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De proibido a obrigatoriamente incentivado, futebol feminino vai para onde?

Nunca se falou tanto em futebol feminino como agora. No Brasil e no mundo.

Isso faz parte de uma política da FIFA de incentivo à modalidade, que levou a reboque Conmebol e CBF. As duas criaram regras que obrigaram os principais clubes da América do Sul e do Brasil a investir. Não cumpre, será punido no futebol masculino.

Mesmo assim, como já se falou aqui, a realidade do futebol feminino não é a mostrada agora no Mundial da França. Ela é muito mais difícil.

Direitos desrespeitados, salários muito baixos e pouco incentivo. 2019, com esses incentivos obrigatórios, mudará isso?

Alguns exemplos na Europa mostram que o futebol feminino pode caminhar sozinho, como uma receita interessante para os clubes. Na Espanha, uma conquista gigante que pode servir de exemplo: um protocolo que garante direitos na gravidez e na maternidade.

A Ivana Negrão conversou com especialistas para saber as transformações jurídicas e os caminhos que o futebol feminino pode tomar.


 

Futebol não ser coisa de mulher nem sempre foi apenas preconceito. Já foi lei! O decreto de número 3.199, de 1941, criou o Conselho Nacional de Desportos, que no artigo 41 trazia o seguinte texto: “Às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza”. Quatro anos depois, a restrição foi mais específica. O regime militar proibiu literalmente a prática feminina de lutas de qualquer natureza, futebol, futebol de salão, futebol de praia, polo, halterofilismo e beisebol. Em 1979, as proibições foram revogadas, e as primeiras ligas surgiram de forma legalizada. 

Em 2019 o cenário ainda não é o ideal, mas apresenta avanços. Muito em razão de uma decisão da FIFA, que, há três anos, decidiu incentivar o futebol feminino. Agora consta no estatuto da entidade máxima do futebol mundial, no artigo 23-J, que a modalidade é uma prioridade global. A partir dessa decisão, outras entidades mudaram de postura. Ainda em 2016, a Conmebol regulamentou que os clubes que quiserem disputar a Copa Sul-Americana e a Libertadores teriam que obrigatoriamente ter um time feminino ou uma associação com algum time, tanto no profissional como nas categorias de base. O prazo de adaptação para a nova regra foi de dois anos. 

Danielle Maiolini, especialista em Direito Esportivo, acrescenta que a regra vai além; determina que “os clubes fomentem a prática do futebol feminino dentro dos seus quadros ou em associação a uma equipe; forneçam material humano necessário para que a técnica seja implementada e incentivada; e que elas tenham ainda equipamentos e infraestrutura para desenvolver a atividade normalmente”.

Já a CBF impôs a mesma exigência aos clubes licenciados para a disputa dos campeonatos organizados pela instituição aqui no Brasil e segue, segundo Danielle, “uma tendência internacional. A Europa, inclusive, é precursora no investimento no futebol feminino e faz questão de ressaltar que não faz só por uma questão social, de igualdade de gênero. Futebol feminino tem se mostrado uma alternativa extremamente rentável e uma opção econômica muito interessante para esses clubes. É visto como mais uma vertente, mais uma oportunidade de monetizar o que os clubes têm com o seu futebol”.

Os números comprovam que há, sim, interesse do público em geral pelo futebol feminino. Na última temporada europeia, alguns jogos tiveram recordes de público, e as mulheres em campo atraíram multidões. Na partida entre Juventus e Fiorentina, no dia 24 de março, cerca de 39 mil pessoas estiveram presentes ao Juventus Stadium, mesmo palco onde Cristiano Ronaldo desfila seu talento.

Já na Espanha, as meninas do Atlético de Madrid e Barcelona registraram um público ainda mais impressionante. Mais de 60 mil pessoas assistiram à partida entre as duas equipes no mesmo estádio onde os jogadores de Liverpool e Tottenham decidiram a última UEFA Champions League, o Wanda Metropolitano.

A Espanha, aliás, também se destacou fora de campo na última temporada, quando a associação de futebolistas do país apresentou ao Conselho Superior de Desportos e à Federação Espanhola de Futebol um protocolo de gravidez e maternidade que garante direitos às atletas em relação aos cuidados com as crianças, inclusive durante as viagens. 

No Brasil, com um Campeonato Brasileiro Feminino mais estruturado, vivemos um novo momento de empolgação com a seleção feminina de futebol. Começa nesta sexta-feira a Copa do Mundo para as mulheres. Lideradas por Marta, seis vezes eleita a melhor do mundo (mais prêmios do que Cristiano Ronaldo e Messi), e pelas veteranas Formiga e Cristiane, as meninas do Brasil tentam um título inédito. 

A competição terá a transmissão de quatro emissoras, duas delas de TV aberta (Globo e Bandeirantes, além de SporTV e Band Sports). Empresas estão patrocinando as jogadoras e fazendo campanhas exaltando o futebol feminino. Outras, como a Natura, sediada em Osasco, São Paulo, chegou a anunciar a liberação dos funcionários para assistirem aos jogos do Brasil, como acontece na ocasião do Mundial masculino.

A questão é saber se elas continuarão recebendo visibilidade e atenção após a competição. Para as atletas, a luta é contínua. Nos Estados Unidos, ainda em março, elas entraram com uma ação contra a federação de futebol do país por igualdade de salários e condições de trabalho. E a estrela do time norte-americano chega ao Mundial com os cabelos platinados e mechas rosas. “A mudança que temos visto não é suficiente. Para os recursos e capacidades disponíveis para implementar essa mudança, eu não acho que estejam fazendo o bastante”, disse a meia Megan Rapinoe.

Em entrevista à CNN, Fatma Samoura, secretária-geral da FIFA, se mostrou defensora da igualdade salarial entre homens e mulheres, “especialmente quando falamos de jogadores de futebol de elite”. Ela ainda ressaltou o momento do futebol feminino: “Para mim, definitivamente esta é a Copa do Mundo mais importante, porque é a Copa do Mundo que acontece em um momento no qual as mulheres mais estão levantando a voz por igualdade, por justiça. As mulheres são 50% da população mundial, e por um jogo tão popular como o futebol, será um erro muito grande negligenciar 50% da população”. O plano da FIFA é ter até 60 milhões de mulheres praticando futebol até 2026.

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