Erros provocados pelo VAR podem gerar a invalidação de uma partida? Essa questão está posta na mesa do STJD pelo Vasco, que pretende anular o jogo que disputou contra o Internacional.
Um defeito no equipamento fez com que a equipe auxiliar de arbitragem não enxergasse o impedimento no lance de um dos gols marcados pela equipe gaúcha. A questão que se apresenta é: seria este um caso sujeito à invalidação de uma partida?
Para saber a resposta, é preciso discernir erro de fato do erro de direito, onde apenas a segunda hipótese permite que uma partida seja anulada.
O erro de fato dá-se quando o árbitro enxerga equivocadamente um lance, dando a esse mesmo episódio a consequência jurídica fixada pela norma, de acordo com o que por engano percebeu. Há um erro na premissa, por força de uma deturpada análise da realidade.
No erro de direito acontece exatamente o inverso. O árbitro percebe perfeitamente a verdade do ocorrido, mas dá a esse fato uma consequência jurídica proibida pela norma. Existe, aqui, um erro na aplicação do direito, descumprindo-se um preceito imposto pela lei.
Em ambos os casos há um problema no silogismo. Porém, enquanto no erro de fato ele está na origem, no erro de direito o defeito situa-se na conclusão. No erro de fato há uma falha dos sentidos. No erro de direito há o desconhecimento da regra aplicável. O primeiro erro é escusável. O segundo é inadmissível, porque o árbitro tem o dever de conhecer a regra do jogo.
Assim, no erro da marcação de um impedimento, o árbitro não ignora a consequência legal de validar ou não validar um gol. Isto é um erro de fato. Porém, se ele invalida um gol olímpico por entender que a bola deveria ter tocado em alguém antes de entrar para que o tento pudesse legitimar-se, ele comete um erro de direito.
Numa frase: o erro de direito surge quando o árbitro “inventa” uma regra que não existe. Daí porque o erro de direito é passível de invalidar uma partida, pois impede o arbítrio de alguém que poderia enveredar a disputa para um lugar completamente fora das regras concebidas pela federação esportiva.
Vide, nesse sentido, o art. 259 do CBJD quando fala que a anulação é possível quando não se observam as regras da modalidade, ou seja, no momento em que temos um erro de direito::
Art. 259. Deixar de observar as regras da modalidade.
PENA: suspensão de quinze a cento e vinte dias e, na reincidência, suspensão de sessenta a duzentos e quarenta dias, cumuladas ou não com multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 1.000,00 (mil reais). (NR).
§ 1º A partida, prova ou equivalente poderá ser anulada se ocorrer, comprovadamente, erro de direito relevante o suficiente para alterar seu resultado
No direito desportivo brasileiro só existe uma hipótese que permite a anulação de uma partida que não seja por erro de direito. É quando o árbitro dolosamente manipula o resultado do jogo. É o que prevê o art. 243-A do CBJD:
Art. 243-A. Atuar, de forma contrária à ética desportiva, com o fim de influenciar o resultado de partida, prova ou equivalente.
Parágrafo único. Se do procedimento atingir-se o resultado pretendido, o órgão judicante poderá anular a partida, prova ou equivalente, e as penas serão de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais), e suspensão de doze a vinte e quatro partidas, provas ou equivalentes, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, ou pelo prazo de trezentos e sessenta a setecentos e vinte dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código; no caso de reincidência, a pena será de eliminação.
Mas e o VAR? Onde ele fica nesse cenário? Por tudo o que foi dito, é possível constatar que dificilmente o uso do VAR poderá redundar num erro de direito, já que ele se presta para esclarecer o árbitro principal sobre os fatos ocorridos na partida. Quem aplica a regra do jogo é o árbitro, ou seja, quem está sujeito a cometer o erro de direito é ele e não o VAR.
Por via de consequência, tem-se que falhas no equipamento ou equívocos cometidos pelo árbitro de vídeo na interpretação dos lances, constituem igualmente erros de fato e por isso, não sujeitam a partida à invalidação.
Diante de tudo o que vimos, voltemos ao caso que motivou este artigo. O pleito do Vasco merece prosperar?
Prefiro não responder.
Acho que o leitor já está suficientemente esclarecido para tirar suas próprias conclusões.