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As consequências da ação de classe contra o UFC

As vantagens competitivas do UFC como promotor de artes marciais mistas resultaram em um modelo de negócios de arriscado à longo prazo, conforme indica uma recente análise de mercado[1].

Desde a abertura em Wall Street, a TKO Group Holdings, Inc. (empresa formada da fusão do UFC com a WWE[2]) vem subindo com base nos lucros do UFC e da WWE. No entanto, um banco de investimentos, o TD Cowen[3], deu às ações da empresa uma recomendação de “desempenho de mercado”[4].

Foi a primeira vez que os analistas de ações expressaram preocupação com a ação antitruste movida por ex-lutadores do UFC[5]. O processo Cung Le, et al. contra a Zuffa, empresa dona do UFC à época.  será levado ao tribunal em abril.

Os analistas expressaram cautela quanto à capacidade da TKO de continuar gerando lucros e retornos para os acionistas em meio ao litígio em andamento, de acordo com um relatório da Bloomberg. O relatório observa que o potencial para danos monetários significativos como um impedimento para a administração anunciar recompras de ações ou dividendos.

Em resposta, o advogado principal do UFC, William Isaacson, observou que o relatório não reflete os últimos acontecimentos do processo. “Os autores recentemente desistiram de seu pedido de medida cautelar no caso Le – o que significa que o julgamento de abril não envolverá mudanças no modelo de negócios do UFC daqui para frente”, afirmou (tradução nossa).

Obviamente, o que não foi incluído no comentário é que ainda existe a possibilidade de que a medida cautelar possa ocorrer no processo Kajan Johnson-UFC[6], que está acompanhando o processo de Le.

O que é igualmente ameaçador para o UFC é a medida cautelar (injuctive relief), porque isso significa que o juiz pode ordenar que eles façam certas coisas porque o tribunal concluiu que eles abusaram de seu poder de monopsônio.

Os autores sugeriram em suas petições que gostariam que o tribunal ordenasse ao UFC que seus contratos fossem limitados a apenas um ou dois anos no máximo. Sem extensões, sem cláusulas de tolerância, nada além desse ponto.

Como vimos com Nate Diaz, que levou seis anos para rescindir seu contrato, e Francis Ngannou[7], que levou cinco, um ou dois anos é muito melhor para os lutadores esperarem.

Assim, haveria a possibilidade de termos lutadores famosos lutando uma ou duas vezes e, em vez de terminar o contrato, eles decidirem esperar um ano ou alguns meses mais.

Dessa forma, além de poder pedir mais dinheiro ao UFC para não ir para outro lugar, haverá vários outros lutadores famosos disponíveis saírem do evento, e, portanto, grandes lutas agora são potencialmente fáceis de serem transferidas para outro lugar. Isso mudaria completamente o cenário atual do MMA.

Porém, apontar disposições contratuais possivelmente injustas não é suficiente para provar que o UFC infringiu a lei. Reconhecendo isso, Le e seus coautores acusam o UFC de ter violado a Seção 2 da Lei Antitruste Sherman. Em geral, a Seção 2 proíbe monopólios ilegais.

Cumpre ressaltar que o fato de uma empresa ser dominante em um setor não prova automaticamente que a empresa é um monopólio ilegal. A empresa deve ter se envolvido em práticas anticompetitivas em um determinado setor e em um determinado mercado.

As reivindicações dos lutadores lembram aquelas levantadas por Curt Flood em seu histórico processo contra a Major League Baseball para ser um agente livre. A mesma lei antitruste invocada na questão do UFC teve influência na história do beisebol nos EUA.

Anteriormente ao agenciamento livre, as equipes eram essencialmente donas de seus jogadores, podendo manter seus serviços quase que indefinidamente, reduzir seus salários ou trocá-los à vontade, sem nenhuma intervenção do jogador.

Um desses jogadores, Curt Flood, foi trocado por uma equipe na qual não queria jogar e deixou isso claro para o comissário da MLB, Bowie Kuhn, em 24 de dezembro de 1969[8].

O pedido de Flood foi negado e ele entrou com uma ação judicial contra a Major League Baseball, alegando que estavam ocorrendo violações antitruste. O caso chegou à Suprema Corte e Flood acabou perdendo, mas as repercussões continuaram, pois o sindicato dos jogadores continuou pressionando para eliminar a “cláusula de reserva”, que impedia os jogadores de exercerem o livre arbítrio.

O sindicato dos jogadores foi bem-sucedido em 1975 e uma série de mudanças ocorreu nos mais de vinte anos seguintes, garantindo aos jogadores de beisebol melhores salários.

Le e os coautores exigem indenizações monetárias, que seriam automaticamente triplicadas de acordo com a lei antitruste, além da medida cautelar que forçaria mudanças no UFC. Le v. Zuffa ameaça desestruturar o UFC, cujo valor cresceu de forma impressionante de US$ 2 milhões em 2002 para até US$ 3,5 bilhões atualmente.

Sempre há o risco dos lutadores do UFC terminarem o processo da mesma maneira que Flood. Só o futuro dirá se o MMA terá o mesmo resultado do Beisebol, ao menos em um primeiro momento.

Crédito imagem: UFC/Divulgação

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[1] LEON, Joel. WWE Parent TKO Group Hit With First Hold Rating on Antitrust Woes. Bloomberg, 13 jan. 2024. Disponível em: https://www.bloomberg.com/news/articles/2024-01-12/wwe-parent-tko-group-gets-first-hold-rating-amid-antitrust-concerns?embedded-checkout=true. Acesso em: 17 jan. 2024.

[2] COSTA, Elthon José Gusmão da. A discussão judicial da fusão UFC-WWE. Lei em Campo, 11 dez. 2023. Disponível em: https://leiemcampo.com.br/a-discussao-judicial-da-fusao-ufc-wwe/. Acesso em: 17 jan. 2024.

[3] Banco de investimentos multinacional americano que opera por meio de dois segmentos de negócios: uma corretora e uma divisão de gestão de investimentos. A divisão de corretoras da empresa oferece serviços de banco de investimentos, pesquisa de ações e crédito, vendas e negociações, corretagem global de primeira linha, negociações terceirizadas, compensação global e serviços de gestão de comissões.

[4] O desempenho de mercado é uma avaliação neutra que não implica uma recomendação de compra ou venda. Isso contrasta com outras recomendações de compra das ações com base nos lucros da empresa.

[5] COSTA, Elthon José Gusmão da. A AÇÃO CIVIL DE CLASSE CONTRA O UFC E SEUS NOVOS ANDAMENTOS. Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, 1 dez. 2023. Disponível em: https://ibdd.com.br/a-acao-civil-de-classe-contra-o-ufc-e-seus-novos-andamentos/?v=19d3326f3137. Acesso em: 17 jan. 2024.

[6] Kajan Johnson, et al. v. Zuffa, LLC, et al., No. 2:21-cv-01189 (D. Nev.)

[7] COSTA, Elthon José Gusmão da. O destino de Ngannou: o UFC e a liberdade de atuação do atleta de MMA. Lei em Campo, 17 jan. 2023. Disponível em: https://leiemcampo.com.br/o-destino-de-ngannou-o-ufc-e-a-liberdade-de-atuacao-do-atleta-de-mma. Acesso em: 17 jan. 2024.

[8] https://supreme.justia.com/cases/federal/us/407/258/

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