Mais um caso de racismo aconteceu no futebol brasileiro neste final de semana. Durante a partida entre Athletico-PR e São Paulo, neste domingo (31), na Arena da Baixada, uma torcedora do Furacão foi flagrada imitando um macaco para os visitantes. Além disso, os são-paulinos que estiveram no estádio disseram que bananas foram arremessadas em suas direções. Diante dos relatos e das gravações que circulam nas redes sociais, o clube paranaense deverá ser alvo da Justiça Desportiva.
“Os atos de racismo, ainda que timidamente, vêm recebendo tratamento mais severo por parte dos tribunais desportivos. Exemplo disso foi a mudança no Código Disciplinar da Conmebol no sentido de agravar sanções. No caso em tela, caso comprovado o ato racista da torcedora, o Athletico pode ser denunciado com base do art. 243-G, parágrafos segundo e terceiro, do CBJD (Código Brasileiro de Justiça Desportiva), que define como infração praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de raça. O clube, então, fica sujeito ao pagamento de multa de R$ 100,00 a R$ 100 mil e a torcedora porventura identificada poderá ficar proibida de frequentar o estádio pelo prazo mínimo de 720 dias”, avalia Carlos Henrique Ramos, advogado especializado em direito desportivo.
“Seguindo o que determina ao art. 243-G do CBJD, o clube pode ser punido com multa e perda de número de pontos (equivalentes aos pontos atribuídos em uma vitória) se restarem comprovados que sua torcida praticou atos discriminatórios, sendo que o código prevê ainda hipótese de exclusão da competição, caso mais seja possível suprimir os pontos”, afirma Ana Mizutori, advogada especializada em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Carlos Henrique Ramos acrescenta que “caso a Procuradoria entenda o ato como de extrema gravidade, pode, em última análise, requerer a aplicação das penas de perda de pontos, perda de mando de campo e exclusão de competição”.
É importante lembrar que a Procuradoria do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) poderá usar as imagens que circulam nas redes sociais como provas para oferecer uma denúncia contra o Athletico-PR.
Art. 243-G. Praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
PENA: suspensão de cinco a dez partidas, se praticada por atleta, mesmo se suplente, treinador, médico ou membro da comissão técnica, e suspensão pelo prazo de cento e vinte a trezentos e sessenta dias, se praticada por qualquer outra pessoa natural submetida a este Código, além de multa, de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais).
§ 2º A pena de multa prevista neste artigo poderá ser aplicada à entidade de prática desportiva cuja torcida praticar os atos discriminatórios nele tipificados, e os torcedores identificados ficarão proibidos de ingressar na respectiva praça esportiva pelo prazo mínimo de setecentos e vinte dias.
§ 3º Quando a infração for considerada de extrema gravidade, o órgão judicante poderá aplicar as penas dos incisos V, VII e XI do art. 170.
No vídeo que circula nas redes sociais, um homem aparece gritando coisas em direção ao setor da arquibancada em que estava localizada a torcida do São Paulo. Atrás dele está uma mulher que filma tudo com o celular. No final, essa jovem é filmada imitando um macaco.
https://twitter.com/somosaopaulinos/status/1553866934407528450?s=20&t=rmUIVuGG2ztdZOhHI6fGKw
Ao ‘UOL Esporte’, o delegado Luiz Carlos Oliveira, responsável pela Delegacia Móvel de Atendimento a Futebol e Eventos (Demafe) disse que pediu ao Athletico-PR as imagens das câmeras da arena para identificar a torcedora que aparece no vídeo.
“Já foi solicitado ao Athletico-PR que nos forneça as imagens das câmeras da arena para identificar a torcedora que aparece imitando um macaco. Acredito que o Athletico-PR não vá demorar a nos ceder as imagens que nos permitam identificar essa moça, que é o que queremos”, declarou.
“Só depois que identificarmos as pessoas é que vamos abrir inquérito e ver se o caso será relatado para o Ministério Público”, acrescentou.
Punições na esfera criminal
Além de possíveis punições na Justiça Desportiva, a torcedora que imitou um macaco poderá responder criminalmente pelo ato.
“O caso em questão é intitulado pelo senso comum de racismo. Entretanto, é sábio esclarecer que não se trata do crime de racismo e sim de injúria racial. O racismo tem lei especial que o tipifica, já a injúria racial é norteada pelo próprio Código Penal em seu artigo 140, parágrafo 3º., que estabelece a pena de reclusão de um a três anos e multa”, explica Renan Gandolfi, especialista em direito penal.
De acordo com a legislação, injuriar seria ofender a dignidade ou o decoro utilizando elementos de raça, cor, etnia, religião, origem ou condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Em geral, o crime de injúria está associado ao uso de palavras depreciativas referentes à raça ou cor com a intenção de ofender a honra da vítima.
Já o crime de racismo, previsto na Lei nº 7.716/1989, implica em conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade e, geralmente, refere-se a crimes mais amplos. Nesses casos, cabe ao Ministério Público a legitimidade para processar o ofensor. A lei enquadra uma série de situações como crime de racismo, por exemplo, recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou às escadas de acesso, negar ou obstar emprego em empresa privada, entre outros, são mais comuns no País os casos enquadrados no artigo 20º da legislação, que consiste em “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”.
João Paulo Martinelli, advogado especializado em direito penal, explica quais serão os próximos passos.
“O primeiro passo a ser dado assim que os autores forem identificados será intimar essas pessoas a prestarem depoimentos. Feito isso, abre-se uma investigação. Se o delegado entender que constitui um ato racista, há um indiciamento – que significa que formalmente a pessoa passa a ser investigada. Após isso, ele juntará todas as provas e encaminhará um relatório daquilo que foi apurado ao Ministério Público. Com o documento em mãos, o órgão decidirá se recebe ou arquiva a denúncia. Caso ela seja aceita pelo juiz, tem início um processo criminal”, conta.
Funcionário vítima de racismo
Em comunicado oficial, o São Paulo denunciou ainda que um de seus funcionários foi vítima de ataques racistas vindos de parte da torcida do Athletico-PR, logo em seguida ao pênalti defendido por Felipe Alves. De acordo com o clube, o homem registrou um Boletim de Ocorrência.
“Lamentavelmente, episódios de racismo foram presenciados neste domingo, na Arena da Baixada. Um profissional do São Paulo FC, que estava trabalhando no campo, foi vítima de ataques racistas logo em seguida ao pênalti defendido pelo goleiro Felipe Alves. Ele vem recebendo o suporte do clube e já registrou Boletim de Ocorrência”, denunciou o clube.
Até o momento, o Athletico-PR não se manifestou sobre o episódio.
Crédito imagem: Du Caneppele/O Fotografico/Gazeta Press
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