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Adicional noturno no contrato especial de trabalho esportivo da LGE

Um dos maiores avanços da Lei Geral do Esporte, representante de uma evolução legislativa, que pretende resolver um problema antigo, como já se afirmou em outras ocasiões, é a regulamentação do adicional noturno dos atletas que detêm contrato especial de trabalho esportivo, gerador do vínculo empregatício, com os clubes empregadores.

Há muitos anos o trabalho exercido em horário noturno pelos atletas empregados gerava uma cizânia jurisprudencial histórica na Justiça Especializada do Trabalho, até mesmo o Colendo Tribunal Superior do Trabalho nunca havia se pronunciado firmemente acerca do tema, fosse por súmulas, orientações jurisprudenciais, decisões de suas SBDIs ou em recurso repetitivo de repercussão geral.

No mesmo ano de 2021 uma decisão turmária do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região havia condenado um empregador desportivo em quitar o adicional nourno a um ex-empregado jogador, aplicando-se subsidiariamente os termos normativos da CLT e em sentido oposto uma das turmas do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 4a Região havia absolvido uma entidade desportiva empregadora de pagar o referido adicional a um ex-atleta, ora reclamante, por inaplicação subsidiária das normas da CLT a respeito do objeto.[1]

Tal divergência jurisprudencial acima citada quanto à aplicação celetista do adicional noturno era bastante compreensível, uma vez que se aplica a legislação trabalhista e da seguridade social subsidiariamente ao emprego desportivo naquilo que não for incompatível com as suas especificidades (assim sempre dispôs o art. 28, § 4°, da Lei n. 9.615/98-Lei Pelé; atualmente o art. 85, caput, da Lei n. 14.597/13-Lei Geral do Esporte-LGE reproduz o mesmo dispositivo de maneira mais intensa, já que exclui a parte da compatibilidade com as peculiaridades da relação empregatícia desportiva).

Da mesma forma que a jurisprudência, a doutrina especializada do Direito do Trabalho Desportivo também sempre foi divergente quanto a possibilidade de incidência ou não das normas trabalhistas da CLT sobre o adicional noturno em favor dos atletas empregados.

De um lado há a Alice Monteiro de Barros, Gustavo Filipe Barbosa Garcia e Sérgio Pinto Martins, defensores da aplicabilidade direta do texto consolidado inerente ao adicional em pauta em benefício dos jogadores, de maneira oposta se manifestam Domingos Sávio Zainaghi, Mauricio Corrêa da Veiga e Fábio Menezes de Sá FIlho. Uma terceira corrente prega a aplicação do adicional nortuno para atletas empregados que não tivessem transmissões de partidas passando das 22:00h, os conhecidos hipossuficientes, mas sem aplicabilidade para aqueles jogadores hipersuficientes que recebem direito de arena em decorrência de jogos comprados e/ou transmitidos após as 22:00h (vide este colunista).[2]

Diante do ainda vigente art. 28, § 4°, da Lei Pelé que descreve ser aplicável subsidiariamente a legislação trabalhista à atividade do atleta empregado naquilo que não for imcompatível, sempre coube ao Magistrado Laboral realizar esta função interpretativa de adoção ou não do adicional noturno da CLT aos empregados desportivos.

Nesse campo de ideais, não se anuia às críticas ácidas registradas aos Magistrados e Tribunais da Justiça Trabalho quanto a possível aplicabilidade do adicional noturno, tendo em vista que o critério era de interpretação, que apenas não poderia ser vazia de motivação do Poder Judiciário Laboral (art. 93, IX, da CF/88).

Todavia, o art. 97, VII, § 3°, § 4°, da LGE regulamenta o adicional noturno dos jogadores empregados ao prescrever que se considera período noturno aquele trabalhado em partidas e competições entre as 23h:59min de um dia a 06h:59min do dia seguinte, sendo o valor do adicional de 20% a mais sobre o valor da hora diurna, calculando-se cada hora como de 52min:30seg.

Perceba-se que a nova normatização do período noturno é diferente da celetista que se encontra entre as 22:00h de um dia às 05:00h do dia seguinte (art. 73 da CLT), de resto a regulamentação é idêntica.

Esta nova regulação do adicional noturno na LGE é plenamente constitucional já que o art. 7°, IX, da CF/88, apenas determina que a hora noturna deve ser de valor maior do que a da diurna, nem menciona sobre a sua regulamentação infraconstitucional. Critério este aberto para a normatividade pela própria Lei ou por Normas Coletivas de Trabalho (Convenção Coletiva de Trabalho-CCT, Acordo Coletivo de Trabalho-ACT).

Além da constitucionalidade estritamente jurídica, a nova regulamentação do adicional noturno pelo art. 97, VII, § 3°, § 4°, da LGE, parece finalmente atender ao critério da teleologia normativa a respeito do fenômeno, pois regula a realidade social da atividade empregatícia desportiva de maneira afinada, levando-se em consideração a própria saúde dos jogadores ao propiciar a redução de jogos à luz do sol, o percebimento do adicional, e os interesses econômicos das transmissões das competições, atreladas à diminuição dos colossais dispêndios dos clubes empregadores.

Em síntese, acredita-se que a nova regulamentação do adicional noturno na LGE se adequa aos critérios constitucionais e à vedação ao retrocesso social dos tratados internacionais, na medida em que se regulamenta resolutivamente sobre um problema que era lacunoso em todas as Leis Trabalhistas Desportivas anteriores, tornando a CLT inaplicável por atual existência de norma específica, sob a autorização do comando do art. 7°, IX, da CF/88.

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[1] Ementas jurisprudenciais com referências completas reportadas em RAMOS, Rafael Teixeira. Curso de direito do trabalho desportivo: as relações especiais de trabalho do esporte. 2. ed. São Paulo: Juspodivm, 2022, p. 152-153.

[2] Referências pormenorizadas de tais divergências doutrinárias em Id. Ibid., 2022, p. 149-154.

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