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“Mas afinal, para que serve um contrato de licenciamento de imagem para um atleta?”

Por Higor Maffei Bellini

O presente texto nasceu de uma reflexão que fiz a pouco sobre uma possível e hipotética postura de um clube de futebol, que possuindo duas equipes uma masculina e outra feminina, argumentando sobre uma imaginária situação em que precisa se explicar sobre um pedido de reparação de danos morais e materiais, mas, para uma questão que veio de uma ação proposta por uma integrante de sua equipe feminina, ou seja, uma integrante do departamento de futebol, que não deveria ser dividido, como na prática acaba acontecendo entre departamento de futebol masculino e departamento de futebol feminino.

Essa divisão administrativa acaba por causar muito mais gastos aos clubes, que acabam tendo dois profissionais para realizar basicamente as mesmas tarefas. Contudo, por estarem vinculados a departamentos distintos, não conseguem otimizar os recursos que os clubes oferecem. Um exemplo disso é quando as duas equipes viajam para a mesma cidade para enfrentar o mesmo adversário, ou não, no mesmo dia, mas uma vai de ônibus e a outra de avião, uma fica em um hotel e a outra em outro, tudo com a inválida argumentação de que quem escolhe é o organizador da competição, que pode ser a mesma entidade.

Mas retomando a nossa viagem imaginária, sobre essa situação meramente hipotética, posto que, não vou nesse texto, mais uma vez, discutir sobre a diferença de tratamento que homens e mulheres recebem no meio esportivo.

O pedido se deu pelo fato de o clube ter usado a imagem de uma atleta, para campanhas institucionais, aquelas destinadas a valorizar o nome do clube, trazendo a torcida para perto, ou abrando as comemorações de alguma data comemorativa, bem como as publicitárias onde o objetivo pode ser a venda de camisas, de cotas de publicidade ou apenas divulgar o nome ou o produto do patrocinador. E para contestar o pedido seja alegado que não havia dano a ser reparado, pois era direito, do clube, usar a imagem de sua empregada e que ela nem era tão conhecida, trazendo de novo a argumentação sobre as razões das atletas receberem menos, pela publicidade realizada utilizando a sua imagem.

Assim sendo admitido, apenas para argumentar, nesse caso, que não seria necessário pagar para usar a imagem da atleta, pois seria inerente ao contrato de trabalho permitir-se fotografar em campanhas do empregador. Mesmo que a justiça do trabalho já possua um posicionamento majoritariamente contrário a esse entendimento, qual é então a razão para celebrar um contrato de licenciamento de imagem com os atletas? Se o clube afirma que isso é uma possibilidade trabalhista, por que faz o contrato com a equipe masculina? Seria apenas para pagar menos encargos na folha de pagamento?

Um exemplo do que eu disse do posicionamento da justiça do trabalho, sobre o uso de imagem do empregado, para divulgar anúncios, em casos não envolvendo o futebol e como já fui criticado por quase só usar precedentes da justiça bandeirante, desta vez trago um da justiça carioca:

PROCESSO nº 0100849-37.2016.5.01.0431 (RO)

RECORRENTE: GILBERT RIBEIRO

RECORRIDO: VIA VAREJO S/A

RELATOR: LEONARDO DIAS BORGES

EMENTA

DANO À IMAGEM. USO DE CAMISETAS PROMOCIONAIS.

O dano à imagem deve ser visto como a repercussão social do dano que fora tornado público e que, de forma reflexa, foi suportado pela vítima. Destarte, podemos refletir como sendo o aspecto objetivo do dano que, de uma forma ou de outra, repercutiu para toda uma coletividade. A Constituição, ao prever a reparabilidade do dano à imagem, o faz logo após assegurar a liberdade de expressão (art. 5º, IV da CF), restando nítida a coerência do texto constitucional. Ao estabelecer que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” e logo em seguida assegurar, conforme já mencionado, “direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, a Constituição claramente fez referência a uma relação de causa e efeito. Ora, direito de resposta e indenização, no tocante ao inciso V, pressupõem uma pretérita manifestação de pensamento. Assim, podemos concluir que nossa Constituição Cidadã garantiu o direito à indenização por dano à imagem como sendo um consectário da livre manifestação de pensamento mal utilizada, ou seja, geradora de consequências nefastas para aquele que fora alvo de tal manifestação. Assim, entendo que é cabível a indenização por dano em caso de uso da imagem do empregado para fins lucrativos.

