do candidato Syed Ashfaq Hussain Shah invadiu a sede da federação, em Lahore, alegando vitória nas eleições e tomou os poderes do presidente do comitê, Haroon Malik.
A FIFA chegou a dar um prazo para que o grupo deixasse o comando da entidade, mas a determinação foi ignorada e a federação acabou sendo punida. Na época, a entidade máxima do futebol afirmou que a suspensão só será retirada se o comitê de normalização informar a retomada completa das “premissas, contas, administração e canais de comunicação” da federação.
Crédito imagem: CBF/Divulgação
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