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Aspectos jurídicos das categorias de base

Com o apoio da Secretaria de Esportes e Lazer da Cidade de São Paulo, e oficializada pela CBF, a Federação Paulista de Futebol organizou a 52ª edição da Copa São Paulo de Futebol Júnior. A Copinha, como é conhecida, teve a sua final essa semana, no dia do aniversário da cidade paulistana.

A competição contou com atletas nascidos entre 2001 e 2006, destacando os debates acerca da importância da categoria de base, notadamente a relevância da formação desportiva e a atenção aos jogadores na transição com o futebol profissional.

No que se refere aos conceitos e aspectos jurídicos, o assunto foi tratado na Lei 10.672/2003, que passou por diversas alterações com a Lei 12.395/11, incluindo as disposições sobre a formação e profissionalização do atleta no art. 29 da Lei Pelé. A partir dessa mudança, a Lei Geral sobre o Desporto passou a dispor critérios específicos para os contratos de formação, como a preferência do clube formador na assinatura do primeiro contrato profissional desportivo, além de impor regras de convivência familiar, e exigir a compatibilidade das atividades de formação desportiva com a grade escolar.

No processo de formação desportiva, os limites técnicos e táticos devem sempre observar os direitos fundamentais e demais tutelas da criança e do adolescente norteado pelo art. 227 da CF. Em vista disso, a Lei 13.155/2015 categorizou a prática da formação desportiva como aperfeiçoamento qualitativo e quantitativo da modalidade, evidenciando os aspectos recreativos da formação desportiva, muito além da competição e do alto rendimento.

O contrato de formação desportiva pode ser assinado com atletas de 14 a 20 anos.  A idade mínima corresponde ao que dispõe o inciso art. 7º, XXXIII da CF, em linha com a norma infraconstitucional trabalhista, que versa sobre aprendizagem profissional. Já o contrato especial de trabalho desportivo pode ser assinado a partir dos 16 anos.

Em âmbito internacional, em vista a fomentar a formação de novos atletas tanto quanto a proteção dos clubes que contribuem com essa cadeira formadora, a FIFA, em 2001, estabeleceu deveres e garantias sobre o tema em seu Regulamento sobre o Status de Transferência de Jogadores.

Segundo o RSTP da FIFA, a formação desportiva do atleta pode ocorrer dos 12 aos 23 anos, impondo a obrigação de indenização por formação até os 23 anos pela formação desportiva realizada até os 21 anos de idade, com exceção aos casos em que o atleta foi profissionalizado antes dessa idade. O Certificado Internacional de Transferência (ITC), documento necessário para transferências internacionais, e garantidor da condição de jogo, não é emitido para atletas menores de 12 anos.

No Brasil, em 2012 a CBF estabeleceu o Certificado de Clube Formador, garantindo aos que clubes que obtiverem essa declaração percentuais em resultados econômicos de transações futuras, e indenização de parte do custo despedido com a formação. Outra forma de estimular os clubes a investirem na formação desportiva, foi a exigência do Certificado de Clube Formador como requisito para obtenção da licença para participação das competições organizadas pela CBF.

No geral, para que a indenização por formação seja devida ao clube, exige-se a assinatura do primeiro contrato de trabalho por agremiação de nacionalidade diversa da que o atleta estava registrado, incidindo também a cada transferência do atleta entre associações nacionais distintas até este completar 23 anos de idade. O cálculo da indenização por formação baseia-se na classificação estabelecida ao clube pela federação correspondente.

Outra compensação financeira garantida aos clubes formadores é o mecanismo de solidariedade, que opera de forma mais ampla como uma recompensa aos gastos despendidos na formação desportiva, tendo como base de cálculo o valor da transferência e a proporção dos anos que o atleta se manteve inscrito no clube dos 12 aos 23 anos, e diferente da indenização por formação, não se limite com a idade. A condição é que haja transferência onerosa e internacional do jogador profissional.

Já o mecanismo de solidariedade nacional, previsto no art. 29-A da Lei Pelé assegura a compensação ao clube que contribuiu com a formação desportiva do atleta dos 14 aos 19 anos de idade, sempre que houver cessão definitiva ou temporária entre agremiações desportivas nacionais, prevendo o percentual de 1% para cada ano de formação desportiva dos 14 aos 17 anos, e 0,5% dos 18 aos 19 anos.

A premissa desses institutos é unir interesses do atleta em formação com a entidade de prática desportiva, estabelecendo direitos e deveres recíprocos, garantindo aos clubes formadores a respectiva e necessária recompensa financeira, após um ano desse período de formação, e desde que este preencha requisitos mínimos capazes de fornecer a adequada estrutura para a formação desportiva do atleta.

Dentre os requisitos, o contrato de formação deve ser escrito e registrado na entidade de administração desportiva, e deve prever seguro de vida e acidentes pessoais em favor do atleta, além da bolsa aprendizagem, valor este que não se caracteriza como remuneração e não gera vínculo de emprego.

Outra obrigação é a contratação direta entre clube e atleta e seus representantes legais, vedando a participação de terceiros, tal como consta no §12º do art. 29 e art. 27-C da Lei Pelé, e a inscrição do atleta em competições oficiais, garantindo assistência educacional, psicológica, médica, odontológica, alimentação, transporte, e estrutura para moradia, não permitindo que a atividade de formação desportiva exceda quatro horas diárias, ajustando-se ao horário escolar ou curso profissionalizante.

O ordenamento jurídico brasileiro teve o desporto reconhecido como matéria educacional na sua Carta Magna de 1934, sob influência da legislação germânica. O reconhecimento constitucional do desporto deriva da certificação do esporte para a sociedade. O professor Álvaro de Melo Filho retrata em sua obra “O desporto na ordem jurídico-constitucional brasileira que “o esporte é manifestação da vida cultural, desenvolvimento educacional, social e de saúde.”

Ações que incentivam o fortalecimento das categorias de base atribui ao esporte elementos que efetivam a ordem social, através da busca pela dignidade da pessoa humana e o seu bem-estar. A manifestação do desporto educacional conta com aspectos de desenvolvimento do cidadão, valendo-se do esporte como influência de aptidão técnica, disciplina, senso de cooperação coletiva, desenvolvimento motor e mental, habilidades táticas e convívio social.

Competições como a Copinha aproxima o torcedor da verdadeira realidade da maioria dos jogadores de futebol no Brasil, afora o almejado lugar nos elencos profissionais dos grandes clubes, e disputas exibidas horários nobres.

De um lado, são inúmeros atletas com muitas expectativas e sonhos, e do outro, as agremiações desportivas. A estas, o poder estratégico das categorias de base encontra-se na equação entre investimento e gestão, e o consequente proveito financeiro. O investimento reverte-se em receita com as possibilidades de transferências de seus jovens atletas a outros clubes nacionais ou estrangeiros, ou mesmo com a transição desses atletas como forma de incrementar o elenco profissional sem onerar o clube.

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