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A história do brasileiro que enfrentou a FIFA e venceu

No futebol, a lógica do mais forte nem sempre se confirma em campo. Nos Tribunais esportivos também. O caso do meio-campista brasileiro Matuzalém que venceu uma árdua batalha contra a poderosa Fifa é um bom exemplo disso.

Esta é a história do brasileiro Francelino Matuzalém da Silva, nascido em Natal, que começou a jogar no Vitória da Bahia, mas rapidamente fez carreira no futebol internacional. Mas sua principal conquista para o futebol não foi em campo, mas fora dele.

Em 2009, o volante foi condenado a pagar 12 milhões de euros (R$ 29,1 milhões) por ter rompido unilateralmente seu vínculo com o Shaktar Donestk da Ucrânia para jogar no Real Zaragoza da Espanha. A transferência foi considerada irregular pela Fifa.

Um ano depois, ele ainda não havia realizado o pagamento e foi multado novamente. A entidade ainda ameaçou: caso a quantia não fosse paga, ele seria banido do esporte.

A ideia era reforçar a estabilidade dos contratos, desencorajando decisões de rompimento sem acordo entre as partes. Para isso, as elevadas multas seriam instrumentos de proteção contratual.

Uma decisão estatal muda regras internas do futebol

Matuzalém então seguiu o caminho do movimento jurídico privado do futebol e recorreu ao Tribunal Arbitral do Esporte, TAS ou CAS. O painel dessa última instância desse movimento privado deu parecer favorável a FIFA. Mas o brasileiro não desistiu. Ainda havia um caminho.

O brasileiro apelou para um tribunal estatal. O Tribunal Federal Suiço, que no movimento jurídico privado do esporte funciona como um STF, deu razão aos seus apelos, considerando a decisão tomada pela Fifa como medida de “caráter abusivo” e um “atentado grave contra os direitos da pessoa”.

Em comunicado, o tribunal suíço reforçou que tem poder limitado de interferir nas decisões esportivas, mesmo assim: “Em casos excepcionais, uma sentença pode ser anulada por violação de princípios do sistema judiciário, em nome da ordem pública”.

O Tribunal estatal da Suíça considerou nula a decisão da entidade máxima do futebol mundial de proibir o jogador de continuar a atuar profissionalmente por conta de uma polêmica saída do clube ucraniano.

Pela determinação dos juízes suíços, o brasileiro ficou “livre para atuar” e que sua “liberdade econômica será ilimitada na medida que as bases de sua existência econômica seja colocada em risco”. Depois do clube espanhol. Matuzalém foi para a Lazio e depois por outros clubes europeus até encerrar a carreira em 2018.

Duas decisões que garantiram mais liberdade aos atletas

Transformações no esporte normalmente acontecem a partir de irritações, que podem se apresentar a partir de pressão da opinião pública (recentemente regulamentos internos mudaram para responder a uma demanda por mais proteção a direitos humanos), para proteger saúde de atletas ou diante de decisões judiciais.

O artigo 17 foi introduzido no Regulamento de Status e Transferência de jogadores da Fifa em 2001 depois da Comissão Europeia decidir que as transferências não cumpriam as regras da União Europeia, pois prejudicaria a liberdade de circulação dos jogadores dentro da comunidade europeia em comparação a outros trabalhadores.

As decisões do caso de Matusalém e de Andy Webster (ainda veremos por aqui) foram considerados históricas e decisivas para mudanças no regulamento da FIFA. Uma delas diz respeito ao “período protegido”.

Assim, a partir dessa irritação, o movimento esportivo precisou agir. Ele passou a aceitar que um jogador rescinda o contrato em até 15 dias após a temporada acabar, contando que tenha cumprido três anos de contrato, se o atleta assinou antes dos 28 anos de idade, ou dois anos, se o atleta assinou depois de ter completado 28 anos.

A rescisão dentro do “período protegido” acarreta, além das sanções financeiras, sanção esportivas ao atleta (de quatro a seis meses de suspensão) e ao novo clube (impossibilidade de registro de novos atletas)

A decisão final sobre o “Caso Matuzalém” marcou, portanto, essa transformação importante nas regras da Fifa e uma derrota para o poder ilimitado de clubes sobre seus jogadores. Foi também uma vitória para atletas de todo o mundo, criando um mecanismo para garantir que o poder não esteja apenas nas mãos de empresários e cartolas. Como eu disse no início, no futebol, nem sempre os poderosos vencem.

Crédito imagem: getty images

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