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Apesar de flexibilização, COI mantém princípios da Regra 50 nos Jogos Olímpicos de Tóquio. Especialistas analisam

Após meses de consultas, a Comissão de Atletas do Comitê Olímpico Internacional (COI) recomendou manter a proibição de protestos e manifestações políticas durante os Jogos Olímpicos de Tóquio. Além de incluir o pódio, a orientação também serve para o local em que os jogos acontecerem e nas cerimônias oficiais. Segundo o site ‘Inside the Games’, o tema foi debatido na reunião do Comitê Executivo do COI desta quarta-feira (21) na Suíça.

Apesar do veto, a comissão pediu uma espécie de ‘reestruturação’ da Regra 50 da Carta Olímpica, e também uma maior clareza nas punições por violações à regra por atletas. Ao término da reunião, o COI afirmou que houve um avanço, apontando a flexibilização em alguns pontos já válidos para os Jogos Olímpicos de Tóquio.

No entanto, especialistas ouvidos pelo Lei em Campo não consideram a recomendação como um avanço.

“É um retrocesso. Cidadania significa poder se colocar como sujeito de direito e opinar, debater, discutir a realidade do seu país, da sua região, do mundo. Não é possível que acreditem ser democrático calar os esportistas”, afirma Mônica Sapucaia, advogada especialista em direitos humanos.

“Eu entendo que qualquer posicionamento que seja em favor da igualdade, contra o preconceito e na defesa de valores universais de direitos humanos, não pode ser punido. Pelo esporte e pelos governos. Mas para isso, esse tem que ser o entendimento da sociedade e do movimento esportivo. Essa proteção perde força com o posicionamento dos atletas, e regras internas aceitas acabam ganhando força”, avalia Andrei Kampff, jornalista, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.

Para Mônica Sapucaia, “a ideia de que a Olímpiada não pode ser um espaço de protesto é uma atitude antidemocrática, que não entende o ambiente de sociabilidade e de diálogo. Esporte faz parte da forma como a sociedade se entende, se observa, se representa, logo ele faz parte da conversa política”.

“Entidades privadas não podem determinar o que o atleta fale ou deixe de falar. Isso é um cerceamento direto à liberdade de expressão, ao direito de posicionamento e a forma como você dialoga com a sociedade como um todo. É impensável que no estado direito tenha uma norma que proíba as pessoas de se posicionarem dentro dos parâmetros legais”, completa Mônica.

“As ideias que servissem para justamente reafirmar os valores olímpicos, deveriam ser, inclusive, incentivadas. Assim, defesas do meio ambiente, da diversidade, da igualdade entre os povos, que sejam contrárias ao racismo e à exclusão de qualquer natureza, deveriam, na minha opinião, passar a ser aceitas em qualquer local, devendo ser regulado o que poderia ser usado em prol dessa manifestação de ideias”, ressalta Ana Paula Terra, advogada especialista em direito desportivo.

Um dos objetivos da comissão é que o COI defina claramente o que será classificado como ato de protesto ou manifestação política, e quais serão as sanções aplicadas nesses casos.

No relatório, a Comissão de Atletas apresentou sugestões ao COI de locais que seriam adequados para manifestações de atletas. São eles: cerimônias de abertura e encerramento, na Vila Olímpica, em roupas usadas pelos atletas, nas redes sociais e mensagens digitais durante a apresentação dos esportes.

Uma pesquisa também foi incluída no documento. Nela, 70% dos entrevistados acreditam que as competições e cerimônias oficiais não são espaço para manifestações e protestos. Ao longo dos 11 meses, 3.547 atletas de 185 países e 41 modalidades esportivas foram ouvidas. Para 67%, o pódio também não deve ser palco de manifestações.

Ainda no relatório, 48% dos atletas disseram que acreditam ser importante que sejam criadas “oportunidades para a expressão dos atletas durante os Jogos”. Eles sugerem também que haja um momento durante a cerimônia de abertura do evento para a “solidariedade contra a discriminação”.

Ao fim, o relatório conclui que muitos atletas se utilizam do argumento de liberdade de expressão para protestar. No entanto, a Comissão de Atletas afirmou que, após uma consulta com especialistas em direitos humanos, a liberdade de expressão dos atletas “não é absoluta” e “pode ser limitada” durante os Jogos Olímpicos.

A Regra 50 da Carta Olímpica determina que “nenhum tipo de demonstração ou propaganda política, religiosa ou racial é permitida em qualquer evento olímpico, local, ou outras áreas”. Atualmente, só é liberado que o atleta se manifeste livremente nas zonas mistas e durante entrevistas. Caso aconteça o descumprimento, é previsto punições desportivas, suspensões e multas, podendo, inclusive, causar a perda dos patrocínios ao competidor.

O Lei em Campo contou que o COI poderia fazer mudanças na Regra 50. Em outubro, a entidade revelou que lançou uma pesquisa para discutir possíveis alterações na regra, após ser pressionada por atletas e federações.

Nas discussões sobre possíveis mudanças na Regra 50, atletas que participaram da pesquisa divergiram sobre o assunto. Alguns acreditam que é preciso um relaxamento total da regra, enquanto outros que se deve preservar o pódio olímpico e sua mensagem histórica. Há um consenso, ninguém quer posições extremistas, mas sim, liberdade de expressão na proteção de Direitos Universais, podendo se manifestar em casos que os direitos humanos forem feridos.

Desde o começo, o COI alega que mantem a regra dessa forma para “proteger a neutralidade do esporte e dos Jogos Olímpicos”.

No ano passado, uma onda de protestos tomou conta dos Estados Unidos. O motivo foi a morte de George Floyd, homem negro, que foi morto pelo policial branco Derek Chauvin. Desde então, diferentes atletas passaram a se manifestar durante eventos esportivos. Entre eles: jogadores da NBA, Lewis Hamilton, Carol Solberg e outros mais.

Os Jogos Olímpicos de Tóquio estão programados para acontecer de 23 de julho a 8 de agosto, enquanto os Jogos Paraolímpicos serão realizados de 24 de agosto a 5 de setembro.

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