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Conmebol e Chile esquecem caos, e isso repercute mal no Chile e no futebol

No Chile não se joga futebol por causa de uma convulsão social que parou o país, literalmente. O campeonato nacional está paralisado, e o serviço público de transporte não anda, já que várias estações de trem foram destruídas, e a maioria da frota de ônibus, queimada. Mesmo assim, os responsáveis pela final da Libertadores entre Flamengo e River Plate insistem em manter a final na capital Santiago. E tem explicação.

O governo chileno espera usar o futebol como instrumento político para unir um país convulsionado. Palavra da ministra do Esporte: “Faltam dias ainda para realizar a final, e o critério é um só: temos que realizar todos juntos. O esporte nos une, nos alegra”.

A Conmebol tem interesses financeiros. Como Marcel Rizzo trouxe nesse post, uma troca de local traria prejuízo para a entidade e para os parceiros comerciais. Plano B existe, e a entidade trabalha desde a semana passada com alternativas. Paraguai seria a saída mais segura, de acordo com alguns membros da entidade – a final da Sul-Americana já foi levada para lá por causa de uma crise menor no Peru. A estrutura já estaria pronta, já que Independiente Del Valle e Cólon jogam duas semanas antes.

A declaração do governo chileno não trouxe alívio total para a entidade do futebol. Essas fontes garantem que o Chile segue monitorado de perto, e que a Conmebol segue trabalhando. A aposta pela sorte, pelo tempo, foi recebida por alguns com desconfiança.

Afinal, governo chileno e entidade esportiva seguem juntos, e insistindo em uma aposta arriscada: o fim das manifestações.

Acontece que essa decisão já trouxe efeito contrário, e repercutiu mal entre os chilenos. Acompanhe o relato de Cauan Biscaia, jornalista brasileiro que vive no país há oito anos.

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Esta quarta-feira foi um dia de indefinições, especulações e expectativas no mundo do futebol depois que o presidente chileno Sebastián Piñera anunciou, no início da tarde, o cancelamento de dois eventos magnitude internacional que seriam organizados no Chile para os meses de novembro e dezembro. A desistência em sediar a APEC (Conferência Econômica da Ásia e Pacífico) e a COP25 (Cúpula das Nações Unidas sobrea Mudança Climática), devido aos constantes protestos que tomam conta do país desde o dia 18 de outubro, reforçou a teoria de que a decisão da Copa Libertadores, marcada para o dia 23 de novembro, entre Flamengo e River Plate, seguiria o mesmo caminho e mudaria drasticamente os planos da Conmebol para a sua primeira final única. Doce ilusão. Horas mais tarde, a ministra do esporte, Cecilia Pérez, confirmou a realização da partida em Santiago, contrariando apostas e assegurando que todas as medidas de segurança necessárias serão tomadas para contrapor a situação caótica que vive a sociedade chilena.

“Ratifiquei ao presidente da Conmebol (Alejandro Domínguez) e ao presidente Sebastián Piñera o nosso firme compromisso e disposição para realizar a final da Copa Libertadora em nosso país. Para isso, o Ministério do Interior realizará todas as coordenações correspondentes em matéria de segurança. Acreditamos que esta é uma tremenda festa esportiva que fará bem ao país, e portanto vamos trabalhar em conjunto para levar adiante esta instância tão importante”, declarou a ex-porta-voz do governo, empossada há 2 dias no Ministério do Esporte.

Esta decisão gerou eco nas redes sociais chilenas, já que a grande maioria não está de acordo com o dito pela ministra e afirma que o distúrbio social que vive o país, caracterizado por mobilizações massivas no centro da capital, e os violentos confrontos entre Forças Especiais de Carabineros de Chile e manifestantes, não permite que se reúnam as condições ideais para a recepção de um evento de tamanha transcendência. Espera-se que a totalidade dos ingressos seja vendida, e pelo menos 40 mil turistas poderiam chegar a Santiago para acompanhar a final no Estádio Nacional. Cenário preocupante para as autoridades chilenas, que tem convivido com constantes depredações, incêndios e um sistema de transporte público colapsado, resultado de ônibus, estações e trens de metrô completamente danificados, o que somado aos bloqueios das grandes avenidas por manifestantes, tem causado enormes congestionamentos de tráfego. Os protestos já causaram números preocupantes com mais de 900 pessoas detidas pela policia, 400 pessoas hospitalizadas, 50 ações legais contra Carabineros de Chile e Forças Armadas por abusos e violações de direitos humanos, e 19 pessoas mortas, o que chamou a atenção da Comissão de Direitos Humanos da ONU para enviar nesta quarta-feira três representantes com o objetivo de investigar a vulneração da integridade de cidadãos durante a ação das Forças Especiais da policia chilena no combate aos protestos.

A inesperada decisão da manter a final em Santiago também gerou comentários desconfiados nas redes sociais de chilenos acreditando ser esta medida uma forma de “dar circo, ou ópio, ao povo” já que o governo se vê sobrecarregado e precisa de um alento para desviar a atenção da população às demandas expressadas. Como disse a ministra, “este evento fará bem ao povo chileno”, levando em conta a enorme paixão pelo futebol no país e a grande concentração de turistas que deve movimentar a economia na semana da partida entre brasileiros e argentinos. A grande incógnita é, se depois de tantos saques e depredações em supermercados, farmácias, lojas e até hotéis em Santiago, a metrópole estará preparada para se reconstruir a tempo da grande final, além da preocupação pelo contingente policial que deve resguardar segurança, mas se encontra fadigado e concentrado em manter a ordem pública, algo que até agora não foi suficiente.

Só o tempo dirá se a decisão do governo chileno foi acertada, e os dias que antecedem a partida decisiva da Copa Libertadores serão indicadores chave para determinar o sucesso ou fracasso do inédito evento organizado pela Conmebol. Uma coisa é certa: se dependesse da vontade popular local, esta partida deveria ser cancelada e transferida a outro lugar do continente. Ignorando o caos que impera no Chile, os mandatários da confederação e do governo assumem o risco e esperam que o futebol e o fair play amenizem a dor de um povo ferido e raivoso.

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