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Lesões no esporte profissional – a jurisprudência trabalhista sobre o seguro desportivo obrigatório

Por Danielle Maiolini[1] e Leila Barreto[2]

INTRODUÇÃO

Ao contrário do que pode parecer, a prática esportiva de alto rendimento não é sinônimo de uma vida saudável, e atrai para o atleta profissional um altíssimo risco decorrente da exposição constante à ocorrência de lesões. Por esse motivo, a legislação especial que regulamenta a atividade (Lei 9.615/98) prevê a obrigatoriedade de contratação do seguro esportivo pelo clube empregador em benefício daqueles que defendem o seu escudo.

Nos termos do artigo 45 da Lei 9.615/98:

Art. 45. As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de vida e de acidentes pessoais, vinculado à atividade desportiva, para os atletas profissionais, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos. (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).

  • 1º A importância segurada deve garantir ao atleta profissional, ou ao beneficiário por ele indicado no contrato de seguro, o direito a indenização mínima correspondente ao valor anual da remuneração pactuada. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).

  • 2º A entidade de prática desportiva é responsável pelas despesas médico-hospitalares e de medicamentos necessários ao restabelecimento do atleta enquanto a seguradora não fizer o pagamento da indenização a que se refere o § 1o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011).

Da norma, extraem-se alguns pontos importantes. Em primeiro lugar, a natureza do seguro e o objeto protegido por ele. Observa-se que a legislação é específica em exigir que a apólice seja vinculada à atividade esportiva, apta a cobrir os riscos aos quais estejam sujeitos os atletas profissionais no seu exercício.

Isso significa, a princípio, que o segurado deve receber o valor indenizatório na ocorrência de sinistros vinculados à atividade, quaisquer que sejam. O que inclui, tratando-se do esporte de alto rendimento, eminentemente lesões de natureza parcial e temporária. As ocorrências poderão variar de acordo com o esporte praticado, é claro. Entretanto, a cobertura deve garantir que, tratando-se de afastamento decorrente de lesão ou de outro acidente do trabalho, o segurado esteja respaldado.

Em seguida, a legislação traz à obrigação o valor mínimo de cobertura do seguro esportivo, cujo montante é calculado sobre a remuneração percebida pelo atleta. Assim, nos termos do parágrafo primeiro do artigo 45 da Lei 9.615/98, a importância segurada deve corresponder à uma remuneração anual do profissional, que corresponde a 13 salários.

O objetivo da regra é proporcionar ao praticante amparo financeiro quando este não puder, por algum período, utilizar o seu próprio corpo no exercício da profissão.

No esporte, a relação íntima entre o corpo e o serviço prestado atrai a dependência completa deste empregado da sua boa forma física. Uma lesão que acarreta perda parcial ou completa dessa capacidade significa também a perda da fonte de sustento do trabalhador. Atrelado a este fato, observa-se que mais do que uma boa forma física, o alto rendimento exige que o atleta se mantenha em estado ótimo, de potencialidade máxima, o que demanda tempo para ser novamente alcançado após a ocorrência de quadro de lesão.

Assim, a contratação do seguro esportivo tem, também, o objetivo de garantir ao atleta estabilidade financeira para que esse respeite o período necessário de recuperação, a fim de evitar que o tratamento seja mal feito, ou feito de forma incompleta, pela urgência na retomada da prestação do serviço.

A altíssima competitividade do ambiente atrai certamente uma altíssima pressão sobre os praticantes esportivos, de modo a mitigar a completa autonomia que esses possam ter em relação à preservação da própria integridade física. Por isso, a instituição de mecanismos que protejam o corpo dos competidores é fundamental.

Como discorre Alessandra Pearce de Carvalho Monteiro[3]:

“Sobre a consciência, demonstramos que os atletas de alto rendimento por vezes não têm um discernimento necessário para tomarem suas decisões, seja porque não têm maturidade psicológica para realmente apreenderem as consequências dos riscos que assumem (como é o caso de atletas infanto-juvenis), seja porque não foram devidamente informados destes riscos. Já sobre a coação, muitos são os exemplos que sugerem que os atletas profissionais estão, por todos os lados, submetidos à forte pressão para excederem seus limites, ignorarem a dor e arriscarem sua integridade física. Portanto, deve-se questionar quão livre é a decisão de, por exemplo, competir lesionado ou sob o efeito de analgésicos”.

