A queda de braço entre Athetico Paranaense e Santos contra a CBF continua. Renan Lodi, do Athletico, e Rodrygo, do Santos, foram convocados para a seleção olímpica para a disputa do Torneio de Toulon, na França. Os dois clubes pediram a liberação dos jogadores, mas, mesmo sem a apresentação deles para a disputa do torneio, a CBF não os desconvocou. Com medo de serem punidas, as duas equipes resolveram não utilizar os jogadores.
“O jogador sendo convocado em data FIFA, ou em competição oficial, o clube é obrigado a ceder o atleta. A questão nesse caso é a dúvida na interpretação se a data FIFA vale só para a seleção principal ou se vale para as outras seleções. O Regulamento de Status e Transferência da FIFA não é expresso em afirmar se é só a seleção principal. Ele dá margem a interpretar que é qualquer seleção, o que incluiria as seleções de base. Se houver a interpretação de que a data FIFA também vale para essa seleção olímpica, os atletas estariam atuando de maneira irregular. E aí vale o artigo 214 do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, que pune os clubes com a perda de pontos. Seria exatamente a mesma punição que houve no caso do Héverton. Os clubes foram prudentes em não utilizar os jogadores”, explica Rafael Cobra, advogado especializado em direito esportivo.
Em 8 de dezembro de 2013, última rodada do Campeonato Brasileiro, a Portuguesa mandou a campo o meia Héverton. Só que ele havia sido suspenso pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) dois dias antes. A escalação irregular resultou em perda de quatro pontos e foi determinante para o rebaixamento da Portuguesa para a Série B naquele ano.
“O Santos e o Athletico têm razão em não liberar os atletas para o Torneio de Toulon porque não era data FIFA, então não tinha obrigatoriedade. Se você pegar o Regulamento Geral de Competições, o Regulamento da FIFA, a Lei Pelé, vai concluir que os clubes não têm a obrigatoriedade de liberar em jogos não oficiais da seleção principal”, pontua o advogado Alexandre Miranda, especializado em direito esportivo.
Para tentar utilizar os jogadores, Athletico e Santos recorreram ao STJD. Mas o órgão indeferiu o pedido, frustrando os dois clubes. O indeferimento ocorreu após recebimento da manifestação da CBF sobre o caso. De acordo com ofício enviado pela entidade, não compete ao STJD convocar ou desconvocar atletas.
“O artigo 217 do CBJD fala que se o clube ordenar ao atleta que não atenda a convocação feita pela CBF para uma competição oficial ou amistosa, ou que ele se omita, vai gerar uma multa. Ao passo que, se ele estiver convocado, aí tem uma discussão se ele estaria ou não na condição de atleta irregular. Aí é o artigo 214. O Héverton estava suspenso e jogou. É um outro caso. Há risco de perder os pontos que você ganhou naquele jogo, mais os pontos de uma vitória. Acho temerário comparar com o ‘caso Hevérton’. Não tem nada a ver, o fato gerador é diferente. Aqui é caso de convocação, lá era suspensão, a Portuguesa sabia da suspensão”, continua Alexandre Miranda.
O problema é que, com essa decisão, o Santos não pôde contar com Rodrygo na Copa do Brasil, e o time foi eliminado da competição. Com apenas mais dois jogos antes da parada para a Copa América, Rodrygo não deverá vestir mais a camisa do Santos, por já estar vendido para o Real Madrid. O mesmo pode acontecer com Renan Lodi, sobre quem há interesse de clubes europeus. Os dois jogadores não teriam nem direito a fazer um jogo de despedida.
Procurada pelo Lei em Campo, a CBF disse que “os jogadores não foram desconvocados”.
Se os clubes baterem de frente com a CBF, apostando que não serão punidos, e resolverem escalar os jogadores, o problema só estaria começando. O caso poderia ser levado para o STJD. Se punidos, os clubes perdem os pontos conquistados na partida, mais três pontos. Se empatarem com um jogador convocado, perderiam quatro pontos.
“Digamos que o clube colocasse o jogador para jogar, perdesse os pontos no STJD e, em razão disso, fosse rebaixado. Aí o clube recorre à Corte Arbitral do Esporte (CAS); o CAS demora para dar o resultado, e a decisão só sai no ano seguinte. Minha interpretação é que o CAS não manda voltar o clube para a divisão acima. Aí o caso seria trabalhado em indenização por perdas e danos (o valor da cota de televisão para quem cair para a Série B não será o valor). Mas é uma questão bem hipotética. Ninguém vai correr esse risco de escalar o jogador sem a permissão do STJD. Hipoteticamente acho que seria essa solução”, afirmou Cobra.
Em caso de rebaixamento por conta da perda de pontos, o clube que se sentir lesado pode buscar o CAS. E aí o imbróglio, para a CBF, seria de difícil resolução. Isso porque, se o clube rebaixado começar 2020 na Série B, pode embaralhar tanto a Série A quanto a Série B.
“Não há uma resposta sobre o que vai prevalecer. A Lei Pelé só fala que a CBF vai indenizar os clubes pelos atletas cedidos para a seleção por todos os encargos que o clube paga. O Regulamento Geral de Competições vai falar que prevalece o calendário de competições da CBF. Então, o Torneio de Toulon não prevalece sobre o Campeonato Brasileiro à luz do RGC. E o RSTP vai tratar sobre convocação. Tem todas essas variáveis no caso, é bem complexo mesmo. No CAS, o clube teria que ser alçado à primeira divisão e teria direito a reparação de danos morais, sim”, finalizou Alexandre.