Consta das notícias de ontem, dia 27 de outubro de 2024, que uma Magistrada de primeira instância da Justiça do Trabalho de Minas Gerais teria decidido a favor da inscrição de atleta menor entre 12 e 14 anos de idade no sistema federativo da Confederação Brasileira de Futebol filiado ao Clube Atlético Mineiro. De imediato surge um alvoroço no mundo trabalhista a respeito do tema, não por acaso já que se envolve a proteção laboral de menores desportistas.[1]
Concessa maxima venia, o veredito da referida Magistrada Laboral, assim como a insistência do Ministério Público do Trabalho local (MPTMG) em barrar inscrição desportiva e a formação do contrato de formação desportiva em nada influencia na vedação a qualquer trabalho, ofício ou profissão aos menores de 16 anos, salvo na condição de menor aprendiz a partir dos 14 anos de idade, resguardados nos arts. 7o, XXXIII, 227, § 3o, I, da CF/88.
A questão duvidosa maior de constitucionalidade sempre se instaurou mesmo sobre a natureza do contrato de formação desportiva, uma vez que em suas previsões do art. 29, § 4o, da Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé), basicamente reproduziada no art. 99, § 3o, da Lei n. 14.597/23 (Lei Geral do Esporte-LGE) sempre se excluiu o vínculo empregatício, restando dúvidas se seria condição vital para a sua existência esta vinculação de emprego, tal qual se encontra normatizada para os contratos de aprendizagem no art. 428 da CLT.
Acerca do assunto, manifestou-se pela sua natureza especial e a sua validade constitucional, desde que cumprido todo o sistema de proteção laboral de menores, assentado tanto nas referidas Leis Especiais do Desporto quanto nas demais normas gerais de trabalho de menores.[2]
Em primeiro plano, segundo o já defendido há anos por este autor, embora esta decisão da magistrada trabalhista não impacte de maneira substancial na vedação de trabalho de menores no desporto, ela não poderia se furtar a um veredito preciso, pois tais figuras desportivas, in casu a inscrição desportiva é conexa ao labor no desporto, ainda mais de menores. Nesses termos, pela convicção da unidade de jurisdição, a competência para apreciar tais questões deve ser mesmo da Justiça do Trabalho, do mesmo modo esta Justiça Especializada deve ser a competente materialmente para julgar os conflitos exsurgentes do contrato de formação desportiva, do direito de arena e de imagem associados ao contrato especial de trabalho esportivo.
A senteça judicial em pauta referencia novas previsões do art. 5o, § 1o a § 3o, da LGE ao estabelecer a possibilidade de vinculo meramente esportivo de menores de 12 anos com as respectivas organizações (clubes, sociedades anônimas do futebol) para participarem em competições de categorias de bases. Com essas disposições coligadas aos arts. 99 a 102 da mesma Lei resta limpidamente esclarecida a continuidade de vedação ao contrato de formação desportiva, somente possível a partir dos 14 anos.
Nada obstante, descreve-se expressamente na sentença as restrições impostas pela própria LGE sobre a permissão de tal vínculo esportivo do atleta de 12 anos para alinhar em competições de base, tais como: sob expressa autorização dos pais ou maiores responsáveis, proibição de morar nas sedes de clubes e em domicílios diversos aos de familiares, além de todas as obrigações legais de proteção contidas entre os expressados arts. 99 a 102, obviamente aplicados também aos atletas menores de 14 anos, portanto, sem contrato de formação desportiva. Em breve leitura deste microssistema (Lei Pelé + LGE), verifica-se que as normas de proteção de menores no desporto e as condições estruturais de existência da contratação de aprendizagem desportiva são bem protetivas e adequadas.
A convalidação da inscrição desportiva de atletas a partir de 12 anos para competições de base jamais significa autorização para constituição de contrato de formação desportiva, tampouco de celebração do contrato especial de trabalho esportivo, apenas serve de fixação oraganizacional entre as estruturas de formação dos clubes, corroborando para afastar a concorrência desleal. Na dimensão econômica, viabiliza os futuros pedidos de participação financeira nos mecanismos de solidariedade pelos clubes (sociedades anônimas desportivas) formadoras, em harmonia com as normas federativas da CBF/FIFA (suporte no art. 29-A da Lei Pelé e art. 102 da LGE).
Uma demarcação judiciária de consentimento de inscrição desportiva para fins de competições em categorias de base reforça a permanência constitucional e vedatória do trabalho no desporto a qualquer menor abaixo dos 16 anos, o prosseguimento de proibição na contração de formação desportiva para menores de 14 anos e quaisquer características de labor na vinculação meramente desportiva entre os 12 e 14 anos de idade, questões que devem sempre provocar vigilância do Auditor Fiscal do Trabalho, Ministério Públido do Trabalho e demais instituições públicas de proteção dos menores, ao prestígio do conhecido princípio da proteção integral descrito na r. Sentença de primeiro grau.
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[1] BATISTELLA, Paulo. Adolescente de 12 anos pode ter vínculo esportivo com clube de futebol, diz juíza. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2024-out-27/adolescente-de-12-anos-pode-ter-vinculo-esportivo-com-clube-de-futebol-diz-juiza/>. Acesso em: 28 out. 2024.
[2] Recomenda-se a leitura do capítulo específico sobre o contrato de formação desportiva em RAMOS, Rafael Teixeira. Curso de direito do trabalho desportivo: as relações especiais de trabalho do esporte. São Paulo: Juspodivm, 2022.