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Garganta Profunda

“Garganta Profunda” (1972) é um famoso filme pornográfico americano, tendo sido o primeiro do gênero a ser exibido em cinemas dos Estados Unidos e um dos únicos do ramo a possuir trama, enredo linear e narrativa, permitindo o desenvolvimento de seus personagens.

O título da película inspirou o codinome dado ao informante dos jornalistas do periódico The Washington Post, que desmascararam o plano do presidente Richard Nixon para destruir os rivais do Partido Democrata, levando-o à queda, naquilo que ficou conhecido como WATERGATE.

Outro escândalo indecente penetrou no mundo do futebol e teve mais um clímax esta semana. No chamado FIFAGATE, os processos criminais estão sendo ampliados para além dos dirigentes corruptos, chegando nos representantes de emissoras de televisão que atuaram como corruptores.

Carlos Martinez e Hernan Lopez, ex-representantes da Fox, foram indiciados pelo pagamento de propinas a dirigentes em troca do direito de transmitirem jogos das Eliminatórias e Taça Libertadores.

O garganta profunda da vez foi o empresário argentino Alejandro Burzaco, ex-diretor da empresa de eventos esportivos Torneos y Competencias. Em delação premiada, Buzarco levou muita gente para o buraco, pondo a nu as negociatas para a aquisição desses direitos.

Um dos alvos foi o advogado Jorge Delhon, ex-integrante do Governo de Cristina Kirchner, que cometeu suicídio se jogando numa linha do metrô poucas horas após haver sido implicado pelo delator.  

Mas os trilhos do processo criminal nos EUA revelaram que a corrupção foi facilitada pelo modelo atual de gestão das entidades desportivas. De fato, administradas em formato de associação sem fins lucrativos, elas atuam sem os controles internos e governamentais que são próprios das sociedades empresárias.

O FIFAGATE deixou claro que a inexistência de fins lucrativos passa bem longe dessas entidades, pois além de não se sustentarem com a contribuição de seus associados, elas atuam no mundo empresarial, movimentando cifras milionárias.

A universalização do esporte é outro elemento relevante para facilitar a corrupção, pois cada país tem sua própria legislação e limites territoriais para agir. E sem uma normatização internacional, fica difícil combater tantas irregularidades.

O terceiro e que talvez seja o maior dos problemas, é o fato de que as federações desportivas atuam em autêntico regime de monopólio, por deterem poderes exclusivos de organização e regulamentação da modalidade que representam no plano mundial e nacional.

Com efeito, não existe outra entidade que ofereça um campeonato sul-americano de futebol que não seja a Conmebol, nem outra federação que realize os jogos olímpicos além do COI. Tais entes monopolistas e seus gestores podem abusar de sua “posição absoluta” no mercado e é essencial que haja controle do Poder Público, a fim de impedir abusos como os que temos visto ultimamente.

É por isso que o FIFAGATE traz uma pá de cal para o velho e revelho argumento de que as entidades desportivas não devem ser fiscalizadas pelo Estado “por serem autônomas e por ser o esporte um assunto eminentemente privado”.

Objeção nada mais que ultrapassada, até porque esses negócios jurídicos nada tem a ver com o esporte em si uma vez que violam normas antitrustes e leis que visam preservar a livre concorrência e equalizar as oportunidades de mercado.

Ademais, não se pode considerar que não exista interesse público quando cifras astronômicas estão envolvidas, porque onde há muito dinheiro, aumenta-se a possibilidade de que delitos de toda ordem financeira sejam praticados.

Tal como Linda, a protagonista do filme, que nunca estava satisfeita sexualmente, os corruptos parecem jamais estar saciados com o valor de suborno que recebem. E como é sabido, à medida que as cifras aumentam, outros segmentos licenciosos aparecem na orgia do dinheiro sujo, como as máfias de lavagem de dinheiro, por exemplo.

Tudo isto nos mostra que a questão é estrutural, pois não devemos nos esquecer de que o FIFAGATE foi somente mais um dos episódios de corrupção no esporte.

Sem pudor, temos visto vários gargantas profundas denunciando casos e mais casos de compra de votos para a realização de competições internacionais, como copa do mundo e jogos olímpicos dentre outras obscenidades verificadas em negócios pouco ortodoxos.

O escândalo não pode servir unicamente para fazer com que os culpados sejam punidos. Há que se criar regras de controle e mecanismos de fiscalização tanto no plano internacional quanto no direito interno de cada país.

As entidades desportivas precisam igualmente agir. Sua situação reclama a adoção de normas de compliance e regimes de transparência que reduzam o poder dos executivos e democratizem o regime de tomada de decisões. No caso dos direitos de transmissão, por exemplo, um simples processo licitatório teria evitado as fraudes.

Está mais do que na hora de tirar a roupa dos embustes que escondem os negócios esportivos.

Existem inúmeras coisas para serem mostradas.

Porque o problema é muito mais profundo do que parece.

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