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E-Sports e esporte

 Rafael Teixeira Ramos e Ana Cristina Mizutori [1]

Embora não seja um entendimento unânime, pode-se dizer que o esforço físico não compreende elemento essencial para caracterização de uma atividade esportiva. No caso dos esportes eletrônicos (e-sports) há quem já defenda um esforço físico reflexivo da mente com considerável intensidade.

A afirmação acima se permite ao fato de que, muito além de conceitos já estabelecidos, o operador do Direito deve se ater às mudanças, sejam estas sociais, econômicas, culturais. Todas essas transições, advém ou provocam impacto direto no comportamento humano.

A partir da subjetividade do conceito de esporte, importa primeiro categorizá-lo, nos termos do que dispõe a Lei Geral sobre o Desporto, em seu art. 3º, se o escopo desta atividade esportiva visa a educação, participação, rendimento ou formação.

Para a coluna dessa semana, o esporte de alto rendimento é o que interessa. Mas não qualquer esporte, os esportes eletrônicos.

Até os não aficionados pela modalidade, podem afirmar que os esportes eletrônicos, hoje, possuem sua parcela de participantes que disputam mediante delimitação de regras, em um ambiente competitivo pré-ordenado, competições de elevada premiação.

A organização dos telejogos, como também é chamado na Espanha, envolvem uma competitividade com garantia de integridade esportiva, paridade entre os competidores e premiações pelas vitórias.

Os esportes eletrônicos demandam aos seus ciberatletas concentração, treino, esforço mental, físico, elevado nível técnico, pressão psicológica ante a expectativa de torcida, entre outros fatores próprios de um atleta “galáctico do futebol”.

No que diz respeito ao esforço, talvez este seja o coeficiente controverso dentre aqueles que defendem que e-sports são de fato um esporte.

O esforço mental que se exige para operar um jogo eletrônico é inquestionável. Tanto quem os joga, como aqueles quem não se interessam, podem assegurar o quanto demanda de habilidades extraídas do raciocínio, da concentração, da coordenação motora, o que acaba a se refletir sobre a dimensão física, tendo em vista as várias horas de treino e competições sentadas, em pé e realizando movimentos dos mais diversos.

Questiona-se, a partir disto, por que o esforço mental não caracterizaria esforço físico. Afirmar que esforço mental não correspondente a esforço físico é o mesmo que dizer que o cérebro não faz parte do corpo humano, aliás há muito a ciência já descobriu que este é um músculo sofisticado.

Assentada nesta concepção, outra questão deve ser suscitada: podendo-se equiparar o ciber jogos a uma atividade esportiva, aqueles que são desempenhados através de alto rendimento, podem ser reputados como profissão?

Nos termos do já citado art. 3º, da Lei Pelé, em seu §1º, incisos I e II, os quais estabelecem, respectivamente que: “I – de modo profissional, caracterizado pela remuneração pactuada em contrato formal de trabalho entre o atleta e a entidade de prática desportiva” e “II – de modo não-profissional, identificado pela liberdade de prática e pela inexistência de contrato de trabalho, sendo permitido o recebimento de incentivos materiais e de patrocínio.”.

Por força do art. 28, da Lei Pelé, considera-se profissional o atleta que possui remuneração pactuada por meio de contrato especial de trabalho desportivo firmado com a entidade de prática desportiva empregadora.

Muito se debate acerca da defasagem da referida previsão legal, uma vez que mencionada lei impõe a tendência de aplicar o contrato especial de trabalho desportivo somente para o futebol diante das comportas do art. 94 da Lei Pelé, o que não retira o efetivo caráter profissional que possa existir nas demais modalidades.

Nos esportes eletrônicos, inclusive na prática, tem-se a possiblidade de uso da figura de contratação celetista de ciberatletas de alto rendimento. Perante à Lei Pelé, inadequada a este novo tipo de desporto formal e de rendimento profissional, é plenamente aceitável, nos termos da aplicação subsidiária da legislação geral trabalhista (art. 28, § 4° da Lei Pelé). Por outro lado, as contratações dos atletas podem se dar pelo art. 442-B, consistente na contratação do trabalhador autônomo, afastando-se a qualidade de empregado prevista no art. 3º, ambos da CLT, quando não houver a caracterização dos elementos fático-jurídicos do vínculo empregatício. Isso é possível porque nos desportos digitais há as participações individuais e por equipes.

……….

[1] Mestranda em Direito Desportivo na PUC/SP; advogada desportiva no escritório Manssur, Belfiore, Gomes e Hanna Advogados; membro da Comissão Jovem da Academia Nacional de Direito Desportivo; auditora vice-presidente da 1ª Comissão Disciplinar do STJD do Futsal; auditora auxiliar do STJD do Futebol.

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