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Punições inócuas? Pra que serve a Justiça Desportiva?

Dois casos nas últimas semanas trazem consigo grandes dúvidas sobre a efetividade das penas aplicadas. O primeiro deles, já discutido aqui, é a eliminação do ex-técnico da seleção brasileira de ginástica Fernando de Carvalho Lopes. Na decisão proferida pelo STJD da modalidade há, além da pena de eliminação, a imposição de multa no valor de R$ 1,6 milhão.

O outro caso que teve punição semelhante foi julgado na última semana e envolveu o ex-técnico das categorias de base da seleção brasileira de atletismo Luiz Antônio Lino. Também em virtude de denúncias de assédio sexual o técnico foi punido com a eliminação da modalidade, além de multa no valor de R$ 400 mil, apesar de nesse caso ainda haver possibilidade de alteração do resultado no julgamento de recurso.

Os dois casos trazem uma discussão que há muito tempo se faz necessária no âmbito da Justiça Desportiva brasileira: qual é a executabilidade das decisões dos Tribunais de Justiça Desportiva no Brasil. Em tese, a própria vinculação federativa e o interesse em permanecer na estrutura desportiva fazem com que os apenados cumpram as determinações dos tribunais. No entanto, casos como esses, nos quais a própria decisão prevê a desvinculação, trazem a necessidade de uma discussão mais ampla.

Sem a possibilidade de nova denúncia por descumprimento de decisão do Tribunal de Justiça Desportiva, com base no artigo 223 do CBJD, uma vez que, ao ser excluído da estrutura federativa, o apenado não mais é jurisdicionado do tribunal, resta única e exclusivamente garantir que a decisão original seja cumprida. Para isso, é fundamental que a decisão seja levada para execução judicial. No entanto, qual seria a natureza jurídica da decisão do STJD enquanto título executivo? Tendo natureza jurídica própria, a Justiça Desportiva nacional não pode ser considerada uma instância arbitral, tampouco é um tribunal administrativo, ainda que guarde semelhanças com ambos. Dessa forma, suas decisões não são decisões arbitrais ou administrativas.

Com isso, não podemos considerar as decisões da Justiça Desportiva, uma Justiça constitucionalmente estabelecida, como um título executivo judicial ou extrajudicial, uma vez que não está elencado no rol taxativo de títulos executivos do Código de Processo Civil. Sendo assim, levada ao Poder Judiciário para garantia de execução, a decisão da Justiça Desportiva nem sequer será considerada um título executivo, e deverá passar por todo o processo de conhecimento. Incluir a natureza executiva das decisões da Justiça Desportiva em lei específica poderia representar um avanço significativo da garantia de cumprimento de suas decisões.

Outro ponto crítico para isso é o fato de que não há qualquer previsão normativa sobre quem seria responsável por levar tal questionamento ao conhecimento do Poder Judiciário. Em uma análise extensiva do que dispõe o CBJD no artigo 21, que dispõe sobre as competências da Procuradoria da Justiça Desportiva, especialmente nos incisos III e V, que elencam que cabe à Procuradoria formalizar providências legais (III) e propor medidas que visem à preservação dos princípios que regem a Justiça Desportiva (V), podemos dizer que caberá à Procuradoria de cada Tribunal de Justiça Desportiva levar as decisões desses casos ao conhecimento do Poder Judiciário para garantir que sejam cumpridas.

No entanto, como já exposto, não há qualquer preocupação das normas jusdesportivas em garantir o cumprimento das decisões da Justiça Desportiva, o que enfraquece sobremaneira sua estrutura. É indispensável que o Poder Legislativo busque fortalecer uma instituição criada com bases constitucionais, dando-lhe legitimidade expressa e garantias de executabilidade. Para isso, os acadêmicos da área não podem se privar de discutir o tema e dessa forma oferecer subsídios para que o Legislativo possa cumprir sua missão com o maior embasamento possível. Não se pode “privilegiar” aqueles que são punidos por infrações gravíssimas (as que geralmente levam à eliminação) com uma estrutura que dificulta a eficácia da imposição do cumprimento de suas penas.

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