No último dia 11 de fevereiro o Pleno do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) manteve a punição aplicada pela Comissão Disciplinar ao técnico do América/MG, Lisca. A decisão foi unânime e puniu o técnico por infração ao artigo 258, § 2º, II do Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD), que prevê como puníveis as condutas contrárias à disciplina ou à ética desportiva não tipificadas pelo código, exemplificando – no inciso que fundamenta a decisão – o desrespeito aos membros da equipe de arbitragem ou a reclamação desrespeitosa contra suas decisões.
O caso do técnico Lisca ilustra algo extremamente comum; o desrespeito à arbitragem é fato corriqueiro e é praticado com frequência também por atletas. É tão comum que muitos atribuem a prática à natureza do próprio esporte em si; o argumento é que de, como os ânimos estão acirrados durante a partida, xingar o juiz faz parte do futebol e punir esta prática acaba por matar o futebol-raiz.
Há também o argumento de que os erros cometidos pela arbitragem ao longo da a partida – e do campeonato em si – justificam, de alguma forma, os xingamentos; ou que, pelo menos, tais xingamentos precisam ser relativizados dado o contexto (aplicando, assim, uma punição bem mais leve).
É compreensível que os erros cometidos pela equipe de arbitragem, que prejudicam – em muito! – o trabalho dos clubes causem revolta. A questão da profissionalização da arbitragem já é debatida há anos sem qualquer mudança significativa que melhorasse este cenário. O próprio uso do VAR, que trouxe esperança de decisões mais justas e menos debates sobre arbitragem nas mesas redondas pós jogos, não aprece ter atendido às expectativas.
Ocorre que deixar de punir o desrespeito à arbitragem – ou relativiza-lo – não fará com que a qualidade da arbitragem aumente. Pelo contrário. O CBJD pune o desrespeito à arbitragem justamente porque há quebra da disciplina e fragiliza a autoridade de que a equipe de arbitragem deve estar investida; a disciplina deve guiar o contato direito de atletas, técnicos e outros atores do espetáculo desportivo com os responsáveis pelas decisões em campo.
Tudo isso para defender o esporte e a competição desportiva, a razão de ser da justiça desportiva. Os artigos do CBJD que tipificam uma prática punível o fazem porque aquela prática, de alguma forma, prejudica o esporte, a competição desportiva. Assim, se o atleta pratica uma agressão física (artigo 254-A), ele está, além de atingir fisicamente o colega de trabalho, prejudicando o bom andamento da partida e do campeonato. O mesmo ocorre se o clube relaciona na equipe um atleta irregular (artigo 214), se deixa de tomar providências capazes de prevenir e reprimir desordem, invasão e lançamentos de objetos no campo (artigo 213), se o árbitro se omite no dever de prevenir ou de coibir violência ou animosidade entre os atletas (artigo 260).
Ao contrário de matar o futebol-raiz, portanto, as punições previstas no CBJD visam garantir justamente a continuidade do esporte formal e da competição esportiva.