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Caso Rodolfo: uso de drogas sociais no esporte cresceu e preocupa

O caso de Rodolfo, do Fluminense, pego no antidoping para cocaína, traz à tona um problema social do esporte: o crescente número de atletas consumindo drogas sociais.

Claro que a Justiça Esportiva,  e já se disse aqui, costuma ser muito rigorosa quando o assunto é doping.

O esporte pune doping com rigor elevado, maior até do que a legislação brasileira lida com quem cometeu crime. A explicação está na natureza do esporte. É que ele vai na contramão de princípios caros ao esporte, como o da paridade de armas. A trapaça fere também o espírito do “jogo limpo”.

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Mas existem vários pensadores do esporte que, ainda assim, acham que a punição tem sido pesada e nem sempre bem administrada. Usa-se a mesma régua para casos diferentes.

Acho importante a reflexão. Não seria o caso de o doping social, que não traz efetivo ganho desportivo, ter um peso maior na decisão, diminuindo a pena do atleta? É sabido, dois, três anos na vida de um profissional do esporte representam uma perda gigante na carreira dele.

No caso de Rodolfo, ele não usou a droga com o fim de ganhar desempenho. Um atenuante. Outro, ele admitiu uso, dispensando contraprova.

O agravante é que ele é reincidente. O artigo 10 do Código Mundial Antidopagem trata de reincidências, e prevê punição dura.

Mas a questão vai muito além da punição. O importante no caso de Rodolfo é o alerta que ele traz. O esporte precisa também olhar para um problema social. O uso de droga social tem crescido entre atletas, de maneira preocupante. Os clubes precisam dar atenção a isso, com um trabalho de atenção e orientação psicológica eficiente.

É o assunto que traz Ivana Negrão, que conversou com especialistas para contar esse problema que vive o esporte brasileiro.


 

Os casos de doping no futebol brasileiro diminuíram nos últimos anos, mas o uso de drogas sociais cresceu e preocupa

Mais um caso de doping no futebol brasileiro. De 2008 a junho de 2019, são exatamente 47.712 registros de exames que atestaram positivo para substâncias ilícitas. Na última terça-feira (26), o Fluminense veio a público informar, em nota, que o goleiro Rodolfo Alves de Melo foi flagrado no exame antidoping após a partida entre a equipe carioca e o Atlético Nacional, da Colômbia, pela Copa Sul-Americana, no dia 23 de maio, no Maracanã.

Como o flagrante foi feito numa competição intercontinental, Rodolfo será submetido a julgamento pela Conmebol. O primeiro passo do processo já foi dado. O atleta foi notificado pela Confederação Sul-Americana de Futebol e tinha cinco dias para solicitar a contraprova do exame, o que não foi feito.

De acordo com o comunicado oficial do Fluminense, após reunião com o clube, o atleta abriu mão do recurso e se declarou “suspenso voluntariamente, para se dedicar exclusivamente à sua defesa”. Rodolfo, então, passa a cumprir suspensão automática e deve ir a julgamento nos próximos meses. “Como ele assumiu o uso, facilita o processo porque não há necessidade de contraprova. E a confissão é um atenuante”, explica o advogado Américo Espallargas, especialista em direito esportivo.

Assumir espontaneamente a culpa pode ajudar o atleta. “Ser transparente, aberto, costuma ser bem visto pelo Tribunal de Disciplina da Conmebol”, acrescenta Américo. A Conmebol usa o próprio Regulamento Disciplinar e Antidopagem, mas se baseia na lista de substâncias proibidas e no Código Mundial Antidopagem da WADA.

Nos processos de julgamento por doping, diferentemente de outros casos, “a pena sempre sai de quatro anos de suspensão e vai reduzindo ou não conforme as alegações”, explica Américo Espallargas. Após a primeira sentença, cabe recurso na Câmara de Apelações da Conmebol. A última instância é a Corte Arbitral do Esporte (CAS).

Acontece que Rodolfo é reincidente. Em 2012, quando jogava pelo Athletico-PR, o goleiro foi flagrado pelo uso de cocaína e pegou dois anos de suspensão, o que pode agravar sua situação. De acordo com o artigo 10 do Código Mundial Antidopagem, que trata de reincidências, casos de “múltiplas violações” são passíveis de duras sanções.

