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A importância do atendimento psicológico personalizado no futebol

O futebol é mais que um esporte no Brasil: é um elemento cultural, um campo de sonhos para milhões de jovens e uma das grandes potências econômicas do país. Entretanto, por trás do brilho das conquistas e da paixão das arquibancadas, está um ambiente altamente desafiador para os atletas, especialmente os das categorias de base.

Esses jovens, que muitas vezes deixam suas famílias e se dedicam integralmente ao sonho de serem jogadores profissionais, enfrentam pressões que afetam profundamente sua saúde mental.

Com base na Lei Geral do Esporte (LGE), que em seu artigo 99, §1º, II, c exige dos clubes formadores a oferta de assistência psicológica, é urgente refletir sobre como essa assistência é aplicada.

A simples presença de psicólogos em equipes técnicas, com ações coletivas ou pontuais, não é suficiente para atender as necessidades específicas de cada atleta. Os clubes precisam investir em atendimentos individualizados e contínuos, adaptados à realidade de cada jogador.

A rotina estressante dos atletas da base

Os atletas das categorias de base vivem sob uma rotina que mistura esperança e sofrimento. Eles deixam suas cidades, suas famílias e suas redes de apoio emocional ainda muito jovens. Em troca, entram em um ambiente altamente competitivo, cercado de incertezas.

Além de competirem com colegas de equipe e novos atletas que chegam constantemente para testes, esses jovens enfrentam a pressão por resultados, a exposição midiática e o medo da dispensa, que pode significar o fim de um sonho construído por anos. Cada treino, jogo ou teste pode ser encarado como um momento decisivo, o que gera níveis alarmantes de ansiedade.

Para piorar, muitos vivem sob condições que dificultam ainda mais sua estabilidade emocional. Dormitórios compartilhados, alimentação longe de padrões familiares e a ausência de suporte próximo de seus entes queridos criam um ambiente de vulnerabilidade.

Essa pressão constante muitas vezes resulta em sofrimento psicológico que, se não tratado, pode evoluir para quadros de depressão, transtornos de ansiedade e outros problemas graves.

Casos reais: a urgência do cuidado mental

Exemplos recentes mostram a gravidade da saúde mental no esporte. A ginasta Simone Biles priorizou sua saúde mental em plena Olimpíada, alertando para a necessidade de se olhar além do desempenho técnico. No Brasil, jogadores como Cássio, Cicinho e Thiago Ribeiro compartilharam suas lutas contra a depressão.

Um caso emblemático é o de Zé Love, ex-jogador do Santos, que recentemente revelou sua batalha contra a depressão e pensamentos suicidas. Ele descreveu como, após um erro de arbitragem que custou ao Brasiliense um avanço na Série D, sua saúde mental desmoronou. Internações, crises de ansiedade e isolamento marcaram esse período difícil:

“Decidi buscar ajuda quando pensei em tirar minha vida. Eu tinha medo de ficar sozinho, medo de não conseguir controlar o anseio de dar fim à dor.”

Zé Love enfatizou o papel crucial de sua família no processo de recuperação, mas destacou a ausência de suporte mais amplo, especialmente por parte do clube. Esse exemplo realça a importância de um cuidado integral, que inclua psicólogos e, se necessário, suporte psiquiátrico para os atletas.

Quando o suporte psiquiátrico é necessário

Embora o acompanhamento psicológico seja a base para lidar com questões emocionais e comportamentais, alguns casos exigem intervenção psiquiátrica. Quando um atleta apresenta sintomas mais graves, como crises de pânico recorrentes, pensamentos suicidas ou quadros de depressão severa, o suporte de um médico psiquiatra pode ser indispensável.

O tratamento psiquiátrico, incluindo o uso de medicamentos, muitas vezes complementa o trabalho psicológico, ajudando o atleta a alcançar estabilidade emocional. Clubes que investem nesse cuidado demonstram não apenas compromisso com a formação de seus jogadores, mas também com sua dignidade e qualidade de vida.

Por que o trabalho psicológico atual é insuficiente?

O artigo 99 da LGE determina que os clubes formadores ofereçam assistência psicológica aos seus atletas. Contudo, essa exigência legal, em muitos casos, é tratada como uma formalidade, com a contratação de psicólogos que realizam atividades em grupo ou atendimentos esporádicos. Embora essas ações tenham seu valor, elas estão longe de atender à profundidade dos desafios enfrentados pelos atletas.

A psicologia no esporte não deve ser vista como um luxo ou um apêndice à formação técnica e física. Ela é uma ferramenta essencial para ajudar o atleta a desenvolver resiliência emocional, lidar com fracassos e superar traumas que podem surgir ao longo de sua carreira.

Um exemplo notável é o relato do ex-jogador Diego Ribas, que foi incentivado pelo técnico Jorge Jesus a buscar terapia como parte de seu treinamento. Apesar de inicialmente resistir à ideia, Diego reconheceu que esse trabalho foi fundamental para se tornar um jogador mais equilibrado e preparado para os desafios da profissão.

O dever dos clubes na formação integral dos atletas

Os clubes de futebol têm uma responsabilidade que vai além da formação técnica e física. Eles são agentes formadores de seres humanos que, muitas vezes, chegam até eles ainda na adolescência, com personalidades em desenvolvimento e sonhos vulneráveis. A saúde mental deve ser tratada como uma prioridade, pois é a base para que esses jovens consigam desenvolver seu potencial completo.

Um programa efetivo de assistência psicológica precisa ir além do básico. Deve incluir:

  • Atendimentos individuais regulares: para que cada atleta possa discutir suas inseguranças, ansiedades e medos em um ambiente seguro.
  • Espaços de escuta ativa: locais onde os atletas se sintam à vontade para compartilhar suas dificuldades, sem medo de julgamento.
  • Educação emocional: palestras e workshops para ensinar os atletas a identificar e lidar com emoções complexas.
  • Integração com a equipe técnica: para que treinadores e preparadores físicos entendam a importância do equilíbrio emocional no desempenho esportivo.

Investir nessa formação integral não é apenas uma questão de ética, mas também uma estratégia para formar atletas mais completos, capazes de lidar com as demandas do futebol profissional e de suas vidas pessoais.

Conclusão

O futebol não é apenas um jogo; é uma plataforma que transforma vidas e inspira milhões. Porém, para que isso aconteça de forma saudável, os clubes precisam entender que formar atletas vai além de treinar chutes e passes. É necessário preparar os jovens para os desafios emocionais que acompanham a carreira esportiva.

Ao investir em programas psicológicos personalizados, os clubes estarão não apenas cumprindo suas obrigações legais, mas também garantindo que os atletas tenham as ferramentas necessárias para enfrentar as adversidades do esporte e da vida. É uma questão de humanidade, de ética e de respeito por aqueles que dedicam sua juventude a um sonho tão exigente.

O exemplo de atletas como Diego Ribas, que abraçaram a terapia como parte de sua formação, mostra que o cuidado com a saúde mental não é apenas uma necessidade, mas também uma vantagem competitiva. Cabe aos clubes serem líderes nessa transformação, criando um ambiente onde os jogadores possam crescer como atletas e como pessoas. Afinal, mais importante do que criar campeões é formar indivíduos fortes, equilibrados e preparados para a vida.

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