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Na Alemanha, protagonistas do futebol fogem do padrão e atacam preconceito

De um absurdo, uma resposta coletiva que pode servir de exemplo para o combate ao preconceito. Se um dos maiores problemas no esporte na luta contra racismo, homofobia, misoginia e xenofobia está no silêncio dos próprios protagonistas, nesse fim de semana eles falaram. E agiram

Aconteceu no futebol alemão. Um resumo. O jogo entre Hoffenheim e Bayern de Munique estava um passeio para os bávaros: 6 a 0. Mas o novo espetáculo nessa temporada do time de Hans Flick acabou ficando de lado, depois que mais uma manifestação preconceituosa invadiu um estádio de futebol.

No segundo tempo, faixas ofensivas da torcida do Bayern contra o dono do Hoffenheim, Dietmar Hopp, fizeram com que o jogo fosse paralisado duas vezes.

Aos 22 minutos do segundo tempo torcedores do time bávaro levantaram uma faixa que dizia: “A DFB [Federação Alemã de Futebol] não mantém sua palavra e Hopp continua um filho da puta“.

O árbitro seguiu o novo protocolo da Fifa para atos preconceituosos, e parou o jogo aos 31 do segundo tempo, porque as faixas foram novamente mostradas. O jogo foi interrompido e os times foram para o túnel.

O fato provocou uma reação coletiva. Jogadores do Bayern foram até os torcedores, reclamando da faixa e pedindo que ela fosse retirada. Nas tribunas, Karl-Heinz Rummenigge, presidente do Bayern, abraçou Dietmar Hopp, mostrando solidariedade.

E a atitude mais importante, e que pode desencadear uma mudança no combate ao preconceito no esporte. Quando o jogo foi reiniciado, não houve mais disputa com objetivo de balançar as redes. Em outro sinal de apoio a vítima da agressão, os dois times apenas tocaram a bola de um lado para o outro por cerca de 15 minutos, sem alterar o placar de 6 a 0.

Entenda o contexto

O dono do Hoffenheim, Dietmar Hopp, vem sendo alvo de várias manifestações na Alemanha. E essas tem a ver com a uma regra que estabelece limites para investidores que estão no futebol.

A regra 50+1 foi instituída no futebol alemão em 1998. Ela determina que os clubes e suas divisões não devem ter 50% ou mais do poder decisório nas mãos de um único investidor. Mas ela estabelece também exceções, que seriam os investidores que possuíssem mais de 20 anos de parceria com os clubes antes de 1º de janeiro de 1999.

Em 2011, a regra ficou ainda mais flexível. Ela passou a determinar que qualquer investidor com mais de 20 anos de agremiação poderia ter mais de 49%, mesmo que os 20 anos se completassem depois de 1999.

Hopp foi um dos beneficiados, já que manda no Hoffenheim desde 1989. Atualmente, ele tem o controle acionário de 96% da agremiação.

Preconceito e futebol

As pessoas têm dificuldade em enxergar preconceito – lógico que aqui me refiro as pessoas que não são atingidas por ele. Por isso existe uma grande tendência das pessoas de diminuir, contemporizar, colocar na conta da “brincadeira’. Uma lição básica: preconceito existe quando atinge alguém que sofre com um determinado comportamento, que sente – e sofre – com a força de uma postura carregada de preconceito.

O caso foi contra um bilionário. E aí? O preconceito tem que ser combativo, quando é contra um investidor, um negro, um estrangeiro, um transexual.

E para combatê-lo no esporte é importante a legislação estatal, vontade do movimento esportivo, mas também o envolvimento dos personagens do jogo.

Na Alemanha insulto ou ofensa à honra e dignidade de uma pessoa em público é crime previsto em lei. Se for comprovado, pode resultar em multa e até um prisão.

O movimento esportivo esportivo também ataca o problema. O novo Código Disciplinar da FIFA, uma espécie de lei do futebol, aumentou o cerco do combate ao preconceito no futebol. Apesar de mais enxuto, ele está mais completo e moderno, e reforça uma preocupação necessária do movimento esportivo, o combate a todo tipo de preconceito.

Além disso, existe um protocolo que os árbitros devem seguir em caos de manifestações preconceituosas, o chamado “sistema de três passos”.

Primeiro, a partida deve ser interrompida para que seja feito um anúncio formal contra os atos racistas no sistema de som do estádio. Depois, se o problema persistir, o árbitro deve paralisar o jogo mais uma vez e solicitar um novo comunicado oficial. Por último, a recomendação é o cancelamento do jogo com a saída de todos de campo. O árbitro ainda poderá definir que a equipe infratora, cujos jogadores ou torcedores tenham cometido tais irregularidades, saia como perdedora

Movimento esportivo se posicionando, leis estatais, os protagonistas do jogo estão começando a se posicionar. Antes disso, tivemos o exemplo de Marega,

No Brasil, uma decisão do STF trouxe consequências para o esporte

Com a decisão do STF de usar a Lei do Racismo para punir crimes contra a homofobia, me parece lógico que a Justiça Desportiva irá mudar, punindo também atitudes homofóbicas no esporte nacional. O próprio presidente do STJD, Paulo Cesar Salomão Filho, em bela palestra da Brasil Futebol Expo, se manifestou dizendo que o futebol tem que evoluir com a sociedade e não pode permitir a segregação e o preconceito.

Esse postura, com a decisão do Supremo e o novo Código Disciplinar da Fifa, dão caminhos legais para a Justiça Desportiva punir o absurdo por aqui. Pelo mundo, também existem caminhos.

Mas é sempre necessário entender que mais importante do que punir é conscientizar. E os personagens do esporte têm papel fundamental nesse momento. O silêncio compactua com o absurdo.

Os protagonistas do futebol estão vencendo o silêncio, e estão agindo. Que o exemplo dado na Alemanha não se restrinja a proteger apenas um bilionário que investe no jogo, mas também para combater todo tipo de preconceito no futebol, como racismo, homofobia, misoginia e xenofobia.

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