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Caso Ceará x Fortaleza sobre o regulamento específico do Campeonato Cearense 2025 (a prioridade de agendamento de jogo na Arena Castelão)

A Secretaria de Esporte do Estado do Ceará (SESPORTE), órgão estatal que administra a Arena Castelão (estádio – via de regra bem público de uso especial), determina o pré-agendamento de partidas de futebol pelo organizador do evento esportivo. No caso do campeonato cearense de futebol, a entidade gestora, detentora e organizadora principal desta competição é a Federação Cearense de Futebol (FCF).

Em função do desgaste e reforma necessária recentes do gramado da Arena Castelão, a SESPORTE prescreveu a obrigatoriedade da existência de um intervalo mínimo de sessenta e seis horas (66h) entre as partidas de futebol profissional a serem disputadas no referido equipamento público (ciência da Portaria n. 09/25 pelo ofício GABSEC n.o 53/25 à FCF).

O art. 12, § 3o, do Regulamento Específico da principal competição de futebol profissional do estado do Ceará (REC2025) é transparente: “O Campeonato Cearense 2025 será disputado em quatro fases, a saber: 1ª fase, quartas de final, semifinal e final (…) Nas fases Quartas de Final e Semifinal, ocorrendo coincidência de mandantes na mesma cidade, a prioridade de escolha de estádio será do clube de melhor campanha”.

A FCF consultou com antecedência Ceará e Fortaleza sobre suas preferências de estádios para a coordenação e o agendamento em tempo hábil dos jogos das semifinais, mas não obteve resposta de ambos.

Desde o dia 08 de fevereiro de 2025, após a vitória do Ceará sobre o arquirrival Fortaleza é sabido por todos que a melhor campanha da primeira fase do campeonato cearense é daquele conhecido pelo seu epíteto histórico de Vovô.

Diante da inércia de Ceará e Fortaleza em responder à FCF sobre as partidas das semifinais do campeonato cearense de futebol série A 2025 (reconhecido pela mídia como manjadinho) a serem disputadas na Arena Castelão ou no Estádio Presidente Vargas, surgiu o conflito nas últimas duas (2) semanas sobre o direito de prioridade de disputar o segundo jogo de semifinal na Arena Castelão, conforme o descrito no art. 12, § 3o, do REC2025.

Esta desavença levou aos representantes do Ceará a movimentação de um mandado de garantia no Tribunal de Justiça Desportiva do Futebol do Ceará (TJDFCE), equivalente a um mandado de segurança na Justiça Comum, requerendo uma concessão liminar de agendamento de sua partida de semifinal do campeonato cearense para ontem (dia 09 de março de 2025).

No dia 07 de março de 2025 (sexta-feira passada) a decisão monocrática proferida pelo presidente do TJDFCE em tela se declarou competente e denegou a concessão liminar requerida pelo impetrante do mandado de garantia.

Na omissão de resposta de Ceará e Fortaleza sobre o local em que pretendiam jogar as suas semifinais de volta, caberia à detentora de direitos e organizadora principal dos campeonatos cearenses de futebol profissional (FCF) expedir com precedência hábil no conteúdo da sua Portaria n.o 003/2025 que o jogo Ceará x Maracanã seria na Arena Castelão como prioridade, cumprindo o art. 12, § 3o, do REC, e recomendando que o mandante da contenda realizasse os contatos de praxe com a SESPORT.

Por meio do Ofício nº 13/PRE/FCF/2025, encaminhado para o Secretário de Esportes do Estado do Ceará, Rogério Pinheiro, a FCF declara: “a prioridade do Ceará Sporting Club, por ter campanha no campeonato Cearense, em escolher o estádio onde será mandante, conforme art. 12, § 3º, do Regulamento Específico da Competição”. Todavia, esta organização esportiva regional (FCF) não requer a marcação dos jogos seguindo o dispositivo em foco, resumindo-se a expor a sua norma regulamentar de competição.

Este seria o melhor ato da FCF para prestigiar o mérito desportivo em critério técnico estabelecido no art. 12, § 3o, do REC2025, já que é a entidade organizadora e detentora de direitos sobre as competições oficiais do futebol profissional no estado do Ceará, devendo até contatar à SESPORT para a preparação da partida em caso de omissão do Ceará, pois é responsável solidária pela organização e segurança de suas competições juntamente com a equipe mandante, segundo se extrai da melhor leitura sistêmica dos arts. 147, 149, 152, da Lei n. 14.549/23 (Lei Geral do Esporte-LGE).

A respeito da competência material para julgar tal conflito, também pertine à Justiça Desportiva (TJDFCE) por se tratar de demanda oriunda de interpretação de regulamento da competição, dissídio desportivo, originário da organização de competições, com o devido suporte do art. 217, § 1o, da CF/88.

