Por Higor Maffei Bellini
Os clubes esportivos, mas, em especial, os de futebol, procuram manter departamentos médicos, quando não chamados de departamentos de saúde, para buscar, segundo as suas alegações, fornecer um melhor tratamento aos seus atletas, promovendo uma volta antecipada às competições, contando com médicos, fisioterapeutas, fisiologistas, equipamentos para a realização de exames e auxiliar na recuperação.
Pois bem, com os clubes se aparelhando de tal forma que parecem clínicas médicas, para atender os seus atletas. Deixando de lado o atendimento ao pessoal que trabalha na administração, na cozinha ou na segurança, que tem de buscar o tratamento junto aos convênios ou à rede pública. Existiram falhas na análise dos dados, provocando erros na análise dos dados, causando diagnósticos equivocados, os erros médicos.
Até mesmo porque todo ser humano uma hora irá falhar, pois somos todos passíveis de erros, mas o problema de um erro no diagnóstico de um médico vinculado a um clube é que este poderá causar uma aposentadoria precoce dos atletas, seja com um procedimento médico equivocado, seja com um diagnóstico de uma doença que poderia ser tratada, por qualquer meio, sendo colocada como sem possibilidade de cura e tirando do jogador a possibilidade de continuar trabalhando, simplesmente porque esse departamento médico não observou outras possibilidades.
A responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados está expressamente prevista no ordenamento jurídico brasileiro, notadamente no artigo 932, inciso III[1], do Código Civil, que estabelece que o empregador, no caso o clube, responde pelos danos causados por seus empregados no exercício de suas funções, o médico do clube, que atuando como tal faz um diagnóstico equivocado do estado de saúde do atleta, seu companheiro de trabalho, já que todos são empregados do mesmo empregador.
Assim o Clube, mesmo não sendo uma empresa da área da saúde, quando contratou um médico como seu empregado ou prestador de serviços, já que agora tudo é contrato de prestação de serviços, ninguém quer mais empregados, para prestar assistência aos seus atletas, assumindo, assim, os riscos inerentes e à conduta profissional desse profissional no ambiente esportivo.
Quando um médico é contratado para atuar internamente, mesmo que sem exclusividade, em benefício dos atletas, o clube passa a oferecer um serviço médico assistencial, evitando que seus jogadores procurem o tratamento fora do clube, esquecendo que é direito da pessoa optar com quem deseja se tratar, mesmo porque o contrato de trabalho fica suspenso após o décimo quinto dia de afastamento, tirando o poder de comando do clube sobre o desportista. O que implica um dever de diligência e responsabilidade pelos atos praticados pelo profissional da saúde durante sua atuação.
O erro de diagnóstico cometido pelo médico do empregador não pode ser considerado um ato isolado e pessoal, pois decorre do exercício da função que lhe foi atribuída pela empresa e em benefício direto da relação de trabalho.
Se um outro empregado vier a sofrer prejuízos, como um afastamento desnecessário, um não afastamento, um risco de aposentadoria, ou uma piora no seu quadro clínico devido a um diagnóstico equivocado, ou que não tenha examinado todas as possibilidades de tratamento, há um nexo causal entre o erro médico e os danos sofridos pelo atleta, sejam eles de ordem patrimonial ou extrapatrimonial, o que justifica a responsabilização do empregador.
O artigo 2o da CLT é muito claro ao reforçar a responsabilidade da empresa ao definir que é o empregador quem assume os riscos da atividade econômica, o que inclui os serviços de saúde prestados dentro do ambiente corporativo. E não poderia ser diferente, pois é o empregador quem escolhe quem será o médico responsável pelo seu departamento médico, após uma análise das suas competências, lhe abre as portas e permite que trabalhe com os atletas.
Ao disponibilizar um médico interno, que deveria conhecer quase tudo ligado ao esporte, pois ninguém conhece tudo, para atendimento dos seus atletas, a entidade esportiva cria expectativas legítimas de confiança por parte dos seus empregados, que acreditam estar recebendo um atendimento seguro e qualificado, melhor do que teriam se tivessem de buscar o tratamento em médicos, ou fisioterapeutas, fora que não tivessem intimidade com o mundo dos esportes.
Caso o erro médico resulte em um afastamento indevido, a empresa pode ser responsabilizada tanto pelo dano moral, causado pelo impacto psicológico e profissional do empregado afastado sem necessidade, quanto pelo dano material, que pode incluir perdas salariais e despesas médicas adicionais. O atleta prejudicado pode ter seu vínculo profissional comprometido, ou sua carreira encerrada precocemente, já que afastamentos médicos prolongados podem gerar estigmatização, dificuldades de reintegração e até mesmo demissão.
A entidade desportiva não poderá simplesmente se eximir de responsabilidade alegando que não é da área da saúde, pois o erro decorreu de um profissional que agia em nome e no interesse da própria empresa, que desejava ver os seus atletas de volta as atividades, no menor tempo possível, o que faz com que sequer os atletas sejam afastados para receber os benefícios do INSS.
É fato raro, que possivelmente aconteça apenas em clubes com menor poder econômico, e com atletas com remunerações não muito superior ao mínimo legal, que os atletas sejam afastado para receber o benefício junto ao INSS, posto que os clubes não querem ficar com um atleta ligado a sua equipe indefinidamente pelo tempo do tratamento junto ao INSS, bem como não querem fazer a complementação da renda, entre o que o atleta ganha no clube e o benefício acidentário.
O trabalhador afastado injustamente, em razão do errado no diagnóstico, pode perder oportunidades de renovação de contrato de trabalho com o clube, bem como poderá ter as portas fechadas em outras agremiações, prejudicando assim a promoção e crescimento profissional, o que acarreta prejuízos, sejam materiais, sejam morais de difícil reparação.
Se o clube tivesse ou adotado um sistema de revisão médica para diagnósticos graves, com segundas opiniões tendo sido colhidas, ou até mesmo terceiras em caso de empate, o erro poderia ter sido evitado, o prejuízo ao atleta, que passou a ser visto como incapacitado para a prática esportiva.
O empregador também deve garantir um ambiente seguro para os seus empregados, o que inclui a prestação de serviços médicos internos de forma eficiente e responsável, para evitar que venham a acontecer falhas na prestação dos serviços e venham a inviabilizar a correta análise dos resultados dos exames médicos dos atletas.
Lembrando que é dever do médico zelar pela saúde e bem-estar do seu paciente, mesmo que ambos sejam empregados do clube. O médico deve zelar pela saúde presente e futura do atleta, evitando que sejam adotados procedimentos, hoje, que possam causar sequelas para o futuro daquele paciente. Por isso, deve sempre informar ao atleta o resultado completo de todos os exames, bem como as consequências de todos os procedimentos a serem adotados ou não naquela situação.
Sendo assim, quando existir um erro do departamento médico do clube, em razão de um diagnóstico equivocado, adoção de procedimentos não adequados, ou ainda da recomendação de fisioterapia não adequada, o clube deverá indenizar ao atleta, seu empregado, que sofreu prejuízos morais ou materiais, em razão das orientações passadas pelos profissionais do clube.
Crédito imagem: Getty Images
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[1] Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
(…)
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;