Inclusive, depoimentos de atletas colhidos pela mesma Autora[4] demonstram que, imersos em uma cultura de hipercompetitividade, os atletas, em busca da vitória, são levados a valorizar o autossacrifício, a rejeição aos limites e a negação da dor, o que aumenta ainda mais o risco aos quais estão expostos.

Alguns relatos versam no seguinte sentido:

“No esporte de alto rendimento você vai se lesionar. Uma hora vai ter tendinite no ombro porque é muito tempo num movimento só” (Atleta profissional de voleibol)

“É bem ruim [ficar longe de treinamento] porque a gente pensa que os outros estão treinando e você não. Você tenta voltar mais cedo e dói de novo. Dói mais”. (Atleta do basquetebol masculino).

“Eu achava que aquilo não poderia ser maior, a dor não poderia ser maior do que a minha vontade de fazer, né? Depois de 20 anos praticamente perdi o músculo posterior da coxa justamente por isso”. (Atleta do basquetebol feminino).

Nesse passo, ressalta-se a importância de comandos legais que limitem a disponibilidade que esses profissionais e aqueles que exploram a prestação do serviço possam ter sobre o corpo do trabalhador, de forma a impor mecanismos de proteção aptos a melhor preservar a qualidade de vida do atleta durante, e, principalmente, após a carreira em alto rendimento.

O descumprimento dessas regras atrai para o clube empregador o dever de, na ocorrência do acidente do trabalho, indenizar substitutivamente o atleta pela não contratação do seguro, no valor correspondente àquele que seria pago pela seguradora. Além disso, a violação do comando legal atrai a responsabilidade pelo pagamento das despesas médicas e hospitalares ao longo de todo o tratamento, nos termos do parágrafo segundo do artigo 45 supracitado.

Essa é, atualmente, a linha adotada pelos Tribunais Superiores no enfrentamento da matéria em diversas oportunidades, e que já possui jurisprudência consolidada, como será demonstrado a seguir.

  1. A JURISPRUDÊNCIA TRABALHISTA SOBRE O SEGURO ESPORTIVO OBRIGATÓRIO

EMBARGOS. ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL. “SEGURO DE ACIDENTES DE TRABALHO”. NÃO CONTRATAÇÃO. INDENIZAÇÃO. Nos termos do art. 45 da Lei nº 9.615/98, as entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de acidentes de trabalho para atletas profissionais a ela vinculados, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos. E, segundo o parágrafo primeiro, a importância segurada deve garantir direito a uma indenização mínima correspondente ao valor total anual da remuneração ajustada no caso dos atletas profissionais. À míngua de previsão de sanção específica para o caso de descumprimento da obrigação, resolve-se a controvérsia à luz da responsabilidade civil, nas formas dos arts. 186, 247 e 927 do Código Civil. Comprovados o dano e o nexo de causalidade – lesão física durante uma partida de futebol sem a oportunidade de acionar seguro ante a não celebração do contrato pela empregadora-, e sendo a atividade de risco, conforme o próprio art. 45 em exame já antecipa, resta patente a obrigação de indenizar. No tocante ao valor da indenização, o critério estabelecido pela lei – indenização mínima correspondente ao valor anual da remuneração ajustada no caso dos atletas profissionais – encontra razão de ser no virtual desamparo ao atleta profissional jogador de futebol que tenha a carreira parcial ou totalmente interrompida em virtude de acidente do trabalho. Embargos de que se conhece e a que se nega provimento.

PROCESSO Nº TST-E-ED-RR-168500-29.2006.5.01.0046

Embargante: Fluminense Football Club

Embargado: Thiago Pimentel Gosling

Ministro Relator: Márcio Eurico Vitral Amaro

Publicado em: 20/04/2017.

 

Em abril do corrente ano, a Subseção I Especializada em Dissídios Individuais a SDI-1 negou provimento a Embargos do Fluminense Football Club em face da decisão que condenou o clube ao pagamento de indenização no valor de R$600.000,00 (seiscentos mil reais) ao atleta Thiago Pimentel Gosling, por não ter contratado o seguro de acidente de trabalho previsto no artigo 45 da Lei nº 9.615/1998.

Para entender o caso: Thiago Gosling jogou na entidade desportiva entre 2005 e 2006. Em 2006, sofreu uma lesão enquanto disputava uma partida do Campeonato Brasileiro daquele ano. Além de lesionado, o atleta deixou de receber salários, ao passo que pediu a rescisão indireta do contrato e reivindicou o pagamento de indenização pela não contratação do seguro previsto em lei.

