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A premiação nas apostas esportivas: sua tributação e os ajustes necessários para impulsionar o setor

Dizer que as apostas esportivas são “trend topics” não representa a real dimensão que o assunto assumiu nos últimos meses. As apostas esportivas – e os jogos em geral – são atualmente um verdadeiro furacão que arrebata multidões. A cada dia cresce o número de apoiadores da legalização dos jogos e os clamores pela imediata regulamentação das apostas esportivas. Resistência há, é verdade, por parte dos mais conservadores. Mas na prática parece difícil fechar os olhos para a realidade que se apresenta diante de todos e que clama por diretrizes claras.

Um ponto, entretanto, tem fugido dos holofotes: a tributação dos prêmios pagos aos apostadores esportivos.

Como funciona

Atualmente toda premiação paga em dinheiro a um apostador que supere R$1.903,98 (faixa de isenção), fica sujeita à cobrança do Imposto sobre a Renda. Explicando melhor, em se tratando de concursos desportivos em geral, o Imposto sobre a Renda deve ser retido na fonte pelo operador, à alíquota de 30%, antes do repasse do valor do prêmio ser feito ao ganhador (art. 14, Lei 4.506/1964).

Porém, nos termos do artigo 56, da Lei 11.941/2009, o referido imposto não incide sobre o prêmio em dinheiro que não exceder ao valor da primeira faixa da tabela de incidência mensal do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física, atualmente correspondente a R$1.903,98.

Problemas do atual sistema

Essa sistemática apesar de parecer coerente em uma primeira análise, na prática, gera distorções importantes que prejudicam muito a vida do apostador, especialmente daquele que joga de forma recorrente.

Imaginemos a seguinte situação. Um apostador “A” aposta em determinado mês a quantia de R$1.000,00, erra o resultado e, por consequência, perde o dinheiro. Dentro do mesmo mês faz uma nova aposta de R$1.000,00, se sai vencedor e ganha um prêmio de R$3.000,00, apurando um ganho de R$2.000,00 (prêmio pago – valor da aposta) naquela jogada. Hoje, de forma como a legislação prevê, o jogador não está autorizado a compensar os valores ganhos com as perdas por ele incorridas, ainda que dentro do mesmo mês.

Nessa hipótese, o apostador “A” deveria pagar 30% de Imposto sobre a Renda sobre o valor do seu ganho com a segunda jogada, isto é, aplicaria a alíquota de 30% sobre o ganho de R$2.000,00 que obteve, apurando um imposto a pagar de R$600,00. Se a compensação de perdas e ganhos fosse permitida, a base de cálculo do imposto seria sensivelmente menor. O apostador “A” abateria do ganho por ele obtido de R$2.000,00 na segunda jogada, os R$1.000,00 que perdeu na sua primeira aposta. Dessa forma, o Imposto sobre a Renda seria calculado com a aplicação da alíquota de 30% sobre uma base de apenas R$1.000,00. Ou seja, o imposto devido nessa situação seria de apenas R$300,00, isto é, metade do que é pago atualmente.

Agora imaginemos outra situação. Um apostador “B”, aposta R$1.000,00 e ganha R$3.000,00 em premiação, tendo um lucro de R$2.000,00. No mesmo dia decide fazer uma segunda aposta, e perde a totalidade dos R$3.000,00 que tinha à sua disposição. Ou seja, ao final do dia ele saiu sem nenhum Real em sua carteira. Entrou com R$1.000,00 e saiu zerado.

Na atual sistemática, por mais absurdo que pareça, o apostador além de perder todo o seu dinheiro, ainda precisará pagar imposto sobre o ganho que obteve na primeira jogada (e depois perdeu). Ou seja, o apostador “B”, no exemplo criado, perderia os R$1.000,00 do seu capital inicial e ainda seria obrigado a pagar R$600,00 de Imposto sobre a Renda.

Acredite ou não, o apostador “B” inicia seu dia com R$1.000,00 no bolso e sai devendo R$600,00. Enfim, sua situação é pior do que se perdesse de início todo o seu dinheiro.

Esses são apenas alguns exemplos de distorções que mostram a fragilidade do atual modelo de tributação aplicado nas apostas esportivas, sob a ótica do apostador.

Como deveria ser

Para evitar aberrações como as que narramos acima, o caminho mais lógico seria permitir que dentro de um certo período de tempo, todos os ganhos pudessem ser compensados com as perdas de cada apostador.

Trata-se da implementação de um mecanismo que permita um simples encontro de contas. Apuram-se os ganhos e deles se deduzem as perdas, de forma que ao final o Imposto sobre a Renda recaia somente sobre a diferença apurada,

Paradigmas normativos

A implementação de uma sistemática de compensação de perdas e ganhos não representa um tratamento diferenciado para o apostador esportivo, como alguns podem achar. Trata-se, em verdade, de dispensar a essa categoria de profissionais, um tratamento isonômico ao que outros setores já dispõem.

Profissionais liberais como médicos, contadores e advogados, fazem o pagamento do Imposto sobre a Renda por meio da utilização de livro-caixa, que permite o abatimento de despesas essenciais à geração de recursos e à manutenção do negócio, daquelas receitas recebidas pelo profissional ao longo de todo ano. Quando as despesas apuradas em determinado mês são maiores do que os ganhos, o valor pode ser compensado nos próximos meses (art. 68, RIR/2018).[1]

Esse não é o único exemplo. Pessoas que aplicam seus recursos em fundos de investimento, dispõem de tratamento semelhante. As perdas apuradas no resgate de cotas de fundos podem ser compensadas com rendimentos auferidos em resgates posteriores, no mesmo ou em outro fundo administrado pela mesma pessoa jurídica, desde que sujeitos à mesma classificação (art. 15, IN SRF 1.585/2015).

Da mesma forma se observa com aqueles que investem em ações. As perdas incorridas nas operações podem ser compensadas com os ganhos líquidos auferidos em outras, no próprio mês ou nos meses subsequentes, inclusive nos anos-calendário seguintes (art. 64, IN SRF 1.585/2015).

Enfim, a compensação de perdas e ganhos para os apostadores esportivos não é “inventar a roda”, é apenas aplicar algo que já existe, é regulamentado e aplicado para diferentes setores da economia que também trabalham com pessoas físicas. Estender esse tratamento aos apostadores esportivos nada mais é do que dispensar tratamento equânime a contribuintes que se encontram em situações semelhantes.

Considerações finais

A tributação dos apostadores esportivos é um tema de extrema relevância e não foi endereçado seja na Lei 13.756/2018, que legalizou a modalidade, seja na Lei 14.183/2021, que a alterou. Porém, ainda há espaço para que esse ponto seja devidamente equacionado e dois são os caminhos mais visíveis: (i) o decreto que se encontra em elaboração no Poder Executivo e tem o objetivo de regulamentar a legislação das apostas esportivas (quota-fixa), e (ii) o Marco Legal de Jogos (Substitutivo ao Projeto de Lei 442/1991), em fase final de formatação na Câmara dos Deputados.

Aqui nos resta torcer para que os Poderes Executivo e Legislativo se atentem para esse ponto e consigam implementar ajustes que tragam benefícios não apenas para o apostador (consumidor), como para toda a indústria, na medida em que práticas mais equilibradas como as aqui indicadas tendem a fomentar o crescimento do setor como um todo, atraindo mais interessados e, por consequência, recursos para o Brasil.

Crédito imagem: Getty Images

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[1] O excesso de deduções não aproveitado no próprio ano, não pode ser transposto para o ano seguinte.

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