Por Higor Maffei Bellini
Quando um atleta de futebol deixa de buscar os meios de solução de conflitos apresentados pela família do futebol – assim entendidos aqueles criados, mantidos e organizados pela FIFA, ou pelas federações nacionais, as famosas câmaras de resolução de conflitos criadas para trazer uma solução seja ela negociada, seja ela a decisão arbitral destas câmaras – para utilizar a justiça do trabalho.
Este abre mão, ou deixa de poder utilizar os meios de coerção que estas entidades possuem para fazer cumprir a sua decisão, como a pena de ficar um determinado período de tempo sem poder registar novos atletas, posto que, estes meios são internos e administrativos, não judiciais.
Por isso é necessário ao atleta, seu agente e/ou advogado, analisar exatamente o que se deixa de poder utilizar ao escolher uma ou outra via, posto que é, como diz o dito popular, “a cada escolha uma renúncia”.
Quando o jogador vai para a via judicial, ou seja, a Justiça do Trabalho, porque entendeu mais rápida e mais econômica, já que não tem custas, este renunciou aos meios coercitivos inerentes aos métodos administrativos internos do meio do futebol, como é o caso da proibição de registar novos atletas por um período determinado de tempo, não sendo uma penalidade eterna.
Devemos lembrar que a proibição de registrar novos atletas não impede juridicamente o clube contratar novos jogadores, mas na prática impede sim, pois ninguém vai contratar um empregado, atleta, sem poder utilizá-lo nas competições.
E a impossibilidade de registrar os novos atletas para a disputa das competições, por não dar condição de jogo, impede na prática a contratação de novos jogadores, posto que, ninguém contrataria uma pessoa para não a utilizar durante o período do contrato, já que o contrato de trabalho do atleta é por prazo determinado.
Sem ocorrer o registo de regularização do atleta para a competição o mesmo não pode ser utilizado, afinal, caso entre em campo a equipe sofrerá as consequências administrativas: como a perda de pontos, por exemplo.
Mas, voltando ao nosso tema central.
A justiça do trabalho não pode impor esta pena, porque falando em termos futebolísticos: impedir de contratar é uma penalidade ao clube devedor. Porque ser devedor de qualquer obrigação civil ou trabalhista impede a imposição de penalidades excepcionais ao devedor que deve sofrer as medidas legais previstas seja na CLT ou no CPC, nunca em um regulamento interno de uma câmara arbitral, posto que a natureza jurídica da CNRD é esta.
Isto porque o CPC assim estabelece a permissão para o juiz tomar algumas medidas:
Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:
…
IV – determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;
Mas estas medidas devem ser aquelas estabelecidas no próprio CPC ou na CLT, posto que estas são as regras do processo, não podendo o juiz as ultrapassar ou usar medidas não previstas no ordenamento judicial, sob pena de cometer ilegalidade.
Esta ilegalidade vem do fato mutanti mutatis do que está fundamentando esta decisão do STJ, passando a execução dos bens do devedor para a própria pessoa do devedor, vejamos:
AgInt no AREsp 1233016 / SP
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL
2018/0009002-3
Relator(a)
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE (1150)
Órgão Julgador
T3 – TERCEIRA TURMA
Data do Julgamento
10/04/2018
Data da Publicação/Fonte
DJe 17/04/2018
Ementa
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. PRETENSÃO DE QUE SEJA SUSPENSA A CNH DO DEVEDOR COM BASE NO ART. 139, IV, DO CPC/2015. CONCLUSÃO NO SENTIDO DA INADEQUAÇÃO DA MEDIDA PARA O FIM COLIMADO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
- O Tribunal estadual entendeu que a medida pleiteada – suspensão da CNH dos recorridos – é inadequada para o fim colimado, pois é desproporcional no caso em tela, especialmente porque atinge a pessoa do devedor, não seu patrimônio. Essa conclusão foi fundada na apreciação fático-probatória da causa, atraindo a aplicação da Súmula 7/STJ.
- Agravo interno desprovido.
Quando a justiça do trabalho impede o registro de novos jogadores em razão de dívidas trabalhistas, esta atingindo a pessoa do clube, e não o seu patrimônio, está agindo de forma até a impossibilitar a continuidade das atividades do clube. Caso ocorra essa proibição, teremos que: quando os contratos de um ano venceram será necessário registrar os novos contratados para o ano seguinte.
Assim, a Justiça do trabalho ao impor a uma federação a proibição da inscrição de novos atletas a um determinado clube, porque este deve a um funcionário, comete uma ilegalidade atacável pela via do mandado de segurança a ser apresentado ao Tribunal Regional do Trabalho superior ao juiz do trabalho que decretou a medida.
Sendo o Clube a pessoa legitimada a apresentar este mandado de segurança, nunca a Federação, que apenas deverá cumprir a ordem, sendo ela uma terceira parte ao processo.