Na decisão, o Ministro Relator utilizou como base a Lei 9.615/1998, o Código Civil no tocante a responsabilidade civil e a Constituição Federal, expressamente no artigo 7º, inciso XXVII, que assegura ao trabalhador, seja urbano ou rural, o seguro contra acidente do trabalho. Destacando, inclusive, no seu voto que a Constituição, ao fazer isso, engloba também o atleta profissional de futebol, independente de previsão legal específica, como ocorre na Lei Desportiva atual.

Como sinal de reflexo da decisão proferida pela SDI1 e em consonância com o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, o TRT de Minas Gerais – TRT da 3ª Região, proferiu decisão em sede de Recurso Ordinário, conforme ementa:

ATLETA PROFISSIONAL. ESTABILIDADE

PROVISÓRIA. APLICAÇÃO DO ART. 118 DA LEI Nº 8.213/91. Aplica-se ao atleta profissional o disposto no art. 118 da Lei nº 8.213/91, pela remissão do art. 28, §4º, da Lei nº 9.615/98 (Lei Pelé). Com efeito, o seguro obrigatório previsto no art. 45 da referida Lei não constitui óbice à estabilidade provisória, porque esse seguro tem por escopo indenizar as despesas do atleta com os tratamentos de saúde, e não garantir o sustento do trabalhador um ano após o restabelecimento de sua capacidade laboral, conforme se depreende do § 2º do art. 45 da Lei Pelé. Com efeito, a norma previdenciária tem por finalidade garantir a manutenção do contrato de trabalho, após o acidente, para evitar que o empregador promova a dispensa em razão de o trabalhador, inclusive o atleta profissional, ter se tornado menos produtivo após o sinistro, sendo certo que o prazo da estabilidade provisória permite que o empregado se readapte ao trabalho, readquirindo potencial produtivo como era antes do acidente. Nessa linha de raciocínio, a norma previdenciária protege o trabalhador, visando a permanência da relação de emprego, permitindo a demonstração de que a eventual incapacidade oriunda do acidente não se traduziu em menor eficiência para o empreendimento, como a princípio poderia supor o empregador.

Processo Nº 0010397-90.2017.5.03.0139 (RO)

Recorrente: Antônio Francisco De Assis

Recorrido: América Futebol Clube

Relator(A): Luiz Otávio Linhares Renault

Na decisão, além de aplicar a indenização como forma de suprir a ausência de contratação do seguro obrigatório do atleta, o TRT/MG decidiu também pela estabilidade provisória, não sendo a referida estabilidade como forma de obstaculizar o pagamento dessa indenização. No entanto, para não fugir do tema, voltando ao seguro obrigatório, merece destaque um trecho da fundamentação empregada pelo Desembargador Relator:

Nesse diapasão, diferentemente do que sustenta o Reclamado, comungo do entendimento de que o seguro é compulsório, constituindo dever do empregador contratá-lo, nos termos da legislação acima citada, sendo objetiva a forma de responsabilidade dele decorrente, bastando a ocorrência do acidente para que nasça o direito à indenização, sendo despicienda a existência de culpa.

Tampouco entendo ser necessária a prova da invalidez, seja ela permanente ou não, total ou parcial. Ao estabelecer a obrigação de contratação de seguro a fim de minimizar os riscos da atividade, o legislador não restringiu às hipóteses de invalidez, já que os riscos que podem advir da atividade de um atleta são, com toda certeza, em rol bem mais extensivo.

No caso em apreço, o Autor sofreu lesão no joelho decorrente de acidente do trabalho típico, sendo necessária a submissão a tratamento médico e fisioterápico prolongado, inclusive com intervenção cirúrgica, como já analisado em tópico anterior.

Tal lesão enquadra-se perfeitamente no disposto no art. 45 da Lei nº 9.615/98, cuja indenização tem por objetivo minimizar os danos causados ao atleta, o que normalmente se traduz em prolongado tempo de tratamento e afastamento das atividades, como ocorreu na espécie, além do risco de não poder retornar à prática do futebol, sem falar nas desvalorizações e na redução de oportunidades de trabalho que podem advir da lesão.

Assim, ocorrido o dano e ausente o seguro, o Reclamado deve responder pela indenização correspondente àquela prevista no §1º do citado art. 45, no valor anual da remuneração pactuada, cujo total deve corresponder aos salários devidos multiplicados por treze, e não por doze, já que este é o número de salários recebidos anualmente pelo empregado, incluído o 13º salário. (grifo nosso)

O entendimento do desembargador relator converge diretamente com a decisão proferida pelo TST principalmente pelo fato de que, no voto, o relator pontuou e reforçou o entendimento de que se faz necessário reparar os custos causados pela lesão ou acidente e a imperiosa necessidade de analisar a obrigatoriedade da contratação do seguro conforme preceitua a Lei nº 9.615/1998 no intuito de proteger integralmente o atleta profissional de futebol e tornar a relação trabalhista mais equilibrada.