Como os atletas, via de regra, utilizam uniforme com a estampa dos patrocinadores dos clubes, poderia se fazer o mesmo raciocínio, para aqueles que são empregados dos clubes e despenham as suas funções dentro dos campos, quadras, piscinas ou tatames, e pedir o pagamento de uma indenização por dano moral, pelo uso indevido da imagem, e dano material, pela perda da chance do atleta vender a sua imagem para o clube, a utilizar como vitrine para o patrocinador.

Tenho certeza de que a diferença de tratamento entre as equipes masculinas e femininas, oferecendo aos homens o contrato de licenciamento de imagem, pelo qual uma boa parte da remuneração ganha a natureza de pagamento civil, impedindo os reflexos de praxe (recolhimento de FGTS, férias, décimo terceiro, dentre outros), enquanto para a equipe feminina nada além do salário é ofertado, não veio de uma gestão de gênero. Até porque a Constituição Federal determina que homens e mulheres devem ser tratados igualmente, o que impossibilita esse tipo de distinção.

Mas talvez da percepção de que as atletas do feminino, por receberem baixa remuneração e por estrem a pouco tempo, recebendo os ventos do profissionalismo, não iriam se importar de serem utilizadas, pelos clubes como meio de vinculação da sua imagem ou de seus patrocinadores

Quem acompanha minhas entrevistas e textos sabe que defendo que o pagamento de licenciamento de imagem é feito apenas para que o clube tenha menos encargos, ao passo que retira direitos dos atletas quando não há comprovação da efetiva utilização da imagem do atleta em situações que vão além de dar entrevistas antes, no intervalo e após o jogo, ou nos treinos. Essas seriam as únicas ocasiões que poderiam ser consideradas uma escolha do atleta, já que o clube não deveria ter o poder de escolher quem vai falar. Há atletas que não gostam de dar entrevistas e outros que, se escalados, podem não lidar bem com as críticas e ter uma queda de desempenho.

Assim é necessária ainda que seja feita a seguinte consideração, sobre o tema utilização da imagem do atleta profissional, seja ele de futebol, seja ele de que esporte for, se não fosse necessária a previa autorização, do esportista, para a utilização da sua imagem, não haveria a necessidade da celebração de contratos de licenciamento de imagem, que representam, 40% da remuneração dos atletas, sobre os quais via de regra, não se tem a incidência de verbas trabalhistas e previdenciárias, pois dizem ser contratos de natureza civil.

Assim os clubes de futebol brasileiros precisam, decidir as razões pelas quais pagam, pelo licenciamento da imagem dos atletas, como um contrato apartado do contrato de trabalho, pois, se forem consideradas como corretas, as alegações de quem uma atleta, por ser empregada deve se submeter as ordens do clube e posar para campanhas publicitárias, apenas, por ser empregada, todos os contratos de licenciamento de imagem, firmados com os seus atletas masculinos, não teriam razão de ser posto que as imagens dos atletas, poderiam ser utilizadas, apenas com base no contrato de trabalho.

Observem que a questão, vai muito além do contrato de trabalho entre uma pessoa e um clube, mas, atinge toda a estrutura do futebol brasileiro, que atualmente reside em contratos milionários, infelizmente não é a realidade salarial, do futebol feminino, justamente, em razão dos clubes se furtarem do pagamento de encargos trabalhistas, fiscais e previdenciários, sobre 40% da remuneração do atleta.

Passa também pela possibilidade dos clubes, ao pagarem um preço fechado pela utilização da imagem dos seus empregados, pois todos e não penas, os atletas, que usem os uniformes com patrocínios, podem e devem receber pela cessão de sua imagem ao clube, não precisam negociar um valor pontual, para cada ação, podem informar na negociação de patrocínio, que os atletas podem ser utilizados, pelo patrocinador sem custos adicionais, já que eles venderam antecipadamente a imagem ao clube e este a pode ceder a terceiros.

Mas respondendo ao questionamento do título do texto o contrato de licenciamento de imagem, que os clubes, deveriam ofertar a todos os seus empregados, mesmo os que não são atletas, mas, que precisam usar o uniforme do clube, com logomarcas e seus patrocinadores, serve para:

i) Não serem processados, por qualquer um dos seus empregados, que tenham de usar o uniforme com a marca, seja em ambiente de trabalho, seja no deslocamento casa/trabalho, já que na rua as pessoas observarão a marca do patrocinador, também;

ii) Poderem utilizar seus empregados, não apenas os atletas, em campanhas publicitárias, sem terem de negociar a participação pontual dos atletas, nessas campanhas;

iii) Poderão ceder a imagem destas atletas aos seus patrocinadores, para ativações fora do contexto do esporte;

iv) E por último e não mesmo importante serve para o clube desonerar a sua folha de pagamento dos encargos trabalhistas e fiscais, que o salário de um empregado traz.

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