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Banimento do esporte? O caso da ginástica

No último final de semana, um julgamento movimentou toda a comunidade jusdesportiva nacional. Fernando de Carvalho Lopes, ex-técnico da seleção brasileira masculina de ginástica artística, foi julgado pelo STJD da modalidade. A denúncia se deu em razão de relatos de abusos sexuais que colocavam o treinador como agressor. Em razão da natureza do caso, o processo correu em sigilo, sem que pessoas que não fossem partes no processo tivessem acesso aos autos. Em respeito a esse sigilo, não trataremos aqui de informações que não sejam públicas, ainda que sejam de nosso conhecimento, mantendo a análise no plano teórico e técnico.

Após ser punido pela Comissão Disciplinar, em novembro do último ano, com a pena de suspensão por 1.440 dias, acrescida de multa de R$ 300 mil, tanto atleta como Procuradoria recorreram da decisão, levando o julgamento para o Pleno. Em primeira instância, os auditores reconheceram infrações a cinco artigos do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), aplicando as penas previstas nesse código.

Quando do julgamento do recurso, no entanto, o auditor relator, William Figueiredo, atendeu o que postulado pela Procuradoria e aplicou também o Código de Conduta e os Estatutos da Federação Internacional de Ginástica. A aplicação dos regramentos internacionais é possível em razão do que dispõe o parágrafo primeiro do artigo 1º da Lei 9.615/98, conhecida como Lei Pelé. O texto traz que “a prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto” (grifo nosso).

As penas previstas pelas normas internacionais do desporto preveem penas diferentes daquelas apresentadas pelo CBJD. Dessa forma, ainda que tenham sido analisados os mesmos fatos, as penas aplicadas foram sensivelmente diferentes.

O Pleno do STJD decidiu, por unanimidade e acompanhando o voto do relator, eliminar o treinador de todas as atividades vinculadas à Federação Internacional de Ginástica, desvinculando-o da estrutura associativa, pena bastante superior àquela aplicada pela Comissão Disciplinar, que permitiria o retorno do treinador às atividades em aproximadamente quatro anos. As multas aplicadas também foram majoradas, passando de R$ 300 mil para R$ 1,6 milhão.

Destaca-se que a pena de eliminação impede apenas que o técnico atue na estrutura da FIG, não podendo se confundir com a pena de banimento, prevista, por exemplo, pelo Código Mundial Antidopagem. A competência dos STJDs se restringe à esfera da modalidade a que se refere. Isso implica que, em tese, o treinador poderá continuar atuando em outras modalidades, ou mesmo como treinador de ginástica, desde que não em instituições vinculadas à FIG.

A pena de eliminação, diferentemente da pena de banimento, não tem qualquer restrição legal, nem no Brasil, nem na Europa. Trata-se apenas da desvinculação da pessoa dos quadros de filiados de uma entidade privada, após o devido processo e garantida a ampla defesa. Dessa forma, a eliminação não pode ser considerada uma pena de caráter perpétuo, vedada por nossa legislação, mas sim uma ruptura de relacionamento associativo, garantida por nossa legislação.

Também é importante destacar que o julgamento desportivo não impede que o caso seja analisado em outras esferas, como a criminal, a cível e do conselho de ética da entidade de classe à qual o treinador se vincula, no caso, o CREF. São esses julgamentos que definirão os rumos tanto pessoais quanto profissionais do denunciado, tendo o julgamento pelo STJD apenas reflexos financeiros e de término de relacionamento associativo.

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