Por Higor Bellini
Em virtude do pouco material escrito sobre a natureza jurídica da relação existente entre atletas e agentes, ou como alguns preferem ser chamados: empresários, procuradores ou gestores de carreira, é que escolhemos este tema, para tratar neste artigo. Que é redigido com o objetivo de examinar a responsabilidade do agente em relação ao atleta, sob a ótica da relação de consumo.
Por haver a presença dos agentes praticamente todos os esportes, atendendo a todos os atletas, dos mais estrelados aos mais humildes, é que se faz necessário um estudo do tema. E o presente trabalho não pretende terminar a discussão sobre do tema, muito pelo contraio, almeja ser uma primeira análise, pois outros pontos que envolvem o tema, precisarão ser discutidos no futuro, mas apenas analisar as ideias básicas que norteiam o assunto em exame, para um melhor entendimento das relações de consumo, existente entre atletas e agentes.
O Código de Defesa do Consumidor traz a definição de quem deve ser entendido como consumidor e quem deve ser entendido como sendo fornecedor de bens ou serviços da seguinte forma: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. e aqui se enquadra o atleta de qualquer modalidade esportiva, seja ela considerada amadora ou profissional, porque a modalidade pode ser amadora, mas, o atleta é profissional e empregado do clube ou academia e segundo o Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. E nesta definição se enquadra o agente dos atletas, que presta o serviço contratado pelo atleta.
O parágrafo segundo do artigo terceiro do Código de Defesa do Consumidor, desta forma define o que deve ser entendido como sendo serviço prestado, para que seja possível a aplicação do princípios consumeristas as relações: § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Desta forma, pela simples leitura dos dispositivos legais, podemos perceber que aqueles prestadores de serviços, que trabalham mediante remuneração, sejam pessoas físicas ou jurídicas, para os atletas, são enquadrados como forneceres de serviços para o código de defesa do consumidor. Existindo assim uma relação de consumo entre as partes.
A justiça de São Paulo já decidiu que a relação entre empresários e atletas é uma relação de consumo, ao fazer a análise do processo de número: 0199263-39.2002.8.26.0100 (583.00.2002.199263) pela 38ª Vara Cível – Foro Central Cível, em decisão paradigma sobre o tema, da qual vale a pena fazer a transcrição do trecho a seguir:
Os autores, que se apresentaram nos autos como prestadores de serviços de representação de atleta de futebol, devem ser considerados profissionais liberais. Quanto a esta qualificação, não procede o reclamo apresentado pelo réu em defesa uma vez que a condição de regularidade dos requerentes perante a Fifa deveria por ele ter sido observado antes da assinatura do contrato.
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A atividade dos profissionais liberais que, em verdade, nada mais fazem do que oferecer seus serviços no mercado de consumo mediante remuneração, se encontra abrangida pelos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, em especial pelo artigo 3º, “caput”, que assim dispõe, “in verbis”:
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E tanto é certo que a relação dos profissionais liberais com os tomadores de seus serviços é de consumo, que o Código de Defesa do consumidor, em seu artigo 14, parágrafo 4º, prevê que a responsabilidade subjetiva.
O nosso foco no presente artigo é o agente, mas, o mesmo pensamento, pode ser empregado para o assessor de imprensa, cada vez mais comum na vida profissional do atleta.
A dura realidade do esporte no Brasil, não é aquela glamurosa, demonstra pela imprensa nacional, que foca as notícias nos jogadores masculinos que disputam a série “A” do campeonato brasileiro, com jogadores com contratos por longos períodos de tempo, salários elevados que podem negociar com os seus empresários, melhores condições contratuais e exigir dos agentes que a prestação de serviços seja prestada da melhor maneira possível. Mas sim de atletas que trabalham em contratos curtos, para disputar um único campeonato e recebendo salários baixos, que apenas junto com o fornecimento do alojamento e alimentação pela equipe contratante possibilitam ao atleta ter uma vida minimamente digna.
Sendo esta grande maioria dos atletas, também, assistidas por agentes porque entendem que precisam de alguém para tentar encontrar um novo clube, para a próxima temporada, porque não sabem se terão os seus contratos renovados com aqueles clubes que estão, e, para tentar encontrar possíveis patrocinadores individuais que maioria das vezes, para esta gama de atletas, consiste apenas em permutas, onde o atleta recebe o serviço ou produto, em troca da divulgação destes em suas mídias sociais.