Só que o caso de Rodolfo não se trata de doping para ganho de performance, porque ele possivelmente fez uso das chamadas drogas sociais, mas “é fraude da mesma forma”, afirma Fernando Solera, coordenador da Comissão Médica e de Combate à Antidopagem no Futebol, da CBF. “Chama a atenção e é algo preocupante.”

Em 2019 já foram registrados nove casos de doping no Brasil, incluindo o caso do goleiro Rodolfo e do nadador paulista Gabriel Santos, que veio à tona nesta quarta-feira, 26/6. O atleta do Esporte Clube Pinheiros teria feito uso da substância clostebol, um anabólico sintético.

Dr. Fernando Solera não pode comentar os casos desses e de outros atletas que estão sob investigação e ainda não foram a julgamento, como o do atacante uruguaio Gonzalo Carneiro, pego em exame antidoping durante o Campeonato Paulista, também por suspeita de uso de cocaína. Mas o coordenador do setor antidoping da CBF alerta sobre o trabalho que vem sendo feito no futebol para combater o uso ou contaminação por substâncias proibidas pela WADA. “O jogador de futebol brasileiro é um dos mais vigiados do mundo”, afirma.

Os atletas são submetidos a exames de urina e sangue durante os jogos e fora deles também. Em 2017, 4.964 coletas foram realizadas e 23 casos de doping registrados (0,47%). Em 2018 foram 13 casos num universo de 5.499 exames realizados (0,23%). Em 2019 a expectativa é que sejam feitas 6 mil coletas (abaixo tabela detalhada). O percentual de casos, portanto, diminuiu e está abaixo do número considerado razoável pela WADA, que é de 1%.

Falando especificamente de drogas sociais, de 2008 a 2019, dez casos foram enquadrados na categoria S8.canabinoides, que é a maconha, e 31 casos na categoria S6.A, para estimulante não específico, que é a cocaína. “Quando fala de doping por uso de droga recreativa, tem sempre outros componentes, porque não é uma questão de uso para performance. Tem um perfil de dependência”, destaca Américo Espallargas, especialista em direito esportivo.

E a responsabilidade dos clubes? Américo destaca que eles não são passíveis de punição nesses casos isolados. Pelo regulamento da Conmebol, que reúne o Código Antidopagem e Código Disciplinar, que precisam ser lidos juntos, só é possível cogitar responsabilidade do clube quando pelo menos três jogadores são pegos no antidoping no mesmo período. “Do contrário, a agremiação está totalmente isenta.”

Mas é aí que entra a questão social e educacional. Nossos especialistas defendem o trabalho de prevenção. “É sempre importante promover ações educativas antidopagem nas categorias de base, principalmente”, defende Américo Espallargas.

Dr. Fernando Solera informou que a CBF tem um programa educacional para o futebol brasileiro que é gratuito. Quando conversou com o Lei em Campo para esta reportagem, estava em Natal/RN, para uma palestra no ABC Futebol Clube. “São palestras gratuitas para as categorias de base e a equipe profissional, do futebol masculino e feminino. São aulas sobre prevenção e doping involuntário. Os clubes ou escolas podem solicitar à CBF. Toda semana realizamos as palestras”, afirma o coordenador da comissão médica e de combate à dopagem no futebol brasileiro.

Casos de doping no futebol brasileiro
Ano: Quantidade: Percentual de casos*:
2008 10 0,29%
2009 12 0,33%
2010 11 0,34%
2011 10 0,20%
2012 9 0,24%
2013 18 0,40%
2014 8 0,18%
2015 14 0,31%
2016 22 0,46%
2017 23 0,47%
2018 13 0,23%

*Percentual de casos no universo de exames realizados.

Nota oficial do Fluminense: “O Fluminense Football Club informa que o goleiro Rodolfo Alves de Melo foi flagrado no exame antidoping após a partida Fluminense x Atlético Nacional (COL), pela Sul-Americana, realizada em 23 de  maio de 2019 no Maracanã. O clube e  o atleta já  realizaram uma reunião e uma petição foi apresentada à Conmebol, onde o jogador abriu mão da contraprova se colocando suspenso voluntariamente, para se dedicar exclusivamente à sua defesa. O Fluminense já colocou seu Departamento Jurídico à disposição do jogador que, por norma legal, teve o contrato de trabalho suspenso.  A instituição dará todo o suporte necessário ao atleta.”

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