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Atos racistas e discriminatórios no esporte – o que falta para a efetividade das medidas existentes?

O racismo no esporte tem se apresentado como uma perturbação grave e persistente em muitas partes do mundo, se manifestando de diversas formas, desde comentários de cunho racistas, insultos e gestos discriminatórios direcionados a atletas de diferentes origens étnicas, até discriminação sistêmica a qual afeta o acesso igualitário de grupos raciais minoritários ao esporte.

Além da hostilidade do ambiente hostil que subsiste em meio a condutas discriminatórias, tem como contexto a falta de representatividade, onde, muitas vezes, grupos étnicos minoritários enfrentam falta de representação e discriminação institucional, onde as estruturas organizacionais permitem a perpetuação da discriminação sistêmica, seja pela falta de inclusão de políticas desiguais para o desenvolvimento de talentos de grupos raciais minoritários em posições de liderança e gestão.

Somado ao alcance das mídias sociais, que tem sido cenário de discurso de ódio e racismo direcionado a atletas e outros envolvidos na atividade esportiva, não obstante o protesto contra o racismo e atos discriminatórios, e mensagens relacionadas à igualdade racial estejam constantemente expressados por atletas, durante partidas e fora de campo, valendo-se de sua visibilidade para ampliar a conscientização social.

A questão da punição por incidentes de racismo no futebol é complexa e muitas vezes envolve múltiplos fatores e as sanções podem variar dependendo das circunstâncias e da jurisdição.

A promoção de medidas preventivas, o implemento de medidas para combater o racismo no futebol e o cumprimento das regulamentações antidiscriminação podem não resultar em punições diretas às organizações esportivas, fato este que permite a continuação de situações racistas, tal como se nota no fatídico – abominável e inaceitável – caso do Vini Jr., onde a Federação Espanhola de Futebol (RFEF) e o Real Madrid possuem responsabilidades em relação a incidentes de racismo, mas essas responsabilidades estão mais relacionadas. A RFEF, por exemplo, pode implementar medidas para combater o racismo no futebol e punir os indivíduos envolvidos nos incidentes, mas isso pode não resultar em punições diretas ao clube.

Ainda que a FIFA e a UEFA, assim como outras organizações esportivas possuam diretrizes rígidas contra o racismo no futebol, e incentivem medidas preventivas e de conscientização, como campanhas contra o racismo e a promoção de inclusão através de programas sociais.

É importante entender que o processo de punição por incidentes de racismo no esporte pode ser complicado, pois envolve várias partes e a aplicação das regras e regulamentações varia de acordo com o contexto específico. No entanto, a pressão pública, a conscientização e a mobilização dos jogadores, clubes e organizações esportivas desempenham um papel significativo na luta contra o racismo no futebol e na busca por punições adequadas quando ocorrem incidentes discriminatórios.

Em 2019, a FIFA estabeleceu um protocolo para manifestações de cunho discriminatório, devendo os árbitros a paralisar a partida para que sejam disparados avisos nos telões e por meio dos alto-falantes do estádio comunicando que cessem as ofensas. Caso permaneça, a partida será novamente interrompida, ocasião que os atletas saem de campo e novos comunicados são reforçados, e por fim, caso persistam os atos discriminatórios, após adotadas as duas medidas anteriormente descritas, os árbitros estão orientados a encerrar definitivamente a partida.

A FIFA estabelece regras que abordam o racismo e a discriminação no futebol. A principal referência para questões de conduta e discriminação no futebol é o Código de Ética da FIFA, o qual inclui os princípios relacionados ao combate ao racismo e à discriminação, tais quais: (i) Princípio da Não Discriminação: a discriminação de qualquer tipo, incluindo, mas não se limitando à discriminação racial, é inaceitável e proibida no futebol; (ii) Dever de Promover a Igualdade: Os membros da FIFA, incluindo federações nacionais, clubes e jogadores, têm o dever de promover a igualdade e combater todas as formas de discriminação no futebol; (iii) Dever de Respeitar os Direitos Humanos: A FIFA enfatiza que todas as partes envolvidas no futebol devem respeitar os direitos humanos e promover a igualdade e a não discriminação; (iv) Sanções Disciplinares: O Código de Ética da FIFA prevê a possibilidade de sanções disciplinares contra qualquer pessoa ou entidade envolvida em condutas discriminatórias, incluindo multas e suspensões.

Além das regras estabelecidas no Código de Ética, a FIFA e suas confederações regionais também implementam programas e campanhas para promover a diversidade, a inclusão e o combate ao racismo no futebol, incluindo ações como campanhas de conscientização, programas educacionais e a promoção de medidas concretas para lidar com incidentes de racismo nos estádios.

O Código Disciplinar da FIFA prevê multa de até R$ 110 mil reais para associações que tiverem membros de sua torcida realizando atos discriminatórios, podendo até ser punido em partida sem presença de público, perda de pontos e exclusão de competições. Vale mencionar que a identificação do torcedor não isenta a responsabilidade do clube, sendo que este pode ser punido e impedido de adentrar as arenas esportivas e frequentar as partidas.

O Código Disciplinar da FIFA prevê multa de até 110 mil reais para associações que tiverem membros de sua torcida realizando atos discriminatórios, podendo até ser punido em partida sem presença de público, perda de pontos e exclusão de competições. Vale mencionar que a identificação do torcedor não isenta a responsabilidade do clube, sendo que este pode ser punido e impedido de adentrar as arenas esportivas e frequentar as partidas.

