Rebelde sem causa (1955) é um filme que conta a estória de três jovens que estão sempre metidos em encrenca, com destaque para a vida de Jim Starck, interpretado pelo lendário ator James Dean.
Os personagens, que com frequência vão parar nas delegacias por suas infrações, aparentemente são rebeldes sem uma causa especial, uma vez que todos possuem excelente situação financeira.
Entretanto, tudo o que acontece na vida sempre decorre de uma causa que a produz. Aristóteles já dizia que “Sem causa não há coisa. Se a causa existe é que o efeito se produz. Se não existe a causa não haverá efeito.”
Para estudar as relações de causa e efeito surgiu a ciência. Ao que nos interessa, para a ciência do Direito identificar a causa é fundamental, porque é a partir dela que se saberá que tipos de efeitos jurídicos ela irá produzir.
Isto ocorre porque o legislador concebe hipóteses e prevê efeitos, caso elas se concretizem. Quando o assunto diz respeito à produção de danos, ele possui nome e sobrenome: chama-se Nexo Causal. O nexo causal é o vínculo fático que liga o efeito à causa, ou seja, é a comprovação de que determinado dano decorreu de um fato específico e determinado.
Em virtude do novo coronavírus, muitos contratantes estão se esquecendo deste fator: simplesmente alegam a existência da pandemia para não cumprirem com suas obrigações contratuais. Rebelam-se contra o cumprimento obrigatório dos contratos sem demonstrar objetivamente que o Covid-19 teria sido a causa do inadimplemento de seus compromissos.
Como adverte o parágrafo único do art. 393 do Código Civil, a força maior “verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”, devendo-se entender como fato necessário aquele que foi determinante para impedir o cumprimento do contrato.
Por isso não basta simplesmente invocar a força maior. Caberá ao devedor reunir os elementos necessários para evidenciar essa relação de causa e efeito, devendo responder comprovadamente à seguinte questão: Porque a Covid-19 tornou impossível o cumprimento da prestação no tempo, lugar e forma que o contrato estabeleceu?
“Em rebelde sem causa” o diretor da película até que consegue passar ao espectador o motivo do proceder de Jim e de seus amigos: todos possuem problemas familiares, baseados sobretudo na falta de carinho e atenção dos pais, que consideram que dotar seus filhos de boas condições materiais seria o suficiente.
Se no filme dá para fazer assim, no Direito as coisas são diferentes, pois como nos lembra o antigo brocardo latino “alegattio et nom probatio, nihil allegare” (alegar e não provar é o mesmo que nada alegar).
Note-se que o art. 421-A. do Código Civil adverte que “Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção”, ou seja, sem que esses elementos concretos apareçam, os contratos permanecem válidos e eficazes.
“Rebelde sem causa” brindou-nos com algo bem concreto: a indiferença da juventude com os problemas sociais vividos pelos EUA nos anos 50, que iam da discriminação racial às estúpidas mortes de americanos na guerra da Coréia.
Se a consciência social dos jovens da terra do Tio Sam mudou no século XXI, o Direito começou no terceiro milênio a enxergar os contratos de outra forma. Com efeito, ele passou a exigir que o contratante enxergue na outra parte não um adversário, mas um parceiro, que deve ser amparado e protegido, a fim de que este também atinja os propósitos almejados quando celebrou o ajuste.
Isto decorre do princípio da boa-fé objetiva, que traz para todos os contratos alguns deveres implícitos, dentre eles o dever de proteção, através do qual o patrimônio da outra parte deve ser tratado pelo contratante como se seu fosse.
Aliás, quem quer prejudicar o próximo acaba atentando contra si mesmo. Jim Starck e sua turma sentiram isso na pele. Ao quebrarem o pacto de respeito pelos seus pais e se insurgirem contra eles, os jovens rebeldes acabaram sendo punidos pela própria sociedade.
Alegar a Covid-19 como elemento de força maior de forma oportunista para se eximir do cumprimento de sua obrigação, prejudicando o outro contratante, além de ser ineficaz, é uma violação a um dever contratual, o que sujeita o devedor a sofrer sanções pelo seu comportamento.
Quem age assim não merece a menor consideração pelo ordenamento jurídico.
É considerado pelo Direito um mero insubordinado sem motivo.
Um verdadeiro rebelde sem causa.