Entretanto, essa competência material constitucional da Justiça Desportiva (TJDFCE) não exclui a jurisdição da Justiça Comum sobre os mesmos fatos geradores do litígio, uma vez que envolve a conexão das normas federativas (Regulamento Geral de Competição (RGC2025) e REC2025 com a Portaria n.o 009/2025 da SESPORT (órgão público de administração do bem público Arena Castelão), norma infralegal da Administração Pública do Governo do Estado do Ceará.

Em ocasiões como esta, recomenda-se aos interessados a impetração de mandado de segurança na Justiça Comum, pois esta é título executivo judicial, dotada de força executória, podendo a autoridade judiciária expedir mandado para compelir o órgão público gestor (SESPORTE) a adotar as medidas necessárias para a realização da partida, mesmo sem o período antecedente exigido em face de decisão judicial posterior, mas ainda com o objeto exequível (a possibilidade de preparação para o jogo).

Em outra via, por mais que a Justiça Desportiva (TJDFCE) seja compentente material para julgar o mesmo dissídio não tem força de autoridade judiciária para impelir à SESPORTE a agendar a partida, esta pode se negar, inclusive porque uma decisão da Justiça Desportiva (TJDFCE) só se torna título executivo judicial de curso forçado se for confirmado por uma decisão de órgão do Poder Judiciário competente para mesma matéria, para o caso seria uma Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE).

Ressalve-se que, a portaria da SESPORTE, enquanto norma de órgão público do Poder Executivo do Estado do Ceará, deter o poder de modificar os regulamentos de competições posteriormente as suas edições, constitui-se o conhecido fato do príncipe (factum principis) do Direito Administrativo por ser ato/norma da Administração Pública que altera a execução de uma relação jurídica celebrada previamente entre particulares, diferente de caso fortuito e força maior que decorrem da imprevisibilidade ou impossibilidade de cumprimento dos negócios jurídicos por intercorrências da natureza ou dos próprios contratantes privados envolvidos.

Um exemplo recente de caso fortuito e força maior foi a pandemia do covid-19, que provocou a alteração imediata por três anos dos calendários esportivos, bem como uma série de medidas a serem adotadas durante os jogos, sem relação originária e exclusiva com atos/normas da Administração Pública.

Por demais, a despeito do art. 6º, X, do RGC2025 intentar a responsabilidade única da equipe mandante em organizar as suas partidas (in casu Ceará), a melhor interpretação sistemática, teleológica (fim social a que se destina) e até filológica (literal) é a da responsabilidade solidária da FCF no pedido de agendamento à SESPORTE, pois os mencionados arts. 147, 149 e 152 da LGE delineiam “organizações esportivas regionais como diretamente responsáveis solidárias pela organização dos eventos, partidas, provas…”. Nesse sentido, a priori, a organização diretamente responsável pela realização do evento esportivo é a FCF, repita-se a detentora dos direitos e organizadora principal dos campeonatos cearenses de futebol.

Nada obstante, a expedição da Portaria 003/2025 da FCF defronta o art. 12, § 3o, do seu próprio REC, desprestigiando não apenas o mérito desportivo do critério técnico pré-existente no referente regulamento e alcançado unicamente pelo Ceará na competição, assim como prejudica este financeiramente, pois jogar na Arena Castelão para um time de torcida de massa representa mais proventos econômicos.

Ao mesmo passo, a Portaria 003/2025 da FCF beneficiou duplamente a Sociedade Anônima do Fortaleza (SAF) ao inverter para este a prioridade de jogar a Copa do Brasil contra o Ferroviário na Arena Castelão quarta-feira passada, pondo aquele e os demais times no mesmo patamar de mérito desportivo, sendo que o único a alcançar a melhor campanha da competição, vencendo todos os jogos, a incluir o maior clássico estadual, foi o Ceará.

Diante dessa situação, a FCF nem desculpas de pontuação acirrada entre os competidores tinha, tendo em vista que a melhor campanha de primeira fase viabilizando a prioridade de escolha de estádio para jogar a semifinal era exclusivamente do Ceará, todos cientes disto desde o dia 08 de fevereiro de 2025, dia em que este clube encerra a primeira fase com o melhor desempenho competitivo de maneira isolada na competição.

Enfim, a ideal imparcialidade aspirada para uma Federação de Futebol que organiza suas competições e para uma Justiça Desportiva (TDFCE) que detém competência constitucional para julgar os conflitos egressos destas matérias competitivas parece cada vez mais “tricoloridas”. Esta não é a primeira vez que se constata da FCF tal acontecimento, relembre-se as críticas realizadas a esta organização esportiva regional do futebol cearense em escritas do ano passado (2024) ao interpor recurso ante o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) do futebol em favor do Fortaleza-SAF.

Crédito imagem: Secretaria de Esporte do Estado do Ceará (SESPORTE)

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