Não é diferente o entendimento do TRT da 4ª Região/Rio Grande do Sul, in verbis:

ACORDAM os Magistrados integrantes da 7ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO DA UNIÃO. Por unanimidade, DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR (GIOVANI) para: a) majorar a condenação à indenização substitutiva pela não contratação do seguro previsto no artigo 45 da Lei 9.615/98 para o valor equivalente a 12 remunerações mensais do autor, no valor total de R$ 48.000,00; b) acrescer à condenação honorários assistenciais de 15% do valor bruto da condenação. Valor da condenação acrescido em R$ 24.000,00. Custas adicionais de 480,00.

Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região

Processo nº 0021194-24.2015.5.04.0251 (RO)

Recorrente: Giovani Maia da Costa

Recorrido: Sociedade Esportiva Recreativa E Cultural Brasil

Relator: Wilson Carvalho Dias

 

No acórdão acima, publicado em 19/05/2017, o TRT da 4ª Região manteve a mesma linha de pensamento apresentada pelo Ministro Márcio Eurico, na SDI1, usando, inclusive, como base os requisitos da caracterização da responsabilidade civil.

Na ação, o atleta pleiteava o pagamento de indenização pela não contratação do seguro de vida e acidentes pessoais, uma vez que o clube empregador restou omisso.

Da decisão, merece destaque:

Com efeito, diversamente do Juízo de origem, entendo que o fato de o contrato de trabalho ter prazo determinado de 6 meses não afasta o direito do autor à indenização substitutiva na importância fixada no § 2ºdo artigoo acima transcrito, uma vez que tal dispositivo prevê expressamente que o atleta tem direito a uma indenização mínima correspondente ao valor anual da remuneração pactuada, sem qualquer ressalva ao período de duração do contrato de trabalho, o qual , no caso do atleta profissional, sempre terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a três meses nem superior a cinco anos, conforme estipulado no art. 30 da própria Lei 9.615/98. O seguro em questão objetiva cobrir os riscos a que está sujeito o atleta profissional, garantindo uma indenização pecuniária mínima que possibilite a recuperação plena em caso de lesão, levando-se em consideração as peculiaridades que envolvem o exercício da profissão, de modo que, sendo obrigação da ré a contratação do seguro e não tendo cumprido com tal obrigação, deve proceder ao pagamento integral da indenização mínima prevista no § 2º, do art. 45 da Lei 9.615/98, correspondente ao valor anual da remuneração pactuada entre as partes, em conformidade com os arts. 186 e 927 do CC.

[…]

Ante ao exposto, dou provimento ao recurso ordinário do autor para majorar a condenação à indenização substitutiva pela não contratação do seguro previsto no artigo 45 da Lei 9.615/98 para o valor equivalente a 12 remunerações mensais do autor, no valor total de R$ 48.000,00.

Como já exposto anteriormente, tal entendimento reforça a ideia de que a obrigatoriedade do seguro não existe por acaso na lei esportiva. O seguro existe com a finalidade principal de dar amparo ao atleta que, diante das funções e dos desgastes físicos, sofra qualquer acidente que impeça ou que limite a sua atuação no exercício da profissão por tempo certo ou indeterminado.

O seguro serve para ajudar no custeio dos gastos pessoais e de saúde na busca da recuperação da lesão ou acidente do trabalho, assim como na retomada do alto rendimento afetado.

O fato da Lei nº 9.615/1998 não prever punição expressa ao Clube pela ausência de contratação do seguro é o que ainda causa, indevidamente, uma certa celeuma jurídica nas decisões proferidas pelos Tribunais.

[…]

Não procede o pleito obreiro de indenização substitutiva relativa à ausência de contratação do seguro contra acidente do trabalho previsto no artigo 45 da Lei n.º 9.615/1998.

É certo que as entidades de prática desportiva estão obrigadas, segundo o referido dispositivo legal, a contratarem seguro de acidentes do trabalho para atletas profissionais a ela vinculados, cujo objetivo é cobrir as consequências de ordem financeira advindas de eventos danosos a eles relativos. Ocorre que a mesma Lei não estabelece qualquer sanção pecuniária ou indenização em caso de omissão do empregador no cumprimento dessa obrigação.

Além disso, no contrato de trabalho firmado entre as partes (ID d30b4bd) não foi inserida cláusula penal dispondo sobre eventual não contratação do mencionado seguro. Não bastasse, as provas constantes dos autos revelam que, apesar dos acidentes que vitimaram o reclamante, efetivamente o atleta não sofreu qualquer prejuízo financeiro, sem contar que se recuperou plenamente das lesões sofridas e que, posteriormente à rescisão contratual com o clube reclamado, exerceu a mesma função, como jogador de futebol para outras agremiações.

Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região

Processo Nº RO-0010479-83.2014.5.15.0013

Relator Fabio Grasselli

Recorrente Tiago Alves Fraga

Recorrido São Jose Esporte Clube

Publicado em: 13/07/2017.

ATLETA PROFISSIONAL. INDENIZAÇÃO SUBSTITUTIVA DO SEGURO PREVISTO NO ART. 45 DA LEI Nº 9.615/98.

As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de acidentes de trabalho para atletas profissionais a elas vinculados, objetivando cobrir os riscos a que se encontram sujeitos, conforme artigo 45 da Lei no. 9.615/98 (Lei Pelé). No caso dos autos, para além do aspecto relevante de que a legislação em questão não fixe qualquer sanção pecuniária para o ato omissivo do empregador quanto à mencionada obrigação de fazer, os elementos da prova não permitem concluir sequer pela caracterização do alegado acidente de trabalho, o que afasta a indenização perseguida pelo reclamante.

Processo nº:TRT-00045-2015-080-03-00-0-RO

Recorrente: Luiz Gustavo André De Sousa

Recorridos: Sociedade Esportiva Patrocinense Ltda.

Fábio De Paulo Dos Reis

Wanderley Eduardo

Publicado em: 24/01/2017.

 

EMENTA: ATLETA PROFISSIONAL. INDENIZAÇÃO

SUBSTITUTIVA DO SEGURO PREVISTO NO ART. 45 DA LEI Nº 9.615/98.

As entidades de prática desportiva são obrigadas a contratar seguro de vida e de acidentes pessoais para atletas profissionais a elas vinculados, objetivando cobrir os riscos a que se encontram sujeitos, conforme artigo 45 da Lei nº. 9.615/98. No entanto, em caso de omissão do empregador quanto à mencionada obrigação de fazer, não faz jus o empregado ao pagamento de indenização substitutiva do seguro se tampouco for demonstrada a ocorrência de qualquer acidente de trabalho por ele sofrido durante o contrato de trabalho firmado com a entidade empregadora, hipótese dos autos.

[…]

Não se nega que o artigo 45, §1º da Lei 9.615/98 prevêem a obrigatoriedade da contratação de um seguro de vida e de acidentes pessoais, para o atletas profissionais, com o objetivo de cobrir os riscos a que eles estão sujeitos.

Contudo, a Lei em comento não traz nenhuma sanção pecuniária decorrente da simples omissão do empregador quanto à mencionada obrigação de fazer. Na verdade, a partir de uma interpretação teleológica da norma, pode-se afirmar que o seu objetivo precípuo é cobrir eventual prejuízo causado ao atleta em decorrência de acidente sofrido, dando-lhe a cobertura necessária.

No entanto, os elementos constantes nos autos não dão notícia de qualquer acidente sofrido pelo reclamante durante a prestação de serviços para o segundo reclamado (Sertãozinho Esporte Clube). Pelo contrário, depreende-se que o reclamante participou apenas de duas partidas de futebol em nome do clube e que, ao pedir demissão, declarou de forma expressa que estava em perfeito estado de saúde como atleta de futebol.

Processo nº: TRT-01167-2013-048-03-00-4-RO

Recorrente: Peterson Pereira

Recorridos: Araxá Esporte Clube

Sertãozinho Futebol Clube

Associação Esportiva De Ituiutaba

Publicado Em: 24/01/2017.

 

Quando proferidas em desacordo com a jurisprudência já consolidada pelo C. TST, as decisões acima focam basicamente na ausência de previsão contratual para indenizações, alegando que como a Lei nº 9.615/1998 não traz sanção para o empregador que não realiza a contratação do seguro.

Entretanto, a utilização desse argumento não merece prosperar, uma vez que, conforme todo o conteúdo exposto no presente artigo, a aplicação da indenização tem um fundo social e protetor que não deve ser esquecido pelo Judiciário.

