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Ação que pede penhora de identidade do Náutico é legal, mas Lei Pelé impede alienação

No futebol brasileiro, é comum ter notícias de clubes que tiveram contas e patrimônios penhorados por conta de ações trabalhistas. No entanto, o Náutico pode perder algo mais valioso que qualquer bem: sua identidade. Na última terça-feira (3), a Justiça deu procedência para o pedido de penhora da marca do clube pernambucano em decorrência de uma dívida trabalhista com um ex-jogador do Timbu. O caso é incomum e está gerando discussões sobre a legalidade do pedido.

A advogada Carla Guttilla Lacerda, especialista em direito empresarial, explica que “sob a perspectiva do direito de propriedade industrial, uma marca é um bem que pode, em tese, ser objeto de direito e não é incomum que em ações envolvendo empresas que marcas sejam objeto de penhora e até de expropriação, que é a perda da propriedade do bem penhorado em favor do credor ou de um terceiro que a adquire em um leilão judicial”.

Apesar da legalidade, os especialistas entendem que há alguns elementos que podem tornar inviável a expropriação da marca de um clube de futebol em um processo judicial.

“Apesar de juridicamente possível, a penhora e a expropriação judicial de um nome ou escudo de um clube, não é um caminho que deve ser seguido. A marca de um clube só serve a ele, fora de suas mãos não tem valor algum. Se efetivada a penhora e, ao final, a transferência da marca para o credor, o que ocorrerá é que o clube estará arruinado e o credor sem nada de valor nas mãos”, avalia o advogado Luciano Andrade Pinheiro, especialista em Propriedade Intelectual.

“Em primeiro lugar, a execução não pode ser excessivamente onerosa para o devedor. O bem deve ser suficiente para o pagamento da dívida atualizada, acrescida de juros e dos honorários advocatícios. Se houver uma clara desproporção entre o valor do bem e o valor da execução, é natural que o devedor tenha o direito de indicar outro bem para o pagamento da dívida. Então será necessária uma avaliação da marca e, se essa marca tiver um valor muito superior à dívida, o clube terá o direito a receber o seu saldo, o que pode inviabilizar que o próprio credor venha a adquirir para si a marca. Teria de haver um terceiro muito interessado em pagar o valor da marca, para poder utilizá-la e há uma óbvia complexidade em se encontrar um terceiro interessado em adquirir tal propriedade sem o resto do que a acompanha”, analisa Carla Guttilla.

Na semana passada, conforme o ‘ge’ divulgou e o Lei em Campo confirmou, a juíza do trabalho Roberta Vance Harrop deferiu o pedido de penhora da marca do Náutico por conta de a uma dívida trabalhista no valor R$ 674.298,97 com o ex-volante Jhonny, que atuou pelo Alvirrubro em 2009. Na decisão, a magistrada determinou a expedição de ofício ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), vinculado ao Ministério da Economia, e que é o responsável pela gestão de concessão e garantia de direitos de propriedade intelectual no Brasil.

Diante disso, caso a marca do clube vá a leilão e seja arrematada, o Náutico perderia o direito de usar seu escudo atual, seu nome, e tudo mais que o identifique como a atual agremiação que é.

No entanto, a advogada Carla Guttilla afirma que um trecho da Lei Pelé impede que essa identidade do clube seja alienada.

“A marca dos clubes de futebol recebe, além da proteção típica que é conferida pela Lei de Propriedade Industrial, que regula as marcas em geral, uma proteção especial conferida pela Lei Pelé. A legislação do esporte afirma em seu artigo 87 que a denominação e os símbolos de entidade de prática desportiva são de propriedade exclusiva das respectivas entidades, independentemente de registro no INPI. Então ainda que as marcas de clubes de futebol sejam usualmente objeto de negócios jurídicos, como de licenciamento, por exemplo, e que a Lei da SAF estabeleça que a marca pode ser cedida pelo clube a uma sociedade anônima do futebol, em conjunto com a integralidade dos bens destinados à prática do futebol, não parece que seja possível que essa marca seja alienada independentemente dos demais bens que compõem o chamado ativo futebolístico do clube”, destaca.

A defesa do ex-jogador, representada pelo advogado Marllus Lito Freire, disse que a solicitação de penhora da marca do Náutico ocorreu após o fracasso na penhora de outros bens do clube. A ação de Jhonny foi iniciada em 2011.

Por fim, a advogada Carla Guttilla avalia que não há risco do Náutico perder a sua marcar nesta ação.

“Não parece que haja efetivamente o risco de o Náutico vir a perder a propriedade sobre a sua marca neste processo. No entanto, isso não quer dizer que, por exemplo, não seja possível pleitear a penhora sobre os frutos dessa marca, até que o valor da dívida seja satisfeito integralmente. Neste caso, todos os valores que o clube tivesse a receber em decorrência de negócios que tenham como objeto o licenciamento e o uso dessa marca, seriam pagos ao juízo para a satisfação do crédito executado”, finaliza.

Luciano Pinheiro segue a mesma linha e acredita que a tendência seja de que as outras instâncias da Justiça derrubem a decisão da última terça-feira.

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