Contrato de trabalho com menor de idade é coisa séria. Em qualquer área. No futebol, ainda mais.
Nosso talento tem sido vigiado cada vez mais cedo. E a legislação brasileira precisa acompanhar esse movimento.
Não é só aqui. Na Europa, isso também tem sido problema. Lá existem regras para contratos de formação que são diferentes das regras brasileiras. Tanto na esfera esportiva quanto na estatal. A diferença é que lá quem tenta driblar os freios da lei é pego e punido.
Foi o que aconteceu com o poderoso Chelsea. Você vai entender a legislação, aqui e por lá, e o que aconteceu com o clube inglês, na reportagem de Zeca Cardoso para o Lei em Campo.
O clube inglês Chelsea está impedido de contratar jogadores nas próximas duas janelas de transferências. Novos jogadores não poderão integrar o plantel dos Blues no verão europeu (julho) e também em janeiro de 2020.
A punição imposta pela FIFA tem como motivo a contratação de jogadores menores de 18 anos. A regulamentação da entidade máxima do futebol não permite que clubes efetuem pagamento para a transferência de um menor de idade. E os ingleses teriam violado essas regras. O advogado Luís Marcondes relata o que diz o artigo 19 do Regulamento de Status de Transferência da FIFA:
“Ele dispõe que menores de 18 anos não podem jogar fora do seu país de origem. Mas inclui algumas exceções, como os pais mudarem de país por motivos alheios ao futebol; na comunidade europeia, atletas entre 16 e 18 podem ser liberados dentro de alguns requisitos relacionado à educação e ao bem-estar social; e se o jovem morar a 50 km da fronteira e entre o clube e o jogador existirem 100 km de distância”.
Com a aproximação do final da temporada e a busca por reforços para o próximo ciclo, a única alternativa para o Chelsea é a Corte Arbitral do Esporte (CAS), na Suíça. Como explica o advogado Rafael Cobra: “A possibilidade de reverter essa decisão é no CAS. Lá os ingleses podem conseguir uma suspensão da punição até a análise do mérito do recurso”.
A situação do clube londrino é parecida com a do Real Madrid, que em 2017 foi punido pela FIFA por violar o artigo 19, referente à contratação de menores de idade, e obteve uma diminuição da pena na Corte Arbitral. O Barcelona, em 2014, conseguiu uma suspensão no CAS, mas, após o julgamento do recurso, ficou proibido de contratar e inscrever jogadores na janela de inverno da temporada 2014/2015. O Atlético de Madrid já sofreu a mesma punição, também em 2017, como o seu principal rival, mas não conseguiu reverter a pena.
O Chelsea está impedido de contratar na próxima janela (julho a agosto) e também em janeiro do ano que vem, além de pagar uma multa de cerca de R$ 2 milhões. Tudo por conta de 29 atletas que teriam ingressado no clube de forma irregular.
No Brasil, a Lei Pelé, que trata da legislação desportiva, visa uma proteção maior ao clube, mas que pode gerar um conflito com o regulamento da FIFA. “Aqui o jogador só pode assinar um contrato de trabalho a partir dos 16 anos. A Lei Pelé diz que o período pode ser de três meses a cinco anos. Mas existindo interesse de um clube estrangeiro, prevalece a regulamentação da FIFA, ou seja, só valerão os primeiros três anos do contrato”, explica Cobra.
O ponto de divergência com a FIFA pode ser exatamente por esse tempo de contrato. “A FIFA não estabelece um patamar mínimo de idade. Ela só coloca uma regra para que atletas menores de 18 anos não possam celebrar um contrato maior de três anos. A legislação prevalece em cada país”, esclarece Rafael Cobra.
Existe outra formação de um jovem jogador firmar contrato com um clube de futebol. Como conta a advogada trabalhista Luciane Adam: “No caso do esporte, ele pode assinar contrato profissional a partir dos 16 anos, mas, dos 14 anos em diante, pode assinar um contrato de atleta em formação”, detalha.
As normas estabelecidas pela FIFA visam proteger o menor de idade. E é o mesmo que ocorre na legislação brasileira, por meio da Consolidação da Leis Trabalhistas (CLT). “Existe um arcabouço de normas no Brasil que são sempre do interesse do mais fraco. E o menor, no país, é visto como o mais fraco”, conta Luciane Adam.