A Lei das Sociedades Anônimas do Futebol (14.193/21) pode passar por importantes mudanças futuramente. Isso porque um projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados altera trechos da legislação a fim de, entre outros pontos, aperfeiçoar a governança das SAFs.
Entre as mudanças sugeridas no PL 2.978/2023, de autoria do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), está a de permitir que ligas de futebol possam se organizar como SAF. Dessa forma, será estendido o tratamento conferido aos clubes também para as ligas de futebol.
“Toda lei boa pode ser atualizada para ficar ainda mais eficaz. A atualização da Lei das SAF’s é importante porque foi identificado a necessidade de um sistema jurídico para abrigar a formação Ligas, nos moldes da Sociedade Anônima do Futebol”, disse o advogado desportivo e senador Carlos Portinho (PL-RJ), responsável por sugerir essa emenda ao PL 2978/2023.
Segundo o senador, essa mudança viabilizaria a possibilidade de competições nacionais de futebol passarem a ser administradas por ligas organizadas pelos próprios clubes, reorganizando totalmente o futebol brasileiro.
“Hoje, as duas ligas que reúnem grandes times (Libra e Forte) têm estruturas jurídicas diferentes, o que atrapalha a realização de projetos em comum. A constituição de SAFs favoreceria a possibilidade de uma mudança na organização do Campeonato Brasileiro”, acrescentou Portinho.
O advogado Marcel Belfiore, especialista em direito desportivo, entende que, antes mesmo da promulgação de qualquer alteração da legislação nesse sentido, as Ligas já podiam – e ainda podem se assim quiserem – se constituir num modelo jurídico semelhante à SAF, que é a Sociedade Anônima (SA).
“Talvez o modelo associativo tradicional, no entanto, por alguma razão lhes era mais benéfico ou atraente. A SAF e SA tem um modelo jurídico bastante semelhante, até porque a primeira é inspirada na segunda, com adequações à especificidade do futebol. Essa alteração, portanto, poderia ser considerada desnecessária, a menos que o regime tributário da SAF, que é mais benéfico pro contribuinte do que o da SA, seja igualmente aplicável à ‘Liga SAF’”, avalia.
Outro ponto importante do PL é de ampliar os direitos de propriedade intelectual relacionados ao futebol para além da relação com terceiros. Neste caso, a SAF poderá explorar economicamente os direitos de marca licenciados ou transferidos pelo clube, não se restringindo somente aos jogadores.
Quanto à participação em outras sociedades, o PL elimina a restrição territorial e a vedação de participação em sociedade cujo objeto recaia na formação de atletas profissionais de futebol. Assim, a medida busca permitir a participação da SAF em sociedades estrangeiras, de modo que um clube possa expandir para o exterior suas atividades.
Governança
O PL prevê a independência de pelo menos um membro do conselho de administração e um membro do conselho fiscal, conforme estabelecido pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A medida busca se aproximar de normas de governança exigidas para companhias abertas e os mercados regulamentados de valores mobiliários, como bolsa e balcão.
Entre as formas de publicidade dos atos e informações relevantes aos investidores, torcedores e demais públicos, a proposição determina divulgar as atas de assembleia geral e demais reuniões que não conflitem com interesses da SAF ou sejam sigilosas, a composição acionária e o nome da pessoa jurídica que tenha participação igual ou superior a 5% do capital social.
O PL insere a previsão de distribuição de dividendo mínimo obrigatório, em cada exercício social, pelo menos 25% do lucro líquido ajustado, enquanto perdurar obrigações do clube ou da pessoa jurídica original anteriores às SAF. Essa iniciativa constava do antigo PL de 2019, que resultou na Lei da SAF, mas foi retirada do texto final durante a aprovação no Plenário.
Ações classe A
As ações classe A conferem direitos especiais, exclusivos ao clube ou pessoa jurídica original, intransmissíveis e irrenunciáveis, para preservação de aspectos relacionados à tradição e cultura esportiva (nome, signos, sede etc.). O PL prevê que o clube ou a pessoa jurídica original não poderá doar, ceder, trocar, dispor sob qualquer forma, transferir, vender ou alienar essas ações, salvo se convertidas em ações ordinárias comuns.
Na mesma linha, o texto também estabelece que a constituição da SAF não implica a formação de grupo econômico entre ela e o clube ou pessoa jurídica original que a constitui. Para Marcos Rogério, a intenção da legislação, ao segregar as obrigações entre clube e SAF, na medida em que a receita obtida com a exploração do futebol será usada para o adimplemento de obrigações antigas do clube, contribui para reduzir ruídos e divergências em decisões judiciais.
Regime Centralizado de Execuções
Quanto ao Regime Centralizado de Execuções (RCE), o PL estabelece que esse regime alcança exclusivamente clube ou pessoa jurídica original que tiver constituído SAF. A ideia é afastar o “efeito carona” que eventual associação poderia fazer jus, sem integrar o microssistema da lei. Em outras palavras, o benefício deve ser concedido ao clube ou à pessoa jurídica original que se submeteu às contrapartidas da lei.
O PL também pretende aprimorar a eficácia do RCE ao fixar parâmetros objetivos com relação ao fluxo de pagamento do regime. O texto também busca aprimorar a lei no que diz respeito ao conflito de regime existente entre o RCE e a legislação de recuperação e falências, estabelecendo que, caso o clube esteja em concurso de credores na modalidade do RCE e opte por pedir recuperação judicial, o RCE deverá ser extinto automaticamente. A ideia é trazer segurança jurídica, ao evitar a aplicação simultânea de dois regimes incompatíveis.
Tramitação
O PL 2.978/2023 recebeu relatório favorável do senador Marcos Rogério (PL-RO) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em maio do ano passado e desde então segue aguardando análise da Câmara dos Deputados.
Clique aqui e confira o PL. 2978/2023
Crédito imagem: VelhoJunior | Getty Images
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