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A história de quando um artigo de direitos humanos resolveu um conflito do futebol de países em guerra

Esporte de direitos humanos andam juntos. Entendendo isso, cada vez mais o Tribunal Arbitral do Esporte tem usado a Convenção Europeia de Direitos Humanos para resolver litígios privados do esporte. Foi o que aconteceu na briga política/jurídica entre Kosovo e Sérvia.

Em maio de 2016, a UEFA aceitou o pedido da Federação de Kosovo para fazer parte da UEFA. Insatisfeita, a Federação de Futebol da Sérvia decidiu contestar a decisão, alegando que vários clubes membros teriam que ingressar na recém criada Federação de Kosovo contra vontade em função dessa decisão.

Na base do protesto, ela invocou a liberdade de associação, protegida no artigo 11 da Convenção Europeia de Direitos Humanos.

Uma briga jurídica, num tribunal esportivo tendo como pano de fundo uma grande disputa política.

O Kosovo, de maioria étnica albanesa, declarou a sua independência de forma unilateral da Sérvia em 2008 e já foi reconhecido como um país independente por cerca de metade dos países membros da ONU, entre os quais Portugal, Estados Unidos, Alemanha, França, Inglaterra e Japão.

Além da Sérvia, outros países como a Rússia, China, Espanha, Brasil, Angola e Moçambique, não reconhecem o Kosovo como país e sim como uma província separatista da Sérvia.

Antes da questão sobre a liberdade de associação, era preciso decidir se Kosovo poderia ter uma Federação reconhecida pela cadeia associativa do futebol.

Segundo o estatuto, a UEFA está aberta às associações de futebol situadas no continente europeu, com sede em país reconhecido pelas Nações Unidas como um estado independente.

Considerando que a ONU não faz reconhecimento de países, o painel do TAS interpretou outro artigo do estatuto da UEFA que diz que o território deve ser reconhecido pela maioria dos membros da ONU como um “estado independente”.

O TAS entendeu que este pré-requisito foi cumprido no que diz respeito à Federação de Futebol do Kosovo e que essa conclusão estava em linha com a vontade expressa pela maioria das federações membros no congresso da UEFA para aceitar este novo membro da UEFA.

O TAS, então, passou a analisar a questão da liberdade associativa (1). O painel reconheceu que o recorrente “pode valer-se do princípio da liberdade de associação, um princípio que está bem consagrado na lei suíça, bem como no art. 11 CEDH”. No entanto, também sustentou que “tal direito não é absoluto”. Em particular, disse que a Federação Sérvia “submeteu-se às regras e regulamentos da UEFA ao candidatar-se e obter a adesão à UEFA”

Depois de ponderações, o painel acabou por concluir que “não ocorreu nenhuma violação da liberdade de associação” da Federação Sérvia, uma vez que “o Recorrente não tem o direito protegido de que o estatuto na UEFA permaneça inalterado” . Assim, para o painel, se o estatuto do recorrente “for afetado por uma resolução do Congresso da UEFA tomada em conformidade com as regras e regulamentos da UEFA, é difícil ver como tal resolução pode – ilicitamente – interferir na liberdade de associação do Recorrente”

Mesmo sendo ainda um caso dos poucos exemplos em que o TAS analisou a decisão de um órgão privado do esporte com base em um direito protegido pela CEDH, já mostra como o esporte cada vez mais passou a entender que para proteger a própria autonomia não pode se afastar de compromissos universais do direito.

Crédito imagem: Getty Images

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1 Caso em CAS 2016/A/4602 Football Association of Serbia v. Union des Associations Européennes de Football (UEFA), award of 24 January 2017, para. 38.

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