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Matando mosquitos com tiros de canhão

Atribui-se ao filósofo chinês Confúcio a frase “Não use um canhão para matar mosquitos”. Referida expressão é uma clara advertência sobre os malefícios em utilizar meios desproporcionais para resolvermos nossos problemas.

Infelizmente esqueceram deste provérbio na edição da Lei 14.117/2020, que extinguiu as principais fontes de receita das duas mais importantes entidades sindicais de atletas profissionais do país: a Federação das Associações de Atletas Profissionais (Faap) e a Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol (Fenapaf).

A nova lei revogou o artigo 57 da Lei Pelé, que previa o repasse às referidas entidades, de percentuais de valores de transferências nacionais e internacionais. Vale destacar que, diferentemente do que a maioria pensa, os recursos não eram destinados propriamente aos sindicatos, mas para a gama de profissionais do futebol que vive em situação de penúria.

Com efeito, o finado art. 57 previa que tais recursos eram destinados para a “assistência social e educacional aos atletas profissionais, aos ex-atletas e aos atletas em formação” .

A norma revogada nada mais fazia do que dar efetividade ao princípio constitucional da solidariedade, o qual demanda de todos a sua participação para auxiliar no socorro aos menos afortunados.

Com tais recursos, esse rol de beneficiários tinha acesso a tratamento médico, bolsas de estudos, auxílios saúde, alimentação, funeral e assistência para que eles pudessem contribuir para a previdência social, dentre outras benesses.

A bem da verdade, o que está por detrás da revogação dessa norma é o sentimento em voga de que sindicatos são comandados de forma pouco transparente, ineficiente ou desonesta.

Se esse é o problema, resta evidente que existiam armas muito menos potentes que poderiam resolver a questão. De fato, poderiam ser criados mecanismos de controle e transparência, a fim de zelar com que o dinheiro chegasse ao seu legítimo destinatário.

Entretanto, lamentavelmente utilizaram um tiro de canhão para matar um mosquito. Feriram gravemente as entidades sindicais mais importantes dos atletas e com elas levaram junto um incontável número de pessoas hipossuficientes que serão prejudicadas com esse desatino.

É inacreditável que uma lei que trará tantos malefícios aos mais necessitados tenha passado incólume, sem que houvesse uma gritaria geral da categoria e tenha contado com discretíssima repercussão na mídia.

Da mesma forma, não dá para acreditar muito que o autor do provérbio que citamos tenha sido mesmo o célebre Confúcio. A pólvora só foi inventada na China, durante a dinastia Han, que durou de 206 a.C. até 220 d.C, sendo que apenas no final do século XIII depois de Cristo é que ela foi utilizada em canhões.  Ocorre que Confúcio viveu de 551 a.C. a 479 a.C…

Mas ninguém está muito preocupado em apurar o verdadeiro autor da frase, como tampouco em saber quem realmente irá perder com a revogação de tantos benefícios. Talvez seja porque se tratem daqueles chamados “invisíveis sociais”.

Daqueles que não têm voz.

Daqueles que não sabem sequer que tinham esses direitos.

Daqueles que são frágeis, tão frágeis como um simples e indefeso mosquito.

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