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CPOM, o pesadelo dos intermediários, finalmente perto do fim?

Em 2005, foi publicada a Lei 14.042/2005, que instituiu o Cadastro de Empresas de Fora do Município (CPOM) na cidade de São Paulo. A iniciativa do município logo se espalhou por outras localidades, sendo implantada por diversas prefeituras no País, algumas vezes com outra denominação. Em Niterói foi criada a Declaração de Serviços Recebidos (DSR); no Rio de Janeiro, o Cadastro de Empresas Prestadoras de Outros Municípios (CEPOM); em Feira de Santana, o Registro Auxiliar de Nota Fiscal de Serviço (RANFS), dentre outros.

A regra trazida pelo paulistano CPOM – na linha do que propunham outras prefeituras – estabelecia que os prestadores de serviços localizados fora do município de São Paulo que prestassem serviços para tomadores situados na capital paulista, deveriam aderir ao programa, como forma de evitar a retenção na fonte do Imposto sobre Serviços (ISS).

O prestador de serviços de fora de São Paulo, ao se cadastrar no CPOM, recolhia o ISS apenas no município da sede do seu estabelecimento, sem também ter que tributar os rendimentos decorrentes das atividades realizadas na cidade de São Paulo, nessa localidade.

Ou seja, São Paulo criou uma regra de bitributação dos rendimentos dos prestadores de serviços não localizados no seu território, mas que aqui eventualmente prestassem serviços. Tributava-se o contribuinte a primeira vez no município em que ele estava sediado, e a segunda na cidade em que ele prestou o serviço. O contribuinte só seria eximido dessa dupla cobrança, caso fizesse sua adesão ao CPOM, quando então pagaria o ISS apenas no local do seu estabelecimento, como estabelece a Lei Complementar 116/2003.

Diante dessa situação absurda, muitos profissionais foram afetados, mas no meio esportivo, a principal categoria prejudicada pela medida foram os intermediários. É comum a um intermediário assessorar um clube ou um jogador em negócio que se concretize em local distinto daquele onde se encontra instalada a sua empresa.

Há poucos dias, por exemplo, o Grupo Figer, com sede em São Paulo, assessorou a ida do meia-atacante Marlos, que atuava pelo Shakhtar Donetsk para o Atlético Paranaense.[1] Houve uma prestação de serviços por um contribuinte de São Paulo, que se concretizou na cidade de Curitiba, já que o jogador foi negociado com um clube local.

Pelas regras do CPOM e assemelhados, o Grupo Figer, pelo serviço de intermediação do atleta, deveria recolher o ISS em São Paulo, local da sua sede e, se não fizesse seu cadastro em Curitiba, também se veria obrigado a recolher o imposto nesta localidade. Em verdade, o clube Atlético Paranaense ou o atleta, se veria obrigado a reter na fonte o ISS devido pelos intermediários, antes de efetuar a transferência do dinheiro decorrente da transação.

O ponto é que o Grupo Figer, nesse nosso exemplo, assim como ocorre com diversos outros intermediários, realiza com frequência operações como essas, assessorando clubes e atletas em negócios que ocorrem fora da cidade da sua sede. Dessa forma, a necessidade de realizar cadastros junto a outras prefeituras para evitar a dupla tributação da sua atividade pelo ISS se repete indefinida e rotineiramente. E com um agravante, as regras são locais, portanto, para que o intermediário possa se cadastrar ele tem que observar as exigências e particularidades demandadas por cada prefeitura.

A medida é extremamente burocrática e custosa. Porém, os municípios defendem a necessidade da inscrição como meio de identificar pessoas que simulam seu estabelecimento em outra localidade, representando um mecanismo anti fraude.

A verdade por detrás desse discurso é outra. Trata-se de uma forma que as prefeituras, capitaneadas por São Paulo, encontraram para aumentar sua arrecadação. Só que isso vem sendo feito de forma irregular, em desacordo com o artigo 3° da Lei Complementar 16/2003. Os municípios só poderiam cobrar o ISS de prestadores de serviços que estão situados dentro do seu território.

O assunto tomou grandes proporções e foi tema de repercussão geral no Recurso Extraordinário 1.167.509/SP, submetido ao plenário do STF em julgamento encerrado em fevereiro de 2021. Na ocasião, a Suprema Corte, por maioria de votos, acolheu os argumentos de defesa dos contribuintes e considerou inconstitucional a norma da cidade de São Paulo que previa a obrigatoriedade de cadastro em órgão da administração municipal, por parte de prestadores de serviços não estabelecidos no território do município, impondo-se ao tomador o recolhimento do ISS quando descumprida essa obrigação.

Conforme explicou o Ministro Marco Aurélio, relator do processo, não cabe aos municípios a instituição de obrigações acessórias destinadas a contribuintes que não integram a relação jurídico-tributária, isto é, fora da sua jurisdição. O Ministro deixou claro que a legislação paulistana afrontava prescrições de natureza constitucional, usurpando competência tributária de outro ente federado.

A despeito do decidido, a Prefeitura de São Paulo publicou em abril de 2021, uma nota de esclarecimento[2] informando que o CPOM “ainda está em vigor e produzindo todos os seus efeitos jurídicos, inclusive quanto à obrigatoriedade de seu preenchimento e quanto aos efeitos jurídicos e tributários da respectiva omissão em fazê-lo”.

A postura de afronta à autoridade do Supremo foi clara por parte da prefeitura paulistana e, como consequência, o que se viu foi que as demais municipalidades seguiram o mesmo caminho. Ou seja, ignoraram a força de uma decisão do STF e mantiveram a exigência de cadastramento dos prestadores de serviços de fora do município, sob pena de o contribuinte ser bitributado pelo ISS.

Em termos práticos, o que se viu no ambiente esportivo foi que intermediários de atletas e clubes seguiram compelidos a realizar cadastros Brasil afora, toda vez que prestavam serviços em local diverso daquele em que estava estabelecida sua sede, apesar de reconhecida a inconstitucionalidade dessa medida. Um verdadeiro de absurdo! E aqueles que estivessem insatisfeitos, eram obrigados a ajuizar medidas judiciais. O custo de propositura de uma ação para contestar essa exigência formal não compensava, sendo mais interessante ao intermediário, por mais burocrático que fosse, seguir com o cadastro.

Mas nem tudo está perdido, No final do ano passado, mais precisamente em 27 de novembro, foi publicada a Lei 17.719/2021, que, dentre outras alterações relevantes, tornou facultativo o cadastro na Secretaria Municipal da Fazenda, de prestadores de serviços localizados fora do Município de São Paulo, o CPOM. Com isso, o contribuinte de fora de São Paulo que prestar serviços na cidade, ainda que não se cadastre no CPOM, deixa de sofrer a dupla cobrança do ISS.

A notícia é um alívio para os intermediários que atuam no Brasil, que agora passam a ter mais esperança de que essa exigência absurda – já declarada inconstitucional pelo Supremo – venha de fato a ser extinta. Agora nos resta acompanhar e torcer para que outros municípios brasileiros também acabem com a obrigatoriedade do CPOM e assemelhados, seguindo o exemplo (tardio) de São Paulo.

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[1]https://ge.globo.com/pr/futebol/times/athletico-pr/noticia/o-camisa-10-chegou-marlos-realiza-sonho-de-infancia-e-assina-com-o-athletico.ghtml acesso em 2.2.2022.

[2] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/fazenda/noticias/index.php?p=29485, acesso em 2.2.2022.

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