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Campeão ou prisioneiro? A polêmica cláusula do campeão no MMA

Por Rafael Ramos e Elthon Costa

O mundo do MMA não é conhecido por sua transparência e clareza, mas também há muita desinformação quanto ao lado comercial do esporte, principalmente a respeito dos contratos dos lutadores.

Os contratos do UFC geralmente duram um número específico de lutas ou um período de tempo específico. A maioria dos contratos de lutadores no UFC são de dois anos ou menos, e a maioria deles têm duração de três anos ou menos. Embora seja raro um lutador assinar por mais de três anos, esses acordos provavelmente são reservados para os maiores nomes da promoção. E quando um lutador assina um contrato mais longo, geralmente é por 40 meses.

Porém, umas das cláusulas contratuais chama a atenção, senão vejamos:

“ARTICLE IV TERM

4.1 The duration of the Promotional Rights provided herein (the “Term”) shall commence on the Effective Date and end on the earlier of (i) forty (40) months after the first bout promoted by ZUFFA involving Fighter under this Agreement; or (ii) the date on which Fighter has participated in at least eight (8) Bouts promoted by ZUFFA pursuant to this Agreement (the “Termination Date”), unless terminated sooner or extended further pursuant to the provisions of this Agreement.

4.2 If, at the expiration of the Term, Fighter is then a UFC champion, the Term shall automatically be extended for the period commencing on the Termination Date and ending on the later of (i) one (1) year from the Termination Date; or (ii) the date on which Fighter has participated in three (3) bouts promoted by ZUFFA, regardless of weight class or title, following the Termination Date (“Extension Term”). Any reference to the Term herein shall be deemed to include a reference to the Extension Term, where applicable.”

De acordo com dados do processo antitruste1, o contrato de cada lutador com o UFC continha tal cláusula e, uma vez acionado, esse dispositivo impõe uma extensão mínima de um ano. (Zuffa é a entidade corporativa que faz negócios como UFC.) A mídia cunhou o termo “Cláusula do Campeão”2 para este artigo do contrato em específico, que estende o contrato por um ano ou três lutas, o que vier depois se o lutador se tornar campeão do UFC. Essa parte é clara.

O que não está claro é se essa cláusula se aplica ou não apenas uma vez, ou se aplicaria novamente se o lutador passar por suas três lutas adicionais e permanecer campeão.

Em termos de legislação americana, parece potencialmente uma violação da 13ª Emenda3, a proibição contra a escravidão ou servidão involuntária. Você não pode forçar alguém a trabalhar para você. Fica difícil imaginar, de acordo com a legislação corrente, se isso seria aplicável. Fato é que até agora não foi desafiado.

Destarte, se um lutador assinar contrato exclusivo e quiser sair e trabalhar para outra organização, ficará “na geladeira” para ganhar alavancagem de renegociação? Esse tipo de pergunta às vezes é feita a respeito das táticas de negócios do meio do MMA.

Para quem não sabe, em 2007, depois que Randy Couture conquistou o título dos pesos pesados de Tim Sylvia, ele tentou rescindir seu contrato com o UFC para lutar contra Emelianenko Fedor no Affliction para determinar o verdadeiro número um dos pesos pesados ​​do mundo. Mas, por causa da “cláusula dos campeões” que basicamente continuaria estendendo seu contrato, ele não teve saída e teve que voltar e defender seu título um ano depois.

Se essa cláusula for eliminada, significa que os campeões agora têm uma grande vantagem sobre o UFC nas negociações quando seu contrato chegar ao fim. Se o hoje campeão não receber o que quer, pode deixar o UFC como campeão e se tornar um grande trunfo para qualquer promoção rival com a qual ele assine para dizer “nós, não o UFC, temos o número um do mundo na categoria”.

Se o UFC não mudar o modelo de pagamento dos lutadores, podemos ver dezenas de campeões saindo no auge de suas carreiras para lutar em outras promoções, o que significaria que eventualmente as promoções que realmente beneficiam os lutadores acabariam com os melhores em seu plantel.

Elthon Costa é advogado trabalhista e desportivo. Pós-graduado em Processo Civil pela Faculdade Unileya e Pós-graduando em Direito Desportivo pelo Complexo Educacional Renato Saraiva (CERS). Sócio Diretor Jurídico e Desportivo no Todde Advogados.

Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo


REFERÊNCIAS:

JENNINGS, L. A. Thailand. Mixed martial arts: a history of ancient fighting sports to the UFC. United Kingdom: The Rowman & Littlefield Publishing Group, Inc, 2021. 226p. ISBN 9781538141953.

CRUZ, Jason J. Mixed Martial Arts and the Law: Disputes, Suits and Legal Issues. 1ª. ed. North Carolina, EUA: McFarland & Company, Inc., Publishers, 2020. 212 p. ISBN 978-1-4766-7930-3.

1UFC ANTITRUST LAWSUIT. In: ufcclassaction.com. Site. Disponível em: https://www.ufcclassaction.com/

2NASH, John S. First to escape the champion’s clause? Ngannou’s unique opportunity helped by these UFC contract changesIn: Bloody Elbow. Site, 22 jan. 2022. Disponível em: https://www.bloodyelbow.com/2022/1/22/22894536/first-to-escape-the-champions-clause-francis-ngannou-unique-opportunity-ufc-contract-changes-ufc-270. Acesso em: 24 mar. 2022.

313TH AMENDMENT: ABOLITION OF SLAVERY. In: constitutioncenter.org. Site. Disponível em: https://constitutioncenter.org/interactive-constitution/amendment/amendment-xiii. Acesso em 24 mar. 2022.

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