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Acesso à prática esportiva como base do Direito Esportivo

Os fundamentos do Direito Esportivo (II) – O acesso à prática esportiva como base do Direito Esportivo

 

Na coluna da semana passada, vimos que, para que se afirme a existência do Direito Esportivo, é preciso entendê-lo como garantidor do equilíbrio entre a busca da melhor performance e a incerteza do resultado. Passaríamos, assim, nesta coluna, a nos aprofundar mais nas consequências dessa relação entre esporte de rendimento e o direito, principalmente quanto ao princípio da especificidade esportiva. No entanto, vamos fazer um pequeno freio de arrumação para buscar ainda outro ponto-chave para o fundamento do Direito Esportivo, qual seja, o acesso à prática esportiva.

Reafirmo que o critério de diferenciação funcional entre o Direito Esportivo e as outras áreas jurídicas é a produção de uma linguagem própria, universal, e que, para ser preservada, chama o direito para ali atuar ao seu lado no mundo das competições de alto rendimento. Mas haveria esporte competitivo se as pessoas não tivessem acesso à prática esportiva? Bom, é justamente aqui que abrimos um leque para as dimensões do esporte nas suas interações com a educação, a saúde e a cidadania.

Pode-se afirmar que o acesso à prática esportiva favorece o combate ao sedentarismo, propiciando uma vida saudável e longeva. Ademais, é notória a relação benéfica entre educação e o esporte para o desenvolvimento humano. Tudo isso se complementa com as possibilidades interativas entre os valores olímpicos, inclusive o do jogo limpo, da solidariedade, com os preceitos de uma vida livre em uma sociedade justa, equilibrada e plural. Máximas próprias de um agir cidadão.

Repare no que vem inscrito logo no início do dispositivo da Constituição Brasileira que se refere ao esporte:

Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um…

O comando que a norma constitucional nos traz, ademais da obrigação de fomento do Estado, é o direito de cada um ao acesso às práticas esportivas.

Como já havia explicado em meu último livro, “Constituição e Esporte no Brasil”, uma das justificativas para que a Constituição de 1988 tenha adotado essa garantia de acesso universal ao esporte é o próprio Direito Internacional Esportivo.

Em 1978 os países membros da Unesco resolveram por convencionar os direitos inerentes à prática esportiva e educação física por meio da “Carta Internacional da Educação Física e do Esporte”. Um de seus principais objetivos é considerar o esporte como um direito de todos e, mais do que isso, um direito fundamental da cidadania:

Artigo 1. A prática da educação física e do esporte é um direito fundamental de todos.
1.1. Todo ser humano tem o direito fundamental de acesso à educação física e ao esporte, que são essenciais para o pleno desenvolvimento da sua personalidade. A liberdade de desenvolver aptidões físicas, intelectuais e morais, por meio da educação física e do esporte, deve ser garantida dentro do sistema educacional, assim como em outros aspectos da vida social.

Reconheceu-se, portanto, em uma das organizações que compõem o Sistema das Nações Unidas, que o acesso ao esporte é um dos direitos básicos, fundamentais da humanidade.

Portanto, em razão de se considerar tanto no Direito Internacional (Carta da Educação Física da Unesco) como na própria Constituição Federal brasileira que o acesso às práticas esportivas constitui um direito fundamental, o Direito Esportivo também se fundamenta na principiologia própria da proteção universal aos Direitos Humanos.

Ainda que eu discorde muito da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) em matéria esportiva, inclusive, como já escrevi outras vezes, do resultado do julgamento da ADI 2.937/2003-DF (Estatuto do Torcedor), o voto do relator desse processo, ministro Cezar Peluso, traz um entendimento bastante consentâneo com o que desenvolvo aqui (voltaremos a ele quando falarmos do princípio da “autonomia esportiva): “A previsão do direito ao esporte é preceito fundador…”.

Vê-se, assim, que a defesa da dignidade da pessoa humana, seja no direito de poder praticar esportes, seja na tutela de sua integridade enquanto praticante esportivo, é fundamento básico do Direito Esportivo.

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