Em carta aberta divulgada nesta terça-feira (5), 24 jogadoras da seleção feminina da Venezuela acusam o técnico Kenneth Zseremeta, que dirigiu a equipe em diferentes categorias entre 2008 e 2017, por “abusos físicos, psicológicos e sexuais”.
Segundo o relato, assinado por Deyna Castellanos, Lourdes Moreno, Gabriela García, entre outras, há ao menos um caso de abuso sexual.
“Ano passado (2020), uma de nossas companheiras nos confessou que havia sido abusada sexualmente desde os 14 anos (2014) pelo treinador Kenneth Zseremeta. Este abuso durou até que ele foi despedido. Seu cúmplice em todo isso foi Williams Pino. Esta foi uma notícia que para todas nós foi muito difícil de assimilar, já que muitas de nós nos sentimos culpadas por ter estado tão perto de tudo isso e não termos nos dado conta de algo tão grave e punível. Ao mesmo tempo, a confissão não nos surpreendeu, pois esse era o tipo de ambiente que o treinador cultivava dia a dia”, diz parte do comunicado.
Além disso, as atletas homossexuais também eram questionadas pelo treinador.
“As jogadoras da comunidade LGTBI eram constantemente questionadas por sua orientação sexual e o assédio às jogadoras heterossexuais era constante”, completa o relato. “As insinuações sexuais era temas do dia a dia assim como os comentários até o atrativo físico de muitas de nossas jogadoras”, continua a nota
Ao fim, as atletas dizem que, “como jogadoras, não nos calaremos mais, no entanto sabemos que precisamos de apoio de todas essas instituições para proteger às jogadoras de futebol a nível global, e criar uma cultura onde podemos estar a salvo”.
Com o pedido de respeito à privacidade, as jogadoras que afirmam ter sido vítimas do técnico disseram que não falarão mais sobre o caso.
Zserementa dirigiu a seleção Sub-17 da Venezuela e classificou a equipe para três Copas do Mundo da categoria (2010, 2013 e 2016), conquistou o ouro nos Jogos da América Central e do Caribe (2010), além do segundo lugar nos Jogos Bolivarianos de 2009.
Leia a íntegra da carta
“Nós, as jogadoras da seleção venezuelana de diferentes processos, decidimos quebrar o silêncio para evitar que as situações de abuso e assédio físico, psicológico e sexual provocadas pelo técnico de futebol Kenneth Zserementa façam mais vítimas no futebol feminino e no mundo.
Desde 2013 até 207 surgiram numerosos casos ao redor da figura do treinador Zseremeta, os mais comuns eram abuso físico e psicológico durante os treinamentos, muitas de nós seguimos com traumas e feridas mentais que nos acompanham em nosso dia a dia.
Mesmo que soe como uma loucura para nós era normal que nosso treinador opinava, comentava e nos perguntava sobre nossa sexualidade intimidade, mesmo nós sendo menores de idade. Muitas destas situações eram apoiadas por membros da comissão técnica. Hoje entendemos que estas ações tinham a intenção de nos manipular e nos sentir culpadas. As jogadoras da comunidade LGBTQI+ eram constantemente questionadas por sua orientação sexual e o assédio as jogadoras heterossexuais era constante. Existiam ameaças e manipulações para dizer aos pais das jogadoras sobre sua orientação sexual elas não tivessem disciplina ou desempenho como deveriam. As insinuações sexuais eram temas do dia a dia bem como os comentários sobre a atratividade física de muitos de nossos jogadores.
Muita gente poderia pensar o porquê nos demoramos tanto para dizer isto [denúncia], não foi nada fácil para nós este processo, mas atualmente temos entendido que como vítimas de abuso é importante levantar a voz, por defender a honra de nossa companheira e para que uma pessoa assim jamais tenha o poder de fazer este dano a outra menina ou mulher.
Nós pedimos respeito à nossa privacidade, não vamos fazer mais comentários a respeito deste tema. Saber que a maioria de nós esteve desde os 13-14 anos pensando que um manipulador era a pessoa que queria nos “ajudar” em nossas carreiras foi um golpe muito forte
Nossa companheira hoje está em um melhor lugar mental e fisicamente, apesar de todo o trauma que esta pessoa [ex-treinador] causou em sua vida, ela buscou a ajuda necessária para poder seguir a sua vida da melhor maneira, sendo uma sobrevivente de um monstro que não só abusava dela sexualmente. Emocionalmente vivia um constante assedio em que ela preferia não ser mais convocada e Zserementa a visitava na casa de seus pais para os manipular, aproveitando das dificuldades financeiras dela e da sua família. Estar na seleção se converteu no sustento da sua casa em muitas ocasiões. Isso durou muitos anos.
Hoje sabemos que todos os nossos êxitos foram graças ao nosso talento, esforço e perseverança, bem como todos aqueles que virão com diferentes treinadores. Hoje estamos mais unidas que nunca aceitando as feridas que ele nos deixou no passado e abraçando um presente melhor”
Crédito imagem: Reprodução
Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo