A liberdade de expressão é um dos pilares da democracia e está assegurada pela Constituição Federal de 1988. No entanto, no contexto do futebol, essa prerrogativa encontra limites, especialmente quando confrontada com regulamentos internos dos clubes e normas de segurança nos estádios.
Embora os estádios de futebol sejam espaços de grande exposição midiática e de livre circulação de ideias, eles também possuem administração privada. Isso significa que os clubes, como gestores dos eventos, têm autonomia para estabelecer regras de conduta, desde que não afrontem direitos fundamentais.
O artigo 5º, inciso IV, da Constituição Federal estabelece que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. Além disso, o inciso IX do mesmo artigo garante que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Os dispositivos deixam claro que qualquer tentativa de censura é incompatível com o Estado Democrático de Direito.
Não é difícil lembrarmos de casos em que torcidas organizadas e torcedores ‘comuns’ tiveram faixas e cartazes censurados por clubes sob o argumento de evitar polêmicas políticas ou manter a segurança do evento.
Em outros episódios, torcedores foram impedidos de se manifestar contra dirigentes ou contra decisões administrativas dos clubes. No entanto, essas restrições só são justificáveis se baseadas em regras internas que visem à segurança e ao bem-estar do público, e não simplesmente como forma de reprimir protestos.
“A liberdade de expressão é um direito fundamental, resguardada pela Constituição Federal. Sendo assim, os clubes não podem praticar atos ilícitos visando cercear a liberdade de expressão de sua torcida. Inclusive, os torcedores podem pedir indenização na Justiça Comum”, afirma o advogado Paulo Feuz, especialista em direito desportivo.
Recentemente, torcedores do Botafogo se envolveram em uma confusão com policiais militares e seguranças do Nilton Santos durante a derrota do clube por 2 a 0 para o Racing, pela Recopa Sul-Americana.
“Planejamento de m..!” e “Dois meses sem técnico!” eram as mensagens exibidas pelo grupo no Setor Leste, onde ficam as torcidas organizadas do Botafogo. Poucos minutos depois que as faixas foram mostradas, os seguranças abordaram os torcedores. A tentativa de coibir o protesto gerou confusão. Houve troca de socos e empurrões, e as faixas acabaram rasgadas.
Em entrevista coletiva, o dono da SAF do Botafogo, John Textor, assegurou que não houve ordem da diretoria para reprimir os protestos dos torcedores.
“Eu não sabia desses protestos, não vi as faixas. Vou falar com os nossos seguranças para assegurar que eles não suprimam fisicamente esse tipo de faixa e de protesto. Estou bem chocado com alguns protestos, porque são muito pessoais. Acho, realmente, patético que eu esteja recebendo mensagens de ódio. E estou. Há uma porcentagem de todos nós na humanidade que fica emocionado, fica extrema. Mas isso não me afeta, eu não me importo. Eu me importo com as pessoas. Fizemos coisas boas para esse clube, confio nisso. Não quero suprimir essa emoção, mas é uma via de mão dupla”, disse o empresário norte-americano em entrevista coletiva.
“Dado o ambiente de grande aglomeração e emoções intensas, é razoável que a entidade fornecedora do evento adote medidas para se eximir de responsabilidade por eventuais danos, desde que cumpra seu dever de orientação e prevenção de riscos. Caso conflitos extrapolem e resultem em prejuízos, pode-se discutir a responsabilidade da entidade promotora do evento. Além disso, atos de agressão, ameaças ou violência por parte de dirigentes, colaboradores ou torcedores devem ser tratados na esfera criminal”, diz Claudio Ganda, advogado especializado em direitos humanos.
Apesar de previsto na Constituição, a liberdade de expressão não é absoluta. O próprio ordenamento traz freios necessários. O inciso X do mesmo artigo protege a honra e a imagem das pessoas, e o inciso XLVII proíbe incitação à violência ou discursos de ódio. Assim, manifestações que ultrapassem esses limites podem ser restringidas.
“O reconhecimento de limites à liberdade de expressão em situações específicas, como a do discurso de incitação ao ódio, pornografia e financiamento de campanhas eleitorais e crimes previstos pelo ordenamento jurídico são os freios legais”, explica o jornalista, advogado e colunista Andrei Kampff.
Por fim, Andrei entende que “o debate, do discurso, da mediação dos contentamentos e descontentamentos em direção à construção de um senso comum (para um bem comum) e a crítica pública (espaço por excelência da política) não deveriam ser uma afronta, mas manifestações legítimas de desconforto”.
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