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ce·le·ri·da·de

Substantivo feminino. Qualidade do que é célere; presteza, rapidez, velocidade. Antônimo: lentidão.

Assim versa o dicionário brasileiro da língua portuguesa Michaelis sobre a palavra que dá título ao texto de hoje. Trata-se de termo bastante usual no âmbito jurídico; mas a definição do dicionário assegura também ao leitor menos habituado ao “juridiquês” a exata noção do seu significado: velocidade. E, embora o jogo de palavras possa assim sugerir, isso não significa que se trate de conceito importante apenas para o automobilismo.

Tomemos como exemplo um campeonato de futebol disputado em formato de “mata-mata”. Em determinada fase da competição, uma equipe se sente prejudicada por suposta interferência externa sobre a decisão do árbitro (em partida sem VAR) e busca a Justiça Desportiva para anular a partida. A celeridade é aliada da ideia de que a o órgão julgador deve proferir sua decisão de forma rápida, justamente para não prejudicar o andamento da competição.

A situação hipotética que descrevemos aconteceu há cerca de dois anos, na Copa do Brasil. A partida entre Aparecidense e Ponte Preta, válida pela primeira fase da competição, teve seu resultado impugnado no Superior Tribunal de Justiça Desportiva e foi, afinal, anulada. O Tribunal proferiu sua decisão final em menos de dois meses, viabilizando a repetição do jogo e a continuidade do torneio.

É importante destacar que o Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), em seu artigo 2º, insere a celeridade dentre os princípios que devem ser observados para sua aplicação. E não poderia deixar de ser, afinal se trata de direito fundamental garantido a todos os cidadãos pelo artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Infelizmente, na prática se sabe que o Poder Judiciário peca no atendimento a esse preceito constitucional. Já pensou se o caso acima fosse levado à apreciação da Justiça Comum? Em meio a tantos recursos possíveis e considerando a provável lentidão no processamento, seria possível que só se tivesse uma decisão final, irrecorrível, anos depois. Pois algo semelhante a isso aconteceu em Portugal: dez anos (!) depois de ser rebaixado, o Gil Vicente obteve decisão judicial que determinava sua incorporação à primeira divisão. Situações como essa evidenciam não apenas os graves problemas causados pela demora no julgamento de uma causa, mas também como seu resultado pode gerar grandes dificuldades aos organizadores de uma competição ao dar cumprimento à decisão.

O futebol é repleto de bons exemplos, mas não poderíamos falar de velocidade sem passar pelo automobilismo. E nas últimas semanas tivemos um exemplo claro da importância da celeridade no ambiente da Fórmula 1 – não apenas para ganhar disputas na pista, mas também para assegurar que elas sejam justas e em conformidade com o regulamento.

A temporada 2021 apresenta um cenário bastante distinto da anterior. Ao invés de um domínio avassalador da Mercedes, assistimos a uma disputa muito equilibrada entre a equipe alemã e a Red Bull. E recentemente se instaurou uma polêmica acerca de uma inovação aerodinâmica da Red Bull que, aos olhos da Mercedes, violaria o regulamento técnico da competição: o uso de asas traseiras flexíveis. Diante disso, a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) anunciou que iria realizar verificações mais rigorosas em relação a essas peças; porém, somente a partir da sétima etapa do campeonato. Todos os detalhes sobre a polêmica foram muito bem explicados pelo jornalista Fábio Seixas em sua coluna: https://www.uol.com.br/esporte/colunas/fabio-seixas/2021/05/21/fia-faz-lambanca-e-cria-o-gp-da-krakozhia.htm.

Naturalmente não temos como entrar no mérito técnico da questão levantada pela Mercedes. Porém, supondo que realmente possa haver uma burla ao regulamento e que ela dê alguma vantagem à Red Bull, qual o sentido de que isso seja admissível nas seis primeiras etapas? Mais: qual a lógica de a FIA ter comunicado antes da quinta etapa que somente duas etapas depois seria mais rigorosa nas verificações? Se, ao efetuar os testes com mais rigor, a Federação realmente identificar violação ao regulamento, poderá ser tarde demais para reparar eventuais distorções de resultados nas etapas anteriores que tenham sido geradas por uma vantagem indevida.

Enfim, todos os casos mencionados acima ilustram bem o porquê de a celeridade ser um princípio tão caro ao direito desportivo. Em última análise, a velocidade na tomada de decisões e no processamento de demandas contribui para a preservação de diversos outros aspectos importantes na disputa esportiva, como a estabilidade das competições, a paridade de armas e, claro, a própria segurança jurídica. E tudo isso com a ressalva sempre necessária: a celeridade não pode se confundir, jamais, com perda na qualidade da decisão.

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