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Por que Uefa não deveria permitir dois clubes da mesma empresa na Champions

O ano era 1980 e um fato inédito agitou o futebol espanhol. Na Espanha, os principais clubes como Atlético de Madrid, Real Madrid e Barcelona mantém uma segunda equipe, chamada Castilla, que são usadas para aprimorar o desempenho dos jovens jogadores. O regulamento do futebol no país, no entanto, impede que as equipes principais e reservas estejam, ao mesmo tempo, na mesma divisão. Porém, até 1991, na Copa do Rei, embora o confronto fosse improvável, não era proibido. E a campanha do Real Madrid Castilla naquela temporada foi transformada em sonho depois que o clube bateu Athletic de Bilbao, Sporting de Gijón e Real Sociedad, entre outros, e chegou à final, onde enfrentou a equipe principal do Real Madrid, que atropelou e levou o título após enfiar 6 x 1 no time B. Como o time A do Real Madrid ganhou o Espanhol e a Copa do Rei, do time herdou a vaga na Recopa. Foi a primeira vez na história que um clube teve dois representantes em competições europeias. Até a Red Bull entrar com tudo no esporte e eleger o futebol como um produto para alavancar o marketing da fabricante de bebidas energéticas.

Em 2018, RB Leipzig, da Alemanha, e Red Bull Salzburg, da Áustria, se enfrentaram pela Liga Europa. A Uefa proíbe que um mesmo dono tenha dois times na mesma competição. Isto está previsto no artigo 5 do regulamento da Liga dos Campeões, que trata sobre a integridade do torneio. “Nenhum clube participante nas competições interclubes da Uefa pode deter ou negociar títulos ou ações de outro clube participante na mesma competição”, determina a entidade.

Um ano antes do duelo, em 2017, os dois clubes entraram com representação na Uefa para tratar da questão e mostrar que a gestão dos clubes é separada. Segundo a avaliação do Órgão de Controle Financeiro de Clubes da Uefa (CFCB), não há violação do artigo 5 do regulamento da Uefa.

“Depois de investigação aprofundada e diversas mudanças importantes estruturais e de governança feitas pelos clubes (em relação a questões corporativas, financeiras, de pessoal, acordos de patrocínio), a CFCB considerou que nenhuma pessoa física ou jurídica tem mais uma influência decisiva em mais de um clube participando de competição de clubes da Uefa”, diz comunicado divulgado pela entidade. A Uefa afirmou que a CFCB continuará a monitorar os dois clubes para garantir que as regras de integridade são respeitadas. Mas não é o que pensam especialistas ouvidos pelo Lei em Campo.

Segundo a Uefa, enquanto a Red Bull é dona do Leipzig, a empresa austríaca apenas tem um contrato de patrocínio com os austríacos do RB Salzburg, e dona dos “naming rights” do estádio – RB Arena, exatamente o mesmo nome do estádio do Leipzig.

“A hipótese é péssima para uma competição pois coloca em xeque a sua higidez. Se ocorrer um confronto decisivo entre as duas equipes ou um resultado que beneficie uma e dependa do desempenho da outra, sempre haverá questionamento ou dúvida, o que é péssimo para os jogadores e a disputa”, explica o advogado especialista em direito esportivo Igor Serrano.

Nesta temporada, tanto RB Leipzig quanto RB Salzburg estão na fase de grupos da Liga dos Campeões. Embora seja improvável que eles se cruzem no mata-mata, já que a situação do Salzburg é complicada por estar em um grupo com Liverpool e Napoli, um duelo eliminatório poderia suscitar suspeitas de manipulação de resultados, com a Red Bull podendo “escolher” qual clube poderia avançar de fase.

“Em uma competição como a Champions, a manipulação de resultado é cada vez mais difícil de acontecer tendo em vista o alto nível dos atletas que compõem as equipes”, analisou o advogado Eduardo Carlezzo, especialista em direito esportivo.

Nos anos 90 e início dos anos 2000 o Brasil passou por algumas situações controversas, com fundos de investimento chegando e aportando dinheiro em mais de um clube no país. O caso mais emblemático neste sentido foi o da parceria da Parmalat com Palmeiras e Juventude. A fabricante de leites italiana manteve com os dois clubes uma parceria em sistema de co-gestão. A empresa não era dona dos clubes, mas arcava com as contratações, além de salários e escolhia em qual dos dois clubes um atleta iria jogar.

Neste período, Palmeiras e Juventude se enfrentaram diversas vezes pelo Campeonato Brasileiro, Copa do Brasil e até pela Libertadores, sem que nem a CBF nem a Conmebol tentassem intervir na atuação da Parmalat.

“A propriedade de mais de um clube que disputa a mesma competição não é algo desejável no futebol. Ainda que tais clubes elaborem arranjos societários que, documentalmente, inibam eventual influência cruzada, sempre poderá questionar-se se determinado resultado de campo ocorreu para beneficiar o outro clube. Pelo bem da integridade esportiva e para que polêmicas desnecessárias não surjam, deve haver uma restrição efetiva quanto ao controle de apenas um clube”, finalizou Carlezzo.

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