Os atletas quando se sentirem prejudicados pela atuação profissional do seu agente, pode, também, buscar no poder judiciário a reparação do caso causado, ou solução do conflito instaurada com o agente, pela forma como este age, se não houver no contrato firmado entre as partes cláusulas que estipulem que as controvérsias existente em decorrência do contrato devem ser dirimidas perante as câmaras de arbitragem, ou solução de conflito mantidas pela Confederação Brasileira de Futebol ou perante a Fifa, quando a solução virá destas entidades.
Mas sendo a questão analisada pelo poder judiciário, esta deverá ser analisada sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, havendo apenas a diferenciação no tratamento se o agente for pessoa física, sendo então considerado como profissional liberal, com a análise da sua responsabilidade sendo feita sob a análise do artigo 14 § 4°, quando há a necessidade de provar a culpa do agente, para o dano por se tratar de responsabilidade subjetiva, ou como pessoa jurídica quando então a analise deverá acontecer pelo estabelecido no caput do artigo 14, que por tratar da responsabilidade objetiva, dispensará a comprovação da culpa do agente para a ocorrência do evento danoso ao atleta.
Como exemplo de evento dano ao atleta, de modo meramente exemplificativo, dissociado da realidade fática do escritório, podemos citar o caso do agente que recebe a determinação de um determinado atleta, para apenas renovar o contrato com o clube, se este chegar a um valor determinado pelo atleta, mas, que por sua livre e consciente ação acaba por fechar o contrato por um valor, trazendo assim um prejuízo ao atleta que deve ser suportado pelo agente, que nesse caso não deveria ter aceito a renovação. Outro exemplo é o do agente que não aconselha ao atleta evitar aparecer em fotos ou vídeos com produtos concorrentes dos patrocinadores do seu clube, gerando assim multas nos contratos de licenciamento de imagem, trazendo prejuízo financeiro ao atleta, que foi multado porque aquele a quem contratou também para analisar o contrato não o fez de modo correto, não passando a melhor análise do caso.
É importante também trazer exemplos de prejuízos causados pela omissão do agente, que deixa de fazer corretamente o trabalho para o qual foi contrato, como por exemplo aconselhar ao atleta aceitar a posta de um clube, que já tem um histórico de inadimplência sem antes, buscar garantias do recebimento dos valores, como por exemplo fiança bancaria, ou o recebimento de parte do valor antecipado. E para não alongar o exemplo, agora, apenas mais um de omissão que acontece quando o agende deixa de responder no prazo a proposta apresentada pelo clube, ou patrocinador fazendo com que o atleta perca o contrato e deixe de receber os valores dele decorrentes.
Para que seja possível a responsabilização do agente o atleta deverá fazer a prova da ocorrência do dano, como no caso do exemplo acima demonstrando que passou o valor que desejaria receber de remuneração do clube, ou então a informação vinda do agente que de que poderia usar aquele determinado produto mesmo sendo este concorrente do patrocinador do clube, com o qual o jogador mantem o contrato.
Comprovado o dano a responsabilidade do agente sendo uma pessoa jurídica acontecerá de modo objetivo, cabendo a empresa demonstra em sua defesa as excludentes de responsabilidade que são segundo o parágrafo terceiro do artigo 14 do CDC: I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; e II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. E sendo pessoa jurídica a defesa além destes fatores poderá a legar que o agente não teve culpa pelos resultados danosos causados ao atleta.
Desta forma podemos concluir que os agentes, sejam pessoas físicas ou jurídicas, mantêm uma relação de consumo com os atletas. Onde os agentes são os fornecedores dos serviços e os Atletas os consumidores. Havendo a ocorrência de prejuízos aos atletas, causadas pelas ações ou omissões dos seus agentes, estes respondem pelos prejuízos causados, também, em razão do disposto no código de defesa do consumidor, perante a justiça comum, estadual, se não houver cláusula de arbitragem nos contratos.
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Higor Bellini é advogado, mestre em Gestão Integrada Saúde e Meio Ambiente do Trabalho, SENAC/SP; Master of Laws (LL.M.) em Direito Americano, Washington University of St. Louis; mestrando em Direito Esportivo PUC/ SP, especialista em Direito do Trabalho, Uni Fmu; especialista em Direito Ambiental Cogeae PUC/SP; especialista em Educação do Ensino Superior Cogeae PUC/SP. Presidente da Comissão de Direito Desportivo na OAB Butantã