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Breves considerações acerca do caso “Messi e Barcelona”

O craque argentino tem uma bela e longa história com o clube catalão, mas que pode ser abalada em razão dos desdobramentos da sua intenção de romper com o clube que se tornaram públicas após o final da Champions League.

Na última semana, o atleta argentino enviou comunicado à diretoria do clube para comunicar sua saída. Lionel Messi afirmava se valer de uma cláusula no contrato que o libera do vínculo empregatício sem a necessidade de pagamento de multa. Contudo, para o Barcelona, o prazo estipulado no contrato não fora observado.

A discussão tem sua gênese na renovação do contrato que foi realizada no ano de 2017 e com validade até junho de 2021. Em apertada síntese, conforme noticiado pela imprensa na última semana[1], a redação contratual permite que Messi rescinda o contrato de forma unilateral logo após o fim da temporada. Isso o libera de pagar a multa rescisória de R$ 4,6 bilhões. Por outro lado, na interpretação do texto efetuada pelo Barcelona, o jogador perdeu o prazo para fazer esse comunicado, pois no documento a data limite é 10 de junho.

A grande divergência se concentra justamente na interpretação desta cláusula contratual. Para o atleta e seus representantes, a pandemia provocada pelo novo coronavírus e o adiamento das competições alteraram com o prazo. Com efeito, a data de 10 de junho foi utilizada como referência na medida em que o calendário europeu termina em maio. Todavia, é fato público e notório que excepcionalmente nesta temporada houve a prorrogação dos compromissos e o encerramento dos torneios ocorreu com a final da Liga das Campeões.

Por outro lado, o time espanhol interpreta o conteúdo contratual de forma literal e neste caso a manifestação de vontade do jogador teria sido extemporânea, a ensejar a aplicação da multa.

Em comunicado oficial divulgado no dia 30.08.2020, a La Liga, entidade responsável por administrar o Campeonato Espanhol, anunciou que o jogador tem contrato em vigor com o Barcelona e só poderá deixar o clube caso mediante o pagamento da multa contratual rescisória de 700 milhões de euros.

Nada obstante o caráter meramente opinativo da entidade (tendo em vista não ser ela quem detém o poder decisório nestas situações), este impasse demonstra que o direito não é uma ciência exata e que demanda uma análise interpretativa e hermenêutica.

Insta ressaltar que sem analisar a redação exata do contrato não há como se apontar uma conclusão definitiva.

Ao se proceder uma interpretação literal, o atleta teria perdido o prazo para manifestar a sua intenção de sair sem ônus. Além disso, de acordo com o artigo 1.281 do Código Civil espanhol, “Se os termos do contrato forem claros e não deixarem dúvidas sobre a intenção dos contratantes, será aplicado o sentido literal de suas cláusulas”.

Contudo, a data constante no contrato não pode ser interpretada de forma isolada e literal, tendo em vista que estava diretamente relacionada ao término da temporada, sendo que este foi adiado, em quase todo o mundo, em razão da pandemia provocada pela COVID-19.

Essa, portanto, deveria ser a finalidade do contrato e tal fato não pode ser ignorado. Além disso, pela regra constante no direito brasileiro, as chances de uma interpretação favorável ao atleta seriam maiores em razão da boa-fé contratual que é um dos alicerces do Código Civil Brasileiro.

Com efeito, o princípio da boa-fé, exige das partes comportamento ético, baseado na confiança e na lealdade e deve nortear qualquer relação jurídica.

Estabelece o artigo 422 do Código Civil que, “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé”.

Trata-se de modelo ideal de conduta no cumprimento da obrigação que deve nortear todos aqueles que fazem parte da relação obrigacional, no caso devedor e credor.

É através da teoria da boa-fé que poderá ser detectada eventual abusividade das cláusulas contratuais expressas ou mesmo se reconhecer a inaplicabilidade parcial dos efeitos do negócio jurídico. É este princípio que terá o condão de proceder a devida interpretação da declaração de vontade, quando houver a necessidade de se restabelecer o equilíbrio contratual.

……….

[1] Disponível em: https://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,advogados-avaliam-que-messi-deve-sair-do-barcelona-sem-precisar-pagar-multa,70003413969 . Acesso realizado em 01.09.2020.

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