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Atleta poderia entrar em greve com volta do esporte e pandemia em alta?

Não, não existe no Brasil um movimento coletivo de atletas discutindo a volta do futebol. E, também por isso, não existe a possibilidade de greve. Pelo menos, por enquanto. Mas, a crise de saúde pública provocada pelo coronavírus poderia dar causa a uma decisão coletiva dos atletas de se negaram a trabalhar.

Em um momento em que o movimento esportivo se organiza para volta, e discute com o governo protocolos para receber uma autorização para retomar o esporte, alguns atletas se mostram assustados.

Matéria publicada pelo UOL, conta que os atletas estão preocupados com a preservação da saúde, mas querem o recomeço dos jogos por questões econômicas. Foram ouvidos 511 atletas em uma pesquisa encomendada pelo Sindicato Municipal dos Atletas Profissionais de São Paulo.

“Ao longo do trabalho, pudemos observar que existe uma clara preocupação com a saúde para a maioria deles. Mas o desamparo de uma profissão com carreira curta e pouco rentável para a maioria faz com que critérios outros para a subsistência, como o financeiro, se sobreponham ao medo da possível contaminação. Temos, ao fim, no futebol, um retrato da sociedade”, diz Vinicius Lordello, CEO da Esporte Executivo, empresa contratada pelo sindicato.

E isso não acontece só no Brasil. Aguero, Sterling são alguns dos atletas da Premier League que já manifestaram medo pela volta do futebol na Inglaterra.

Entenda que o atleta é um profissional do esporte. O jogador de futebol é um empregado do clube. Ele exerce uma atividade com algumas especificidades, daí a importância da relação ser regida por uma lei própria, a Lei 9615/98, a Lei Pelé. Ou seja, aplica-se a Lei Pelé na relação de emprego, e de forma subsidiária, naqueles pontos em que ela for omissa, a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).

Chegamos à questão da greve.

O direito de greve no Brasil foi uma das mais importantes conquistas dos trabalhadores por meio da Constituição Federal de 1988, que no artigo 9º determina: “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”

Essa manifestação também está regulamentada pela Lei Federal 7783/89, e para o devido exercício da greve é preciso observar alguns pontos.

Para a greve ser legítima é preciso ter:
– um motivo forte, e justo;
– tentativa de negociação prévia;
– aprovação via assembleia, democrática, representativa, e respeitando critérios e formalidades definidos pelo estatuto da entidade sindical;
aviso prévio da greve ao empregador, com prazo mínimo de 48 horas.

Cumprindo esses requisitos, um eventual movimento grevista por parte dos jogadores de futebol seria legítimo.

Gustavo Lopes, colunista do Lei em Campo, escreveu que “caso os atletas consigam se organizar o risco de greve é real e os clubes e CBF acabarão sendo obrigados a negociar soluções para o retorno de atividades em tempos de coronavírus.”

Me parece que a saúde de todos atletas, garantida pela CF e por princípios universais de direitos humanos, dariam segurança jurídica para uma discussão sobre o assunto.

Mas isso não irá acontecer.

Fácil saber por quê.

Os atletas brasileiros não entendem a força coletiva que têm, e já deram infinitos exemplos de desunião.

Até mesmo nessa crise gigante, não conseguiram se posicionar e estar no banco das discussões sobre a volta do futebol. Diante de um silêncio decepcionante, não existe nenhum tipo de mobilização que vença uma desesperança reinante.

O atleta que sua, que brilha, que cria, é também o mesmo que pensa muito mais em si (como em quase todas as categorias), esquecendo a essência coletiva do esporte. Que esquece o poder do grupo na defesa de causas plurais.

Ou você já viu um movimento de classe, de jogadores de diferentes realidades, lutando por uma causa única no futebol daqui? Bom Senso F.C.?

Foi um embrião de algo que se perdeu por pressão dos clubes, pelo baixo engajamento dos atletas, por uma agenda desfocada e pela absoluta falta de compreensão da responsabilidade que a classe tem com cada um dos jogadores.

Isso ajuda a entender porque no Brasil os sindicatos de atletas têm tão pouca representatividade.

Então, engula essa, na Argentina é diferente.

Muito por ser um país com déficit educacional bem menor do que o nosso, os atletas entendem o compromisso que têm com o atleta. Mesmo recebendo em dia e bem, vários já pararam a bola para defender aqueles que recebem mal ou nem sequer recebem. Greve.

Em 1948, a classe, com todos os seus grandes personagens como Alfredo Di Stéfano, resolveu parar com o futebol em busca de direitos, e por melhores condições de trabalho para todos (ainda escreverei mais sobre esse movimento).

Em 2017 eu fui para a Argentina fazer a estreia do Palmeiras contra o Atletico Tucuman pela Libertadores. O jogo foi no final de fevereiro, e o primeiro do time argentino no ano. Isso porque a bola tinha parado.

Com os pequenos clubes atrasando salários, todos os atletas, todos, decidiram tirar as chuteiras, parar a bola e fazer com que os clubes cumprissem com suas obrigações mais básicas.

Os mais ricos e poderosos, que ganhavam em dia, defendendo os mais pobres e fracos.

Unidos, venceram. A bola voltou a rolar, e os atletas a receber pelo trabalho prestado.

Não acho que seja a hora de greve. Nada disso.

Mas já passou da hora dos atletas entenderem a força coletiva que têm. E exigirem um lugar nessa mesa de discussão sobre a volta do futebol, com clubes e entidades esportivas.

Até por uma questão de saúde.

Força coletiva. Espírito de grupo. Exemplos não faltam.

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