Dentro da Lei nº 14.597, de 14 de junho de 2023, que institui a Lei Geral do Esporte, especificamente no Capítulo II, a partir do artigo 70, estão os dispositivos dedicados ao regramento das “Relações de Trabalho no Esporte”.
Ao se tratar das relações de trabalho no esporte, evidentemente que é necessário passar pelo Contrato Especial de Trabalho Esportivo, justamente pelo seu protagonismo quando se trata do respeito e da observância aos direitos sociais trabalhistas do atleta profissional, efetivando os preceitos da Constituição Federal.
Após discorrer sobre os contornos jurídicos do Contrato Especial de Trabalho Esportivo, a Lei Geral do Esporte destina a seção VI do seu texto para as “disposições específicas ao futebol”. Não parece cabível ignorar a relevância do futebol dentro do esporte brasileiro ou, até mesmo, dentro da sociedade brasileira, enquanto elemento de identificação do nosso país. De qualquer forma, igualmente descabido, salvo melhor juízo, que seja feita uma distinção do patrimônio jurídico das relações de trabalho do futebol em relação às outras modalidades, quando a própria Constituição Federal permite que haja diferenciação apenas entre o desporto profissional e o desporto não profissional:
Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um, observados:
(…)
III – o tratamento diferenciado para o desporto profissional e o não-profissional;
Embora a distinção entre modalidades feita pela legislação infraconstitucional eventualmente não resista a uma análise de sua constitucionalidade, verifica-se que o acaba por promover indesejadas distorções.
Por exemplo, o texto do artigo 97 da Lei Geral do Esporte exclui dos atletas profissionais de futebol o direito de receberem acréscimos remuneratórios “em razão de períodos de concentração, de viagens, de pré-temporada fora da sede e de participação do atleta em partida, em prova ou equivalente, salvo previsão contratual diversa”, enquanto os atletas profissionais de todas as outras modalidades, por inferência, farão jus aos referidos acréscimos.
Outro exemplo é a tentativa de evitar a incidência do adicional noturno aos clubes de futebol, fixando o trabalho noturno no período compreendido entre 23h59 de um dia e 6h59 do dia seguinte, enquanto os atletas profissionais de todas as outras modalidades, por inferência, terão o seu trabalho noturno entre 22h00 de um dia e 5:00 do dia seguinte.
Por derradeiro, outra distorção que não decorre da lei, mas da prática, é que o artigo 97, VIII, da Lei Geral do Esporte, caracteriza “a atividade do atleta profissional da modalidade futebol por remuneração pactuada em contrato especial de trabalho esportivo firmado com organização que se dedique à prática esportiva”, entretanto, salvo melhor juízo, nem todas as organizações esportivas de administração do futebol exigem que os clubes de futebol feminino comprovem a formalização do Contrato Especial de Trabalho Esportivo e a anotação da CTPS da suas jogadoras para que tenham condição de jogo, algo que ocorre quando se trata do masculino, diferenciando o patrimônio jurídico do atleta profissional de futebol pelo gênero.
Em conclusão, embora a Lei Geral do Esporte tenha a literal conotação de abranger todo o esporte brasileiro, entendeu cabível adicionar ressalvas às relações de trabalho no esporte, o que fez pelas disposições específicas ao futebol, as quais merecem reflexão sobre a sua duvidosa constitucionalidade e sobre as distorções causadas ao ecossistema esportivo.
Até a próxima.
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