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Ainda sem compra concluída, SAF do Cruzeiro já é citada em pelo menos 14 ações trabalhistas

Em uma semana que pode ser decisiva para a compra definitiva por Ronaldo Fenômeno, a Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Cruzeiro já está sendo envolvida em ações na Justiça do Trabalho, na maioria dos casos, como ‘ré solidária’. De acordo com um levantamento feito pelo Lei em Campo, já são pelos menos 14 ações iniciadas desde dezembro – quando o clube migrou de modelo – em que consta o nome da SAF da Raposa. Mas por que isso está acontecendo?

“A Lei nº 14.193/21 determina que os créditos trabalhistas relativos aos atletas, membros da comissão técnica e funcionários cuja atividade principal seja vinculada diretamente ao departamento de futebol, deverão ser quitados pelos clubes através de parcela das receitas auferidas pela SAF e dos dividendos/juros pagos ao clube. Certa ou errada, essa foi a definição conferida ao tema pelo legislador”, explica Rafael Pandolfo, advogado especialista em direito tributário.

“A vinculação entre SAF e o clube é incontroversa, tanto é que a própria lei, no art.10, obriga a SAF a pagar as dívidas da associação. A legislação fala em sucessão do clube pela SAF, mas entendo que não existe essa figura, pois de fato houve apenas a transferência da atividade produtiva para a SAF, ficando o clube esvaziado com parte irrisória de algumas receitas, mantendo sua vivência. Ou seja, clube e SAF estão interligados. Não há como separá-los para os fins pretendidos pela lei. Tentativa clara de fraudar as execuções quando a lei tenta isentar a SAF de responsabilidade imediata pelo pagamento das dívidas”, analisa Theotonio Chermont, advogado trabalhista e colunista do Lei em Campo.

Rafael Pandolfo entende que se a SAF tiver responsabilidade além desses parâmetros legais, deixará de existir, pois nenhum investidor terá interesse no negócio. “Agora, a SAF precisa ter um plano de negócios que gere receita e tenha propósito. Caso contrário, a separação legalmente estabelecida poderá, em casos excepcionais, ser afastada”, acrescenta.

O advogado Theotonio Chermont acredita que essa divergência também é resultado pela forma que a lei foi redigida.

“Me espanta que o relator da lei, advogado que militou anos nessa seara, tenha chancelado esses absurdos. Vivenciou muitos credores se sujeitando a vários atos trabalhistas, alguns fraudados, sem até hoje receberem seus direitos sonegados, muitos há mais de 20 anos. Faltou muita sensibilidade, tamanha a ânsia de atender os anseios dos clubes e eventuais investidores para emplacar essa lei deformada. Lamento muito que não tenha havido essa empatia com os coitados que passam necessidade. Espero que o judiciário trabalhista se debruce sobre o tema, siga esse precedente e repare essas ilegalidades”, critica.

No começo desta semana, o Lei em Campo contou sobre um importante precedente que poderia ser aberto pela Justiça depois que a juíza substituta Jéssica Grazielle Andrade Martins, da 12ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, condenou o Cruzeiro associativo e citou a SAF como ré solidária a pagarem R$ 45 mil ao ex-treinador de goleiro do time feminino do clube, Fábio Anderson Fagundes.

A grande discussão envolvendo o reconhecimento da SAF como ré solidária em ações trabalhistas está na divergência de entendimento do judiciário com o que diz a legislação (Lei 14.193/21). Pela Lei da SAF, mais precisamente em seu art.10, a empresa estaria livre de responder pelo passivo do clube judicialmente, apesar de haver uma responsabilidade por meio de repasses de 20% da receita e 50% dos dividendos para a associação para o pagamento dos débitos.

O que diz o art. 10 da Lei da SAF?

Art. 10.  O clube ou pessoa jurídica original é responsável pelo pagamento das obrigações anteriores à constituição da Sociedade Anônima do Futebol, por meio de receitas próprias e das seguintes receitas que lhe serão transferidas pela Sociedade Anônima do Futebol, quando constituída exclusivamente:

I – por destinação de 20% (vinte por cento) das receitas correntes mensais auferidas pela Sociedade Anônima do Futebol, conforme plano aprovado pelos credores, nos termos do inciso I do caput do art. 13 desta Lei;

II – por destinação de 50% (cinquenta por cento) dos dividendos, dos juros sobre o capital próprio ou de outra remuneração recebida desta, na condição de acionista.

No entanto, não foi esse o entendimento. No caso envolvendo o ex-treinador de goleiro do time feminino do Cruzeiro, a magistrada ressaltou que os termos não se aplicam quando a dívida é relacionada “às atividades específicas de seu objeto social”, nesse caso, o futebol.

Também nesta semana, o técnico Enderson Moreira foi outro a acionar o Cruzeiro na Justiça do Trabalho para cobrar parcelas de sua rescisão com o clube, multas e uma indenização, totalizando mais de R$ 1,5 milhão. A defesa do treinador também solicitou a inclusão da SAF no processo como responsável solidária, citando a sentença da 12ª Vara (caso de Fábio Fagundes).

Ainda é cedo para afirmar que já há uma jurisprudência sobre o tema, uma vez que ainda é preciso aguardar pelas decisões de outras instâncias, como o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Superior Tribunal Federal (STF). No entanto, parece ser cada vez mais claro que as SAFs não estão blindadas dos débitos feitos pelas associações, servindo de alerta para outros clubes, como Vasco e Botafogo.

Crédito imagem: Cruzeiro

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