Ao reconhecer a sua responsabilidade nas diligências de combate a todas as formas de preconceito no futebol, a FIFA estabeleceu, no art. 3º de seu Estatuto, que “A discriminação de qualquer tipo contra um país, uma pessoa ou grupo de pessoas por causa da raça, cor da pele, etnia, origem social, gênero, língua, religião, opinião, saúde, local de nascimento ou qualquer estatuto, orientação sexual ou qualquer outra razão é estritamente proibida e passível de punição por suspensão ou expulsão”.

Por outra via, o Código de Ética da FIFA, aplica-se à todas as federações e respectivos membros, organizações esportivas, jogadores, árbitros, dirigentes, em todos os jogos e competições, podendo ser punidos caso incorram em condutas racistas e discriminatórias. No art. 23 do Código de Ética da FIFA, prevê que pessoas vinculadas por este Código não podem ofender a dignidade ou a integridade de um país, pessoa privada ou grupo de pessoas por meio de palavras ou ações discriminatórias em virtude da raça, cor da pele, origem étnica nacional ou social, sexo, língua, religião, opinião política ou qualquer outra condição, orientação sexual ou qualquer outro motivo.

A CONMEBOL alterou o seu Código de Disciplina no que diz respeito aos atos discriminatórios, ampliando a previsão de pena de multa de US$ 30 mil dólares, passou para U$ 100 mil dólares, incluindo a possibilidade de se fechar os portões para a torcida.

Na mesma linha, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva tipifica como infração disciplinar a prática de qualquer ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência.

Se a infração for praticada por atleta, mesmo que suplente, treinador, médico ou membro de comissão técnica, a pena pode ser de suspensão de cinco a dez partidas e multa de R$ 100 a R$ 100 mil reais.  Caso o ato discriminatório seja incorrido por outra pessoa natural submetida ao CBJD, a pena é de suspensão de 120 a 360 dias, e multa de R$ 100 a R$ 100 mil reais.

Caso os atos discriminatórios sejam praticados simultaneamente por um número considerável de pessoas vinculadas a uma mesma entidade desportiva, o clube poderá ser punido com a perda do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento da competição, independentemente do resultado da partida. prevê multa de até R$ 100 mil reais, perda de pontos na competição, podendo ser excluído do campeonato caso não seja por soma de pontos, podendo ser punido com a perda do dobro do número de pontos atribuídos a uma vitória no regulamento de competição, em caso de reincidência. E, caso a competição não seja em formato de soma de pontos, a organização esportiva que esteja por si diretamente, ou por meio de seus torcedores, os quais estes, ainda, podem ser punidos com proibição de ingresso no estádio por no mínimo 720 dias.

A CBF enrijeceu as punições por atos discriminatórios, incluindo no Regulamento Geral de Competições, medida esta que passou a vigorara na Copa do Brasil deste ano. Consoante o art. 134 do RGC, “Considera-se de extrema gravidade a infração de cunho discriminatório praticada por dirigentes, representantes profissionais dos Clubes, atletas, técnicos, membros de Comissão Técnica, torcedores e equipes de arbitragem em competições coordenadas pela CBF, especialmente injuriar alguém, ofendendo lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia, procedência nacional ou social, sexo, gênero, deficiência, orientação sexual, idioma, religião, opinião política, fortuna, nascimento ou qualquer outra forma de discriminação que afronte a dignidade humana.”, submetendo a equipe ou aquele que culminar em atos discriminatórios e nas condutas do art. 134 do RGC pena de advertência, multa pecuniária administrativa de até R$ 500 mil reais, a ser revertida em prol de causas sociais, vedação de registro ou transferência de atletas e perda de pontos, podendo estas serem cumulativas.

Ainda, não obstante qualquer punição proveniente da Justiça Desportiva, e em caso de reincidência, dobra-se a pena de multa aplicada em desfavor do infrator.

Trata-se de multa administrativa, aplicada pela entidade de administração desportiva que emana este regulamento, portanto, a CBF, podendo ser encaminhando ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva para apuração e julgamento acerca da perda de pontos da agremiação.

A Lei 14.532/23 impõe que, a despeito das sanções esportivas, atos de racimo devam ser encaminhados para conhecimento do Ministério Público e da Polícia Civil, competentes para investigar, relatar e diligenciar possível crime. Ainda no aspecto legal, cumpre citar que desde o início deste ano, a injúria racial passou a ser equiparada ao crime de racismo, passando, então, ofensas racistas serem caracterizadas como crime inafiançável e imprescritível, podendo ser apenado de 2 a 5 anos reclusão, podendo ter restringido o direito de ingressar em praças esportivas por 03 anos.

Nesse aspecto, as organizações esportivas, os entes estatais e a sociedade como um todo possuem o dever de protagonizar políticas efetivas no combate ao racismo no esporte. Isso pode ser alcançado por meio da implementação de políticas antirracistas, educação, conscientização, treinamento e promoção da diversidade e da inclusão em todos os aspectos do esporte. Além disso, é fundamental responsabilizar aqueles que promovem o racismo no esporte, seja por meio de punições ou da conscientização pública.

O combate ao racismo no esporte é uma parte crucial da luta global contra o racismo e a discriminação racial em todas as áreas da sociedade. Não se trata, apenas, da defesa de direitos de raça, gênero, etnia, procedência social, mas de uma questão de humanidade, da imposição de direitos humanos, onde incumbe à todos a irresignação quanto a qualquer comportamento discriminatório, hostil, seja quem for o ofendido.

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