Nesse momento de cisão do futebol, com a CBF passando por uma série crise institucional, vale lembrar do risco que isso representa. Foi a partir de uma ruptura do movimento esportivo na década de 30 que o Governo Vargas se apropriou do esporte, isso porque anos antes o Brasil chegava às Olimpíadas de Berlim com duas delegações rivais.
Isso mesmo, na Olimpíada de Berlim, em 1936, o Brasil mandou duas delegações, e o fato, como não poderia ser diferente, repercutiu muito mal externamente e internamente.
Isso aconteceu em função de uma disputa que ficou conhecida como “dissidio esportivo” ou “cisão esportiva”.
Nos anos de 1930, Arnaldo Guinle, dirigente do Flumninense) e Rivadávia Meyer (dirigente do Botafogo) travaram uma disputa pela organização do futebol. De um lado, a defesa do futebol entre profissionalistas (FBF – Guinle); do outro, os amadoristas (CBD-Rivadávia). Essa desorganização interna do futebol acabou gerando repercussão no próprio Movimento Olímpico Brasileiro.
A história é contada no ótimo livro Constituição e Esporte, de Wladimyr Camargos. Aqui, um trecho importante desse momento:
“Guinle passa a ter o controle do campo que reúne os mais representativos setores do esporte, porém sem poder se vincular ao sistema FIFA, e Rivadávia determina os rumos da CBD, filiada à FIFA, mas pouco representativa. O problema de legitimidade interna da CBD passa a ser resolvido com sua proximidade com Luiz Aranha e a liderança do governo Vargas.”
Assim, o caminho para a desorganização e o vexame histórico estava desenhado.
A confusão causada se apresenta ao mundo nos Jogos Olímpicos de 1936, em Berlim, quando duas delegações distintas de atletas e entidades brasileiros chegam à Alemanha.
Em 1935, o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) é reorganizado pelo grupo de Guinle e organiza uma delegação. Do mesmo modo, a CBD de Rivadávia envia outra equipe.
Como lembra Wladimyr, “os jogos de Hitler assistiram a um verdadeiro pandemônio por parte dos brasileiros, e o representante oficial do governo Vargas no evento era nada mais nada menos que Lourival Fontes, chefe do Departamento Nacional de Propaganda (DNP), que viria a se tornar o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP)”
Um observação sempre necessária: Lourival era um notório fascista
Isso teria sido a gota d’água para a decisão já estudada por Getúlio Vargas de intervir no esporte.
O esporte é extremamente popular, e o total distanciamento do Estado é quase inimaginável. Getúlio Vargas foi o primeiro governante brasileiro a entender esse papel do esporte – e tratou de tutelá-lo
Um movimento natural à época, até pela natureza do Estado Novo, que tinha grande preocupação social, mas também era populista, autoritário e extremamente nacionalista.
Em 1941, Getúlio edita o Decreto Lei 3199, uma espécie de primeira Lei Geral do Esporte no Brasil, tutelando o esporte. Ou seja, o governo se apropriando do esporte como instrumento político devidamente legalizado.
Mas o Brasil já tinha pagado o mico de 1936.
Cuidar do esporte internamente é desafio permanente do movimento esportivo. O Brasil chega em Tóquio para a cerimônia de abertura na próxima sexta (23) com uma delegação olímpica e coesa; mas o futebol passa por um racha histórico, com consequências ainda imprevisíveis, mas que a história contará.
Crédito imagem: Reprodução
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