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Decisão contra Federação Internacional de Patinação pode ser mais um marco de liberdade para atletas de todos os esportes

O esporte, como ele é hoje, sofreu uma derrota importante nesta semana (16 de dezembro). A decisão de uma corte estatal contra a Confederação Internacional de Patinação é um perigo também para a FIFA e do COI. Com ela, já dá até pra se imaginar um campeonato de futebol com craques do planeta sem a chancela da entidade máxima do futebol. Imaginar.

Vamos lá.

O Tribunal Geral da União Europeia entendeu que as regras da patinação para atletas participarem das competições estão em desacordo com o código de concorrência da União Europeia. Hoje, a International Skating Union (ISU) é a única autoridade reconhecida pelo Comitê Olímpico Internacional e tem o poder de pré-autorizar os eventos em que seus membros podem competir. Violações de seus estatutos estão sujeitas a pesadas multas.

Acontece que em 2014, uma empresa não afiliada tentou organizar uma nova competição de patinação de velocidade em Dubai, mas não conseguiu porque atletas de ponta não poderiam participar, já que corriam o risco de serem excluídos da federação ligada ao Comitê Olímpico.

Atletas se sentiram incomodados com isso. Dois deles patinadores de velocidade holandeses a apresentarem uma queixa à Comissão Europeia em 2017. Imediatamente foi ordenado que a ISU alterasse suas regras ou enfrentaria multas. A federação de patinação no gelo não aceitou a decisão e levou a discussão ao Tribunal de Justiça Europeu.

Numa decisão publicada dia 16 de dezembro, o TJCE confirmou que a Comissão tinha razão ao sancionar o ISU e que o seu sistema de sanções é “desproporcionado” e “mal definido”.

“Tal severidade pode dissuadir os atletas de participarem de competições não autorizadas pela ISU, inclusive quando não houver motivo legítimo para tal recusa de concessão”, observa a decisão.

A posição de comando da federação, acrescenta, pode levar a situações de conflito de interesses, pois pode impedir que potenciais organizadores montem seus próprios eventos, que são uma fonte lucrativa de renda.

“A ISU é obrigada a garantir, ao examinar os pedidos de autorização, que terceiros organizadores de competições de patinação de velocidade não sejam indevidamente privados de acesso ao mercado relevante”, diz a decisão.

Este caso é a primeira instância do Tribunal de Justiça Europeu sobre se as regras adotadas por uma federação desportiva violam o direito da concorrência da UE.

A decisão diz respeito a federação de patinação, mas assustou os gigantes FIFA e Comitê Olímpico Internacional. Eles também têm regras rígidas de elegibilidade, dentro da cadeia associativa do esporte, chamada Ein Platz Prinzip.

Cadeia associativa

Por isso existe a pirâmide associativa do esporte. Clubes são filiados a federações, que são ligados a confederações, que seguem (todas) as determinações do Comitê Olímpico Internacional (no caso do futebol, da FIFA). Essa associação é voluntária, e no direito esportivo é conhecida como Ein Platz Prinzip.

E TODOS precisam cumprir as mesmas regras. Inclusive o atleta, que ao assinar com um clube, se compromete com todas as regras e procedimentos da modalidade da qual o clube é filiado nessa cadeia, como numa espécie de contrato de adesão.

Por isso que não existe um campeonato de futebol importante sem a chancela da FIFA. Quem se inscrever em um deles, pode ser desfiliado da federação local, não poder mais assinar contrato com um dos clubes que conhecemos, não jogar Copa e por aí vai.

Ter uma justiça especializada e um caminho jurídico que respeite essa cadeia na busca de solução para litígios esportivos passa a ser crucial para a sobrevivência do movimento esportivo da forma como é organizado hoje. E ter a aceitação de todos os membros a esse “contrato de adesão” é o que garante a estabilidade jurídica do movimento esportivo.

E agora?

Segundo o professor de Direito e colunista do Lei em Campo, Wladimyr Camargos, “com mais essa decisão, o Tribunal de Justiça da União Europeia vai consolidando uma jurisprudência referente às limitações à aplicação dos princípios da especificidade e integridade do esporte frente ao direito da livre concorrência.”

O esporte é transnacional, mas não independente. O que garante a estabilidade jurídica dele é a adesão de todos os participantes dessa cadeia às regras determinadas pelas entidades esportivas. Com o se fosse um contrato de adesão.

Quando a entidade não entende o que o movimento esportivo quer, ele corre um risco e sofre irritações. As pessoas (atletas) sempre estão livres a procurar a Justiça. No Brasil este direito é assegurado pelo art 5º da Constituição.

E se a Justiça entender que eles têm razão, o sistema jurídico do movimento esportivo sofre um baque gigante. E precisa ser revisto.

Foi assim no Caso Bosman, que já escrevi aqui. Um atleta belgainconformado com a lei que o prendia a um clube mesmo sem contrato, buscou o Estado. Ele ganhou na Justiça estatal, o esporte mudou regras e os atletas de grande parte do mundo ganharam muito mais liberdade.

A decisão contra a federação de patinação é mais uma que pode ser um marco na liberdade de atletas. Você já imaginou um outro campeonato forte de futebol que não tenha a chancela da FIFA ou de entidades a ela filiadas? Pois, é. Já dá pra imaginar.

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