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Atraso remuneratório do jogador para fins de rescisão indireta: continua sendo no todo ou em parte, por três meses ou mais?

A Lei n. 14.597/23 (Lei Geral do Esporte-LGE) trouxe muitos retrocessos linguísticos, para não descrever diretamente sociais, em sua redação normativa, especialmente no campo labora desportivo.

Uma das piores modificações de linguagem, que pode tornar confusa a leitura do intérprete/operador do Direito, centra-se em dispositivos do que seria considerado atraso remuneratório para fins de rescisão indireta (justa causa da entidade empregadora desportiva que permite a extinção contratual em favor do atleta com a vantagem de este receber todas as verbas rescisórias, a cláusula compensatória esportiva e restar livre para contratar com outro empregador esportivo).

Mais uma vez a anomalia se instaura no cotejo redacional entre o art. 31, caput, da Lei n. 9.615/98 (Lei Pelé) e o art. 90, § 1o, da LGE que tratam das condições para que o atleta empregado possa pleitear o término do contrato especial de trabalho esportivo por justa causa do empregador em face da mora remuneratória.

Em primeiro ponto a redação normativa do art. 31, caput, da Lei Pelé expressa que se considera atraso remuneratório a falta de quitação de parcelas retributivas no todo ou em parte, enquanto o art. 90, § 1o, da LGE silencia por completo neste ponto específico.

Diante desta “omissão diabólica” do referido verbete legal da LGE, qual deve ser o melhor critério de interpretação jurídica do hermeneuta para solucionar o problema na prática?

Iniludivelmente, o jurista deve levar em consideração o método de interpretação histórica, bem como praticar a função tuitiva, a teleologia do Direito do Trabalho, através dos princípios da proteção e da aplicação da norma mais favorável, pregando que o atraso continua sendo sobre as verbas no todo ou em parte quando se lê no art. 90, § 1o, da LGE: “É hipótese de rescisão indireta do contrato especial de trabalho esportivo a inadimplência da organização esportiva empregadora com as obrigações contratuais referentes à remuneração do atleta profissional…”.

Recorde-se ao estimado leitor que, a instrumentalização do metaprincípio da prevalência da norma mais favorável implica também extrair de uma redação confusa a interpretação mais benéfica ao hipossuficiente, em regra o atleta empregado.

O método da interpretação histórica vale para que o “operário” do Direito do Trabalho Desportivo não esqueça a história literal da Lei do Desporto brasileiro ao configurar inadimplemento remuneratório as parcelas contratuais no todo ou em parte, ainda mais porque o art. 31, caput, da Lei Pelé prossegue em vigência.

Outro aspecto extremamente relevante na mudança de linguagem entre as linhas descritivas das disposições legais em pauta é que o art. 31, caput, da Lei Pelé prescreve ser afigurada a mora remuneratória apenas quando o atraso se constatar por três (3) meses ou mais, ao passo que o art. 90, § 1o, da LGE em oposição desceu a figuração do atraso para o período igual ou superior a dois (2) meses apenas.

Nesta evidente contradição, invariavelmente, lex posterior derogat legi priori, ou seja, a lei posterior LGE deve prevalecer com o seu texto legal sobre as descrições contidas na Lei Pelé, mas exclusivamente por ser o mandamento normativo mais benéfico ao trabalhador hipossuficiente (empregados jogadores).

Relembre-se, menos de três porcento (3%) dos atletas profissionais percebem pelo seu contrato especial de trabalho desportivo cinco salários mínimos ou mais, restando o fenômeno da hipersuficiência atlética empregatícia para circunstâncias especialíssimas, somente apreciável por via da casuística e da tópica.

Em conclusão, no cenário atual de vigor paralelo da Lei Pelé e da Lei Geral do Esporte, esta deve prevalecer para considerar mora remuneratória parcelas que estejam atrasadas no todo ou em parte e por tempo igual ou superior a dois (2) meses. O jogador que conseguir, nesses exatos termos, o pleito de rescisão indireta procedente perante a Justiça do Trabalho estará livre para contratar com outro ente empregador do desporto.

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