Assim, a ideia a ser reforçada é que o pagamento da indenização pela não contratação seja equivalente ao período da remuneração, como forma de coibir o descumprimento da lei por parte dos clubes e entidades de prática desportivas.

CONCLUSÃO

Conforme demonstrado, a altíssima exigência física que recai sobre os atletas profissionais no desempenho do esporte de rendimento é causadora do, também alto, índice de lesões decorrentes da atividade.

Certamente, todo trabalhador depende, em maior ou menor medida, das boas condições do próprio corpo para que esteja apto a exercer as funções para as quais fora contratado. Entretanto, no caso do esporte, a relação entre corpo e o trabalho é mais íntima, e o alcance da performance desejada faz com que a profissão seja reconhecidamente uma atividade de risco, cujos índices de acidentes do trabalho (lesões) comparam-se com outras atividades igualmente perigosas como a construção civil e a mineração.

Não por acaso, a duração da carreira deste empregado é exígua e, a depender da modalidade praticada, dificilmente ultrapassará os 40 anos. Por essa razão, há que existir por parte do ordenamento uma preocupação extra com a integridade física desse empregado.

Nas palavras de João Leal Amado[5]:

“A evolução registrada neste domínio ao longo das últimas décadas atesta de modo eloquente a indissociável ligação que aqui se observa entre laboralização e liberalização. Lentamente, o atleta profissional deixa de ser do clube e passa a estar no clube este deixa de ser proprietário daquele (como antes quase sucedia), passa a ser, tão só, empregador daquele; entre ambos, deixa de existir um vínculo dominial, passa a existir um contrato laboral. Afinal, se a principal função do Direito do Trabalho, de acordo com a clássica fórmula de Hugo Sinzheimer, consiste em ‘evitar que as pessoas sejam tratadas como coisas’, então talvez se possa dizer que a principal função do Direito do Trabalho Desportivo consiste, a um tempo, em preservar a promover a competição desportiva evitando que os respectivos praticantes sejam, também eles, tratados como coisas”.

Felizmente, conforme demonstrado, essa linha de preservação vem sendo adotada pelos Tribunais Superiores quando a matéria lhes é submetida, de modo a reforçar a responsabilidade que as entidades de prática esportiva possuem sobre a integridade física do atleta sob o seu poder de direção, sendo o seguro desportivo obrigatório um dos mecanismos legais criados com esse objetivo.

Ao desrespeitar o comando legal disposto no artigo 45 da Lei 9.615/98 (Lei Pelé), o clube atrai para si o dever de indenizar o empregado no valor correspondente àquele que seria pago pela seguradora na ocorrência do acidente, no importe de uma remuneração anual. Além disso, serão também de sua responsabilidade os custos de todo o tratamento até que o atleta esteja novamente apto para praticar o esporte em alto nível.

Ressaltamos que essas medidas, por si só, não são o suficiente para que o esporte deixe de ser uma bomba-relógio na vida daqueles que o tem como atividade laboral. Por isso, devem ser implementadas junto a outras, como a realização de exames periódicos, o fortalecimento muscular adequado e, principalmente, o respeito aos limites que o corpo humano inevitavelmente impõe.

Todas elas, em conjunto, têm o condão de proporcionar maior qualidade de vida e longevidade aos principais atores do espetáculo que o esporte representa.

[1] Advogada Esportiva e Procuradora do STJD do Futebol. Mestranda em Direito do Trabalho na Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-graduada em Direito do Trabalho pela Universidade de Coimbra.

[2] Advogada Esportiva e Auditora do TJD do Futebol de Sergipe. Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Pós-Graduanda em Direito Desportivo pela Universidade Cândido Mendes.

[3] Monteiro, Alessandra Pearce de Carvalho. Desporto e integridade física. In: Jónatas Machado. (Org.). Direitos humanos e ética no desporto. Coimbra: Coimbra editora, 2015, p. 152.

[4] Monteiro, Alessandra Pearce de Carvalho. Desporto e integridade física. In: Jónatas Machado. (Org.). Direitos humanos e ética no desporto. Coimbra: Coimbra editora, 2015, p. 142.

[5] AMADO, João Leal. Desporto Direito e Trabalho: uma Reflexão sobre a Especificidade do Contrato de Trabalho Desportivo. Direito do Trabalho Desportivo: os aspectos jurídicos da Lei Pelé frente às alterações da Lei n. 12.395/2011. São Paulo: LTr